terça-feira, 20 de fevereiro de 2018


UM POETA ENLOUQUECIDO?

Há 109 anos o jornal francês LE FIGARO publicou o “Manifesto futurista”, escrito pelo poeta italiano de origem egípcia Felippo Marinetti (1876-1944), que mais tarde seria um ardente defensor do fascismo, inclusive com carteirinha do partido. O futurismo teve vida curta,embora tenha influenciado pintores que fundaram movimentos modernistas pelo mundo afora. 
Vale a pena dar uma lida, especialmente os itens 9 e 10. Enfim, dizer o quê? 

1.Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e do destemor.
2.A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3.A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4.Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de halito explosivo... um automóvel rugidor, que correr sobre a metralha, é mais bonito que a vitória da Samotrácia.
5.Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
6.É preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e munificência, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
7.Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas para obrigá-las a prostrar-se diante do homem.
8.Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O tempo e o Espaço morreram ontem. Nós já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade onipresente.
9.Nós queremos glorificar a guerra –única higiene do mundo – militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.
10.Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de toda natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.
11.Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e polifônicas das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas elétricas; as estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as oficinas penduradas às nuvens pelos fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de facas; os piróscafos* aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço enleados de carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma bandeira, e parece aplaudir como uma multidão entusiasta.

É da Itália, que nós lançamos pelo mundo este nosso manifesto de violência arrebatadora e incendiária, com o qual fundamos hoje o "futurismo", porque queremos libertar este país de sua fétida gangrena de professores, de arqueólogos, de cicerones e de antiquários. Já é tempo de a Itália deixar de ser um mercado de belchiores. Nós queremos libertá-la dos inúmeros museus que a cobrem toda de inúmeros cemitérios.”

Noturno em Preto e Dourado: A queda do Foguete,
óleo sobre painel de  James McNeill Whistler.
Acervo Instituto de Arte de Detroit. (Impressionista)




























*piróscafo – barco a vapor. 

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