terça-feira, 2 de dezembro de 2025

DESCOBRINDO O TATUAPÉ

 

O nome do bairro sempre me atraiu – em Tupi significa caminho dos tatus, mas há quem acredite que se refere a um hábito da população colonial de caçar tatu a pé; entretanto, quando descobri que o primeiro explorador da região foi o português Brás Cubas, fiquei muito mais interessada. O motivo é simples: Brás Cubas foi o fundador da cidade de Santos (SP) em 1534, principalmente porque notou as qualidades do porto abrigado para a exportação do açúcar produzido nos engenhos que da Vila de São Vicente – o primeiro município do Brasil, instalado por Martim Afonso de Souza.

Mais interessante ainda é o fato de que Brás Cubas – um empreendedor incomum – deixou a vila de Santos com uma pequena expedição em busca de ouro no Planalto, seguiu até a foz de um riacho denominado Tatu-ape onde encontrou o Rio Grande, como era conhecido o rio Tietê. Brás Cubas gostou do que viu e ali o grupo se estabeleceu, iniciando a criação de animais e o plantio de diferentes cultivares, além da cana-de-açúcar. E a novidade foi a introdução da parreira. Mais uma vez Brás Cubas acertou: a uva produzia um bom vinho, que se tornou popular e, com o tempo, tanto a viticultura (produção de fruta) quanto vinicultura (produção de vinho) se desenvolveram e ganharam prestígio. Em tempos mais recentes o italiano Francesco Marengo (1875-1959), estabelecido em São Paulo, foi um grande produtor de uvas premiadas pela excelente qualidade.

A ocupação da região cresceu a partir do século XVII, quando os herdeiros venderam as terras para o padre Mateus Nunes de Siqueira que se tornou o proprietário da Fazenda Tatuapé. Daqueles tempos restou a casa de taipa de pilão do administrador da fazenda Mathias Rodrigues da Silva, que acabou servindo de pouso para os tropeiros de passagem por ali. Ela é a mais antiga casa bandeirantista paulistana.

O Tatuapé é um bairro em plena ascensão. Com quase cem mil habitantes, um Índice de Desenvolvimento Humano bastante elevado (0,936), vem atraindo grandes construtores que estão investindo em condomínios de alto padrão (não necessariamente bonitos). O chamariz são os edifícios Figueira Altos do Tatuapé e Platina 220, que estão entre os mais altos da cidade. 

Dezembro começa numa segunda-feira com jeito de verão e a Praça Silvio Romero tem bancos convidativos e o arvoredo oferece sombra para quem quer descansar ou aproveitar esse conforto singelo para fazer negócios. Caso dos dois homens indiferentes à paisagem: um perdido em pensamentos (acho) e o outro falando ao telefone. 

A praça ganhou árvore de natal e enfeites típicos da época. A Igreja Nossa Senhora da Conceição domina a praça. Ela foi construída no local da antiga capela do século XIX, erigida em terras do tenente Luís Americano que doou um terreno de 7.500 m² para a Igreja com a condição de que ali fosse construída uma igreja em louvor à santa de sua devoção. Em 1931 a Prefeitura mudou o nome do Largo da Conceição para Praça Sílvio Romero – uma homenagem ao escritor e político maranhense.

Os amantes de esporte contam com o Parque Municipal do Tatuapé Sampaio Moreira que tem quadra de futebol, quadra de basquete, academia ao ar livre e pistas para bicicleta, skate, correr ou caminhar. Rua Monte Serrat, 230. No Parque do Piqueri (97 mil m²) há 116 espécies de fauna – de peixes até aranhas, sapos-cururu e lagartos em meio à vegetação. Há uma alameda com sibipirunas, uma área reflorestada com eucaliptos e um bosque com árvores nativas. Além do contato com a natureza, os visitantes aproveitam vários equipamentos para prática de esportes. Rua Tuiuti, 515.

Essa região é servida pelo Metrô Tatuapé (Linha 3 Vermelha com transferência para a CPTM 11 e 12); e Carrão (Linha 3 Vermelha). O Complexo Comercial Tatuapé, formado pelos Shoppings Metrô Tatuapé e Boulevard Tatuapé – interligados pela passarela da estação do metrô –, têm quinhentas lojas, treze salas de cinema, duas praças de alimentação e três mil vagas de estacionamento. Cerca de 25 linhas de ônibus atendem o Terminal.

Umas gotinhas de chuva começam a cair. Esperança de que a chuva amenize o calor. Algumas pessoas correm. Acho que são precipitadas e decido caminhar até o metrô.

Praça Sílvio Romero.

