sábado, 30 de janeiro de 2016

PALÁCIO PEDRO ERNESTO
 É possível marcar uma visita ao Palácio Pedro Ernesto, outro prédio em estilo eclético que enfeita a Cinelândia. Aliás, já foi chamado de “Gaiola de Ouro” por um historiador por causa do alto custo da sua construção – duas vezes mais do que a obra do Teatro Municipal ali do lado: 23 mil contos de réis. Vale a pena conferir, pois se trata da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O projeto do arquiteto Heitor de Mello (1875-1920) foi desenvolvido por Archimedes Memória e Francisco Couchet, quanto Mello faleceu. A construção estendeu-se de 1919 a 1923. A inauguração ocorreu durante a gestão do prefeito Carlos Sampaio (1861-1930).
Durante muito tempo o legislativo carioca não teve endereço próprio e antes do Palácio Pedro Ernesto ocupou 14 imóveis e entre eles a Casa de Câmara de Cadeia no Morro do Castelo (1567-1637), uma casa ao lado da Igreja de São José (1636-1736), a Cadeia Velha (1736-1787/1792/1808), o Arco do Telles no Largo do Paço (1787-1790), Paço Municipal no Campo de Santana (1825-1874), o Palácio do Campo de Santana (1882-1896) e o Liceu de Artes e Ofícios (1919-1923).
O nome do palácio é uma homenagem ao pernambucano Pedro Ernesto Rego Batista (1884-1942) que foi interventor do Distrito Federal, nomeado pelo presidente Vargas (1931 a 1934), e mais tarde tornou-se o primeiro governante eleito da historia da cidade embora de forma indireta, ocupando a prefeitura de 1935 e 1936. Muito popular, chegou a ser cotado para a Presidência da República, quando foi preso sob a acusação de ser comunista. No patamar da escadaria em frente à entrada principal do prédio há um busto de Pedro Ernesto, obra de Pinto do Couto.
A Câmara tem um belo acervo artístico em que se destacam o tríptico de 50m² sobre as obras de saneamento e urbanização do Rio de Janeiro, criação de Eliseu Visconti. Os gabinetes da Presidência, da Primeira Vice-Presidência e da Primeira Secretaria têm painéis do pintor Carlos Oswald, com cenas de época. No Salão Nobre ou Salão de Festas, sobressaem o mobiliário em estilo Luiz XV e os espelhos de cristal. As pinturas impressionistas do teto são dos irmãos Carlos e Rodolfo Chambelland, enquanto os medalhões laterais foram pintados por Carlos Oswald. Na varanda, um painel em alto relevo de José Correa Lima (1878-1974) representa as atividades que contribuem para o desenvolvimento da cidade.  
No Plenário, onde atuam os 51 vereadores, são elementos de destaque a cúpula com vitral dos irmãos Chambelland e pendentes de Roberto Mendes e o painel de Rodolpho de Amoêdo – uma alegoria à fundação do Rio de Janeiro. Merecem atenção o quadro “Suplício de Tiradentes” e os painéis de Roberto Mendes. São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro não foi esquecido: a imagem do santo ocupa um dos nichos laterais do saguão principal do Palácio Pedro Ernesto. Outro é ocupado por imagem de São Jorge. Ambas são obras de Tito Enrico Bernucci.

O endereço do Palácio Pedro Ernesto é Praça Floriano, s/nº e as visitas devem ser agendadas pelo site da Câmara (http://www.camara.rj.gov.br/).  Foto: H. Araújo.


A Câmara e ao lado o bar "Amarelinho", fundado em 1921.

