sábado, 25 de outubro de 2025

CENAS DE RUA

 

O ônibus passava pela Rua Libero Badaró, no Centro. Trânsito ruim. Eu, na frente, acomodada no banquinho solitário que em alguns ônibus elétricos novos estão ao rés do chão. O ônibus parou no farol e vi a moça na calçada caminhando no sentido contrário. Apesar do sol, o vento ainda era frio e ela usava um pano preto preso na cintura cobrindo o quadril e a blusa de alças da mesma cor era mais discreta. Estava descalça. Tinha o corpo esbelto e bem-feito, um tanto sujo, indicando que devia viver em situação de rua. Ela parou em frente à porta envidraçada de um prédio, olhou o reflexo dela, ajeitou os cabelos compridos e lisos de um jeito naturalmente coquete e continuou o caminho assim como o ônibus. O motorista a viu, mas desviou o olhar porque o farol abrira. Eu pensei: ela aprovara o que vira no “espelho” e isso é o que importava, não o que os outros pensavam dela. Acho que poucos viram a cena porque ela era apenas mais uma das pessoas infelizes que circulam pelo Centro em meio à multidão apressada.

CENA DE RUA 2

"Detalhes." Praça João Mendes, 21h, 18º C.




sexta-feira, 24 de outubro de 2025

A CIDADE À NOITE

 

Se você resolveu deixar o carro na garagem, calçar um sapato confortável e caminhar, vai descobrir muitas coisas interessantes sobre a cidade. A primeira descoberta é a própria cidade, pois o caminhante tem uma visão muito melhor dos lugares por onde passa, descobre segredos, mistérios e a própria realidade, que atrás do volante com olho na sinalização e nos pedestres, perde de passagem. A segunda descoberta, talvez a mais fascinante, são as pessoas que transitam de lá para cá, que se deixam ficar num canto esperando alguém ou alguma coisa, as que correm para não perder ou ganhar tempo, famosos, anônimos, os loucos, os esquecidos, os injustiçados e tantos outros... A terceira revelação –à noite a cidade é outra, se transmuda e tanto pode ser sedutora como amedrontadora, silenciosa ou agitada pelos boêmios, eternos amantes da lua – não importa se nova ou cheia.



Teatro Municipal

Viaduto do Chá

Faculdade de Direito da USP, Largo de São Francisco.
Fotos: 23 de outubro de 2025.

Poética

Vinicius de Morais

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.

 


quarta-feira, 22 de outubro de 2025

HORA DO BANHO

O escultor Alfredo Ceschiatti (1918-1989) não deu nome para a sua preguiçosa exposta no piso superior da Estação Sé do Metrô. Outro dia, quando passei, vi a donzela impávida tomando banho, provavelmente anual. A funcionária não poupou esforços para deixá-la brilhando.




 


sábado, 18 de outubro de 2025

CAMINHANDO POR AÍ

 


Avenida São João numa tarde chuvosa e em uma noite primaveril.


O moderno - Parque D. Pedro II, e o antigo, início da Rua Vinte e Cinco de Março. 


Instalação do artista Alex Fleming tem retratos de frequentadores e funcionários da Biblioteca Mário de Andrade. Rua da Consolação. 


Vitrine da estação São Bento do Metrô. Confesso que não entendi e o cartaz não ajudou.


sexta-feira, 17 de outubro de 2025

PRAÇA FRANKLIN ROOSEVELT

Conheci a Praça Roosevelt, que já não era agradável, em 1982, quando mudei para São Paulo e comecei a frequentar a Biblioteca Circulante da Mário de Andrade. Além da Circulante, lembro que havia uma escola infantil, uma loja Pão de Açúcar e uma floricultura. Meu caminho incluía os programas do Biju, ainda um cinema que exibia filmes de arte, e o Teatro Cultura Artística na Rua Nestor Pestana. A história da praça, que já se chamou Consolação, está ligada à Dona Veridiana Prado, cujas terras abrangiam uma extensa área daquela região e foi loteada no final do século XIX. Nas imediações da Rua Nestor Pestana a família Prado construiu o Velódromo, que divulgou um esporte estrangeiro praticado entre os ricos que podiam importar bicicletas; porém, a moda durou pouco porque outro esporte estrangeiro ocupou o espaço, mas dessa vez conquistou o grande público: o football.

Na época da construção da igreja da Consolação, 1910, ali se realizavam feiras no final de semana e havia também um grande estacionamento. A Praça já se chamou Consolação e Guianas até que em 1947 recebeu o nome do presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt (1882-1945), que faleceu dias antes do término da II Guerra na Europa (no Japão, acabou em agosto de 1945). Se a praça nunca agradou a gregos e troianos do ponto de vista estético e urbanístico, atualmente ainda balança o coração dos velhos boêmios que frequentaram o bar e restaurante Baiúca – reduto de Johnny Alf, Zimbo Trio entre outros grandes nomes da MPB, e o Djalma’s Bar, onde Elis Regina fez seu primeiro show em São Paulo, e outros grandes artistas se apresentaram.