GRANDES E FEIOSOS
                                             Ao fundo, o Platina 200, Rua Bom Sucesso



Edifício Figueiras Alto do Tatuapé. Rua Itapeti, 141.





















segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

DEZEMBRO E A ALEGRIA


Friedrich Schiller (1789-1805) é o autor do poema “Ode à Alegria”, escrito em 1785, e que Ludwig van Beethoven incluiu no quarto movimento da  belíssima 9ª Sinfonia que ele compôs em 1824, quando o mundo vivia em turbulência, especialmente na Europa. O poema de Schiller é bonito, mas só os românticos acreditam que um dia a humanidade estará unida. Para chegar a esse nível de perfeição é necessário que todos tenham suas necessidades básicas atendidas e então viver a alegria será uma consequência por termos atingido esse estágio superior.

Mais realista foi o compositor inglês John Lennon (1940-1982). Em uma das suas mais bonitas composições, ele imagina um mundo em paz e em que todos estejam unidos, livres e sem preconceitos, mas reconhece que pode ser considerado um sonhador, embora não seja o único e tem esperança de que mais pessoas se juntem a eles ... “And the world will be as one”. Lennon compôs “Imagine” em 1971. Foi assassinado em 8 de dezembro de 1989 em Nova York.

Em 1972, Comunidade Europeia adotou a “Ode à Alegria” como hino oficial sem o poema.

        Não sou religiosa embora tenha crescido numa família católica, mas costumo ouvir pessoas animadas com a chegada de dezembro e têm várias explicações para essa sensação aflorar – a data santa, a conclusão de mais um ano, as festas e a possibilidade de reunir familiares, férias e viagens são as mais comuns. Alguns se lançam às compras, abonados com o 13º salário – ou do que sobrou da sexta-feira negra. Outros apreciam as decorações natalinas. Eu, particularmente, gosto mesmo da chegada do verão, de usufruir da calma da cidade após o dia 25, quando os mais corajosos se dirigem para os grandes congestionamentos nas estradas (especialmente as do Litoral) para tomar sol e à noite ver fogos de artifício na praia... Boa sorte. Muita alegria em 2026.

    


sábado, 29 de novembro de 2025

AMIGO DA ONÇA

 

Aviso no computador: Pesquisar Dia Internacional da Onça-Pintada. Como sou do contra, resolvi homenagear o Amigo da Onça, aquele personagem de língua ferina que sabia como arruinar um momento importante das pessoas com uma pergunta insidiosa e um olhar cínico estampado no rosto peculiar. Um personagem que destruiu psicologicamente seu criador, o cartunista pernambucano Péricles de Azevedo Maranhão (1924-1961) que se suicidou aos 37 anos no dia 31 de dezembro de 1961. Péricles desenhou o personagem, publicado pela revista semanal CRUZEIRO (Diários Associados, Assis Chateaubriand) por dezessete anos. Carlos Estevão (1921-1972) deu continuidade ao trabalho de Péricles.








Carlos Estevão (1921-1972) deu continuidade ao trabalho de Péricles.



quinta-feira, 27 de novembro de 2025

PAUL VALÉRY

 

Santos (SP) a partir do Monte Serrat.

“Já não sei e me pergunto, em meio a meus anéis de fumo, se irei esta tarde ao mar, através das árvores, ou até o monte carregado de rochas, ou então visitar alguns amigos em suas moradas; ou se deixarei puramente escorrer o bom tempo límpido, toda a massa do começo da tarde lento e tépido até a sua última luz? Oscilo, pinto-me o possível e apago. Digo-me sem querê-lo que os animais não o fazem nada mais que o útil. Até suas brincadeiras são justos dispêndios. Mas nós, o excesso de espírito turva e difere, com sua duração, todas as contas de nossa vida. Ganhamos, perdemos tempo, nosso saldo nunca é nulo. Sonho com essa moeda estranha. Ouço uma água que silva e segue não sei onde; um martelo não sei onde que martela não sei o quê...”

ALFABETO, do poeta e filósofo francês Paul Valéry (1871-1945). Tradução: Tomaz Tadeu.

“Je m’interroge au milieu de ma fumée si j’irai tantôt vers la mer à travers les arbres, ou sur le mont accablé de roches, ou bien visiter quelques amis dans leurs demeures; ou si je laisserai couler purement le beau temps limpide, toute la masse de l’après-midi lente et tiède jusqu’à sa dernière leur? Je varie, je me peins le possible et j’efface. Je me dis sans le vouloir que les bêtes ne font rien que d’utile. Même leurs jeux sont de justes dépenses. Mais nous, Le trop d’esprit trouble et differe tous les comptes de notre vie avec sa durée. Nous gagnons, nous perdons du temps, notre solde n’est jamais nul. Je rêve a cette monnaie étrange. J’entends une eau qui chuinte et se suit je ne sais où; un marteau je ne sais où qui martèle je ne sais quoi...”