         

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES
Pode-se dizer que a esquina da Praça Marechal Floriano com a Avenida Rio Branco, na Cinelândia, é privilegiada em matéria cultural: de um lado há o Teatro Municipal, do outro o Museu Nacional de Belas Artes e, em frente, a Fundação Biblioteca Nacional. O belo prédio em estilo eclético projetado por Adolfo Morales de los Rios (1858-1928) foi construído em 1908 para sediar a Escola Nacional de Belas Artes. Em 1937, o presidente Getúlio Vargas (1882-1954) criou o museu, que se instalou na Escola de Belas Artes que em 1976 foi transferida para a Ilha do Fundão; mas a vaga foi ocupada pela Funarte até 2003, quando Museu Nacional de Belas Artes passou a ocupar integralmente o prédio.
O acervo do Museu Nacional de Belas Artes, que tem a maior e a mais importante coleção de arte brasileira do século XIX, compõe-se de setenta mil itens – pinturas, gravuras, desenhos, esculturas, objetos, documentos e livros. O acervo do museu se formou com peças da coleção de D. João VI deixadas por ele quando partiu do Brasil; pinturas trazidas pelo chefe da Missão Artística Francesa, Joaquim Lebreton (1760-1819), e os trabalhos pertencentes ou produzidos no Brasil pelos membros da Missão. Ao longo de sua história foi crescendo com aquisições e doações. A peça mais antiga da coleção, por exemplo, é um busto em mármore de Antínoo, favorito do Imperador Adriano. A peça, doada pela imperatriz Tereza Cristina à Academia Imperial, é de 130/138 d.C.
A coleção está subdividida em Pintura Brasileira e Estrangeira, Desenho Brasileiro e Estrangeiro, Escultura e Arte Africana, Gravura Brasileira e Estrangeira, Coleções Especiais (Arte decorativa, Arte Popular, Mobiliário, Medalhística, Numismática, Arte Indígena), Fotografia e Novas Linguagens. A coleção de pintura brasileira tem mais de três mil obras que abrangem a segunda metade do século XVII até a atualidade. Entre os pintores brasileiros do século XIX e início do XX destacam-se Eliseu Visconti – um dos precursores do Impressionismo no Brasil; Vítor Meireles, Pedro Américo, José Correia de Lima, Rodolfo Amoedo, Belmiro de Almeida, Modesto Brocos, Henrique Bernardelli, Antonio Parreiras e Almeida Júnior.
Em 1816 D. João criou a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios para estabelecer o ensino artístico no Brasil. No mesmo ano chegou ao Brasil a Missão Artística Francesa, chefiada por Joaquim Lebreton e formada pelos pintores Jean-Baptiste Debret (1768-1848) e Antoine Taunay (1755-1830), o escultor Auguste-Marie Taunay (1768-1824), o gravador Charles-Simon Pradier (1783-1847) e o arquiteto Grandjean de Montigny (1776-1850) entre outros. Um dos objetivos da Missão era criar a Academia Imperial de Belas Artes (AIBA), o que só se concretizou em 1826. Com o advento da República, a Academia se transformou na Escola Nacional de Belas Artes.
Visitas de terça-feira a sexta-feira das 10 h às 18 h; sábados, domingos e feriados, das 12 às 17 horas. Ingressos: R$ 8,00 (inteira) e R$ 4,00 (meia). Grátis aos domingos.
Endereço: Avenida Rio Branco, 199. Metrô Candelária.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

LIVROS À MANCHEIA
Considerada pela UNESCO uma das maiores bibliotecas nacionais do mundo e a maior da América Latina, a Fundação Biblioteca Nacional abriga nove milhões de itens. E tudo começou há 208 anos. Quando a família real mudou para o Brasil incluiu (felizmente) na bagagem os livros e documentos da Real Biblioteca da Ajuda, de Lisboa, com um acervo de cerca de 60 mil peças entre livros, manuscritos, mapas, estampas, moedas e medalhas. Não havia lugar no Rio de Janeiro para colocar o material e o jeito foi acomodar tudo nas salas do Hospital da Ordem Terceira do Carmo, na Rua Direita (atual Primeiro de Março) até que um decreto real de 29 de outubro de 1810 determinou que se erigisse e instalasse nas catacumbas daquele hospital “a Real Biblioteca e instrumentos de física e matemática, fazendo-se à custa da Fazenda Real toda a despesa conducente ao arranjo e manutenção do referido estabelecimento”.
A data oficial de fundação da Biblioteca Nacional é 29 de outubro de 1810. Com a Independência do Brasil, ela passa a ser denominada Biblioteca Imperial e Pública e em 1825 foi adquirida pelo governo. Em 1838 a instituição recebeu dos herdeiros de José Bonifácio de Andrade e Silva cerca de cinco mil volumes, inclusive cartas de personagens de diversos países com os quais o patriarca da Independência manteve correspondência.
Com o crescimento continuo da biblioteca, tornou-se essencial a construção de um espaço adequado ao acervo da instituição. A decisão foi tomada no início do século XX. O construtor e engenheiro general Francisco Marcelino de Souza Aguiar foi autor do projeto do edifício que tem capacidade para um milhão e meio de livros impressos e todo o acervo de manuscritos, estampas entre outras coisas. A pedra fundamental foi lançada em 1905 e a inauguração ocorreu no centenário da instituição, em 1910. O diretor da Biblioteca Manoel Cícero Peregrino da Silva encomendou aos artistas Modesto Brocos, Rodolfo Amoedo e Eliseu Visconti painéis e estátuas para o salão de leitura e galeria da presidência. O mobiliário foi feito pela Art Metal Construction Company em aço esmaltado, exceto as cadeiras que têm base de ferro e a parte superior de madeira, com assento de palhinha e encosto forrado de couro.
Em 1909 iniciou-se a transferência do acervo para o novo prédio sem interrupção do atendimento dos usuários. Foram necessárias 1.132 viagens para transportar as cerca de 400 mil obras. E em 1910, finalmente, a Biblioteca Nacional, depositária do patrimônio bibliográfico e documental do Brasil, começou a funcionar no seu novo endereço. Em 2006 foi criada a Biblioteca Nacional Digital (BNDigital), que integra todas as coleções digitalizadas, o que a iguala “às maiores bibliotecas do mundo no processo de digitalização de acervos e acesso a obras e serviços via Internet”.
A Sala Cofre, coberta por uma bela claraboia, é o espaço de obras raras. Atrás das treliças de madeira que cercam a sala estão os cofres e cerca de dois quilômetros lineares de prateleiras onde ficam as raridades. Em 1922 ela abrigou também a Câmara dos Deputados – que nem é tão rara assim. Há ainda as Salas de obras gerais, dos manuscritos, de iconografia, armazém. O acesso aos jardins, projetado pela Burle Marx & Cia Ltda. é pela Rua México.

Visitas guiadas de segunda-feira a sexta-feira em português às 11 h e 15 h e em inglês às 13h. Endereço: Avenida Rio Branco, 219. 
                                          Saguão da Biblioteca Nacional. Foto: Hilda Araújo.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

RIO DE JANEIRO

Caminhar pelo Rio de Janeiro é um prazer que se renova a cada passo. Condução? Bobagem. Um passeio da Praça Mauá à Cinelândia precisará de, no mínimo, três dias para conhecer alguns dos principais pontos culturais e históricos da cidade. Só na região da Cinelândia há o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal, a Fundação Biblioteca Nacional, a Câmara de Vereadores e o famoso Amarelinho – os quatro últimos na Praça Marechal Floriano.  
        O Teatro Municipal (que é o Estado) domina a Praça Floriano com sua arquitetura imponente, semelhante ao Palais Garnier, de Paris. A campanha para a construção de um teatro começou logo após a proclamação da República por Arthur Azevedo, mas somente no início do século XX, como parte da reurbanização da cidade, as autoridades resolveram lançaram um concurso para escolher o projeto para o teatro. O concurso terminou com empate entre Francisco de Oliveira Passos, filho do prefeito Pereira Passos, e Albert Guilbert e assim o teatro resultou de uma fusão dos projetos de ambos. As obras começaram em 1905 e concluídas em 1909. A inauguração ocorreu em 14 de julho daquele ano com a presença do presidente da República, Nilo Peçanha.
Se o edifício é belo externamente, o interior dele também arrebata o visitante: ônix, bronzes dourados, mármore, ferro fundido e cristais constituem os principais materiais decorativos.  No foyer em estilo Luis XVI, merecem atenção os vitrais a abóbada. Pinturas de Eliseu Visconti (1866-1944), Henrique Bernadelli (1858-1936) e Rodolfo Amoedo (1857-1941) podem ser admiradas com as esculturas de Rodolfo Bernardelli (1852-1931).
A sala de espetáculos tem 2244 assentos, sendo 456 poltronas em madeira e veludo na plateia, circundadas por 22 frisas; acima o balcão nobre com 344 poltronas e 12 camarotes, além da cabine de luz e som. No andar superior, o balcão simples oferece mais 500 lugares; a galeria logo acima tem 724 cadeiras.
       Há visitas guiadas de terça a sexta-feira. Os ingressos custam R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia) e são vendidos apenas para o dia a partir das 10h30.



                                                   

Endereço: Praça Marechal Floriano, s/n. Metrô Cinelândia. Tel. 21-2332-9191.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

SANTOS, 470 ANOS.
                                 Santos vista do Monte Serrat. Foto: Hilda Araújo.

O português Brás Cubas, que chegou à Ilha de São Vicente muito jovem, trabalhou arduamente – plantou cana, construiu curtume e engenho, mas enxergou mais longe e com os homens que confiaram nele mudou o porto para o lado próximo do continente e acreditou que um hospital seria importante para todos – habitantes e visitantes. Que a obra foi importante, ninguém duvida: 470 anos depois o Porto e a Santa Casa de Misericórdia estão em pleno funcionamento. É certo que amou Santos porque retornou a Portugal apenas uma vez para concluir negócios e, apesar de ter ficado muito rico, nunca mais voltou. Santos é assim: conquista as pessoas.

    E para terminar, Fernando Pessoa.

ODE MARÍTIMA

Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos detrás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos.
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a
Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.

Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente.

Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Trazem memórias de cais afastados e doutros momentos
Doutro modo da mesma humanidade noutros pontos.


Poesias de Álvaro de Campos, in Fernando Pessoa/ Obra Poética.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

DA TAIPA AO CONCRETO

Região da Av. Paulista. Foto : Caldeyro Stayano, 5/2008.



Uma imagem paulistana que desperta sentimentos contraditórios, mas é enganosa. Se vista do céu parece desumana, entretanto, ao rés do chão a vida não poderia ser mais fervilhante. Em meio aos arranha-céus, ainda restam alguns casarões dos tempos do café; a Mata Atlântica dá o ar de sua graça nos Parques Mario Covas e Trianon. Ao lado de lugares caros barzinhos não se intimidam, espalham-se e reúnem uma síntese da população que se distribui pelas calçadas. A região da Avenida Paulista é um turbilhão. Hotéis, restaurantes, museu e teatro, cinemas, colégios e faculdades, igrejas, centros culturais, galerias, shoppings e até hospital. Ela é o que você vê e o que não vê. À luz do sol ou sob a garoa dos dias mais amenos, pedestres, ônibus, carros de todos os tipos, motos e bicicletas disputam a passagem; mas um mundo subterrâneo trepida quando outra multidão se locomove de metrô entre leste e oeste da cidade. Nesse espaço subtérreo, entre uma composição e outra, há comércio, música e espaço para obras de arte. Várias vezes por dia o ar poluído se agita quando helicópteros cortam o céu para pouso ou decolagem em um dos vários heliportos da região ou simplesmente pairam no ar como imensas varejeiras. A Avenida