A velha e boa Roosevelt passou por várias transformações até chegar ao formato atual. Confesso que não gosto do resultado da última reforma que fizeram na praça. Sem graça. Concreto em abundância. Sonho de skatistas. Eu, porém, não vivo no entorno. Uma moradora que passeia com seu cãozinho me conta que o resultado foi muito bom: “A praça se tornou um lugar familiar”, segundo ela, pois há policiamento 24 horas por dia e as pessoas podem sair de casa com tranquilidade para passear, tomar sol ou fazer compras". Ela faz uma ressalva: se as noites são calmas e agradáveis de segunda à quinta-feira, o alvoroço acontece nas noites de sexta, sábado e domingo.

   A caminhada que fiz numa noite de quinta-feira, confirmou a tranquilidade do lugar. E para quem quer saber, no lado par da Praça encontram-se entre outros o Espaço Parlapatões, Satyros Bijou – Espaço Patrícia Pilar, o bar Pick your beer... Enfim, melhor ir e conferir.

Do outro lado da Praça encontra-se a Escola Caetano de Campos (Rua João Guimaraes Rosa, 111). A Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM), cuja origem foi na Praça da República, foi transferida em 2003 para a Rua Pires da Mota, 99, na Aclimação. O prédio da República, obra do Escritório Ramos de Azevedo e inaugurada em 1894, é a sede da Secretaria Estadual de Educação, e está passando por obras de restauração.









DAMA FANTASMA



Embora não creia em assombração, gosto de filmes de ou com fantasmas. Procurando o que ver, chamou-me atenção “A Dama Fantasma” (1944), com Ella Raines e Franchot Tones, e dirigido por Robert Siodmak (1900-1973), um cineasta americano de origem alemã que se destacou e fez sucesso nos anos de 1940 com filmes noir. Três ilustres desconhecidos para mim, mas eis que o quarto nome da lista foi uma grande surpresa: Aurora Miranda, a irmã de Carmen Miranda para quem não sabe. Resolvi assistir ao filme e, sinceramente, não achei lá grande coisa. A história é bem fraca: um homem casado entra num bar e convida uma estranha, mulher muito bonita e que usa um chapéu exótico, para beber, mais tarde vão a um show, em que a estrela é Aurora Miranda.








Ele se despede de desconhecida, que se recusa a dizer o nome e, quando ele chega apartamento, encontra a esposa morta. Nas investigações que se seguem, ele é o único suspeito. Levado a julgamento, é condenado à morte. O resto é infindável. Aurora imita Carmen – nas roupas e nos trejeitos, claro que faz papel de uma cantora sul-americana, Estela Monteiro, e encaixa em suas falas algumas palavras em Português.

O ator Elisha Cook Jr. (1903-1995) interpreta um baterista e tem uma participação muito boa no filme. Ele foi um ator que trabalhou em grandes filmes (“O Falcão Maltês”, “Big Sleepy”, “Shane”, “O Bebê de Rosamary” entre tantos outros), quase sempre como um suspeito ou culpado mesmo e quase sempre morre no fim.

Ilustrações: Cartaz do filme, Aurora Miranda e Elisha Cook Jr.

Filme assistido no CANAL LIVRE.


domingo, 12 de outubro de 2025

HORA DO CAFÉ

Fred Astaire, que foi um grande dançarino, com Lucille Bremer, bailarina clássica, em cena do filme "Yolanda e o ladrão" (1945), dirigido por Vincent Minelli. 


https://www.youtube.com/watch?v=Gz6jRrObcnw

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

UM FALCÃO NA ESTAÇÃO D. PEDRO II

 

Toda cidade oferece surpresas, boas ou más, aos seus moradores e visitantes. São Paulo não é diferente. Hoje, por exemplo, fui resolver um problema lá pelos lados da Várzea do Carmo e na volta peguei um ônibus até a Estação D. Pedro II do metrô. Quando subi as escadas notei que a passarinhada estava toda alvoroçada cantando. É primavera. Ainda dei uma espiada para tentar localizar os cantores, mas como tinha outro compromisso subi as escadas e no saguão, apesar de haver pouca gente, notei uma agitação incomum e uma funcionária parecia perturbada. Os mais tranquilos eram a dupla de PMs junto à murada de uma abertura. Então baixou a jornalista adormecida e fui perguntar à funcionária se havia acontecido algo. Ela me contou rapidamente que “a ave atacou o pombo que está ferido”.

Que ave? Onde?

Ali.

A ave era um falcão, creio eu, que estava empoleirado calmamente na beira da murada. Pareceu-me um pouco exibido. Virou para um lado, virou para o outro como se posasse para as inúmeras câmeras focalizadas em sua elegante figura. Ou simplesmente, avaliasse o ambiente para ver o melhor caminho de fuga. Quando perguntei como iam tirá-lo de lá, a funcionária disse, sinceramente, um “não sei” e seguiu em busca de ajuda.

Resolvi pegar o trem para meu compromisso, antes de virar alvo do falcão. Espero que o final tenha sido feliz para o caçador frustrado.