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

VIRIATO CORREIA

 

Depois de passar a manhã tentando falar com a atendente eletrônica da Comgás, que não entende o que eu preciso, à tarde fui à Biblioteca Viriato Correia, na Vila Clementino, que só conhecia de passagem. Uma surpresa agradável. Ela é ampla, com farta luz natural e muito convidativa. No momento, tem uma exposição dos trabalhos realizados pelos alunos das seis Escolas Municipais de Iniciação Artística, voltadas para crianças de cinco a treze anos. De acordo com a Prefeitura, o projeto dessas escolas é conduzido por corpo docente composto por artistas e educadores e integra música, dança, teatro e artes visuais em processos criativos. As escolas estão localizadas nas Zonas Norte (Brasilândia), Oeste (Chácara do Jockey), Leste (Chácara das Flores), Noroeste (Perus) e Sul (Parelheiros).

            No início, achei estranhas as obras expostas, mas soube que desde 2008 a biblioteca tem como tema a literatura fantástica.  Confesso que achei muito melhores os trabalhos da garotada do que alguns que tenho visto em espaços nobres da cidade.

Criada em 1952, a Biblioteca Infantil da Vila Mariana ocupou por uma década um sobrado na Rua Domingos de Moraes até mudar em 1962 para o prédio moderno e adequado à finalidade na Rua Sena Madureira, 298. O projeto é do arquiteto José Augusto Barros Arruda. Em 1969, a biblioteca ganhou o nome do escritor maranhense Manuel Viriato Correia Baima do Lago Filho, ou seja, Viriato Correia (1884-1969), um mestre da literatura infantil.

            Não foi por acaso que fui até lá. Há tempos quero ler “O Teorema do Papagaio”, do escritor francês Denis Guedj, e que só está disponível para empréstimo lá. Saí muito satisfeita com o atendimento e com tudo o que vi.

                E já que o tema é infância, fui procurar Papai Noel pela cidade.




domingo, 23 de novembro de 2025

A QUERIDA MARIA-FUMAÇA

 

TREM DE FERRO

Café com pão
Café com pão
Café com pão
Virge Maria que foi isto maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força

Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
De ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!

Oô...
Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá

Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matá minha sede
Oô...
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no Sertão
Sou de Ouricuri
Oô...

Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...

O poeta pernambucano Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho, ou simplesmente, Manuel Bandeira (1886-1968), é o autor do poema . FOTO: Museu da Imigração, 23 de novembro de 2025. Um passeio delicioso e com Vinicius, um ótimo guia.

Rua Visconde de Parnaíba, 1316 - Mooca. Perto da Estação Bresser-Mooca do Metrô. A Maria Fumaça só "trabalha" nos finais de semana. Afinal, é uma senhora centenária.

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

ESMERALDA... QUE ATRIZ!

Esmeralda é feiosa e nada sexy.  Para nossos padrões de beleza está bem acima do peso. Tem uma boca enorme desproporcional à cabeça e ornamentada por um bigode nada discreto. A voz? Um horror – parece um velho portão enferrujado, talvez porque aprecie um bom charuto. E se move sem elegância; não dança, mas gosta muito de música. Felizmente não canta. Nas cenas em que aparece usa apenas um colar. Sim, ela não é recatada e sempre que tem oportunidade dá sonoras beijocas nos companheiros de viagem. É impossível não gostar dessa grande atriz. Esmeralda nunca leria o que acabei de escrever porque se trata de uma foca amestrada que brilha no pequeno papel que tem no filme de Disney “20 mil léguas submarinas”, baseado no livro de Júlio Verne. A foca contracena com Kirk Douglas, que canta para ela a música “A Whale of a Tale” – impagável.  

É sempre um prazer rever esse filme que mostra a genialidade do escritor francês Júlio Verne (1828-1905) e do cineasta norte-americano Walt Disney (1901-1966). O primeiro escreveu sobre máquinas “maravilhosas” que só se concretizaram no século XX; o segundo foi mestre em transformar a ficção em obras cinematográficas impecáveis.

O filme de 1954, dirigido por Richard Fleischer, venceu o Oscar de 1955 nas categorias de melhores efeitos especiais e melhor direção de arte em Cores. No elenco, além de Kirk Douglas (Ned Land) e Esmeralda (ela mesma), estão James Mason (capitão Nemo) e Peter Lorre (Counseil). Disponível para assinantes no Cinema Livre – Filmes Clássicos da Era de Ouro do Cinema. 


https://www.youtube.com/watch?v=CP3_sOEo8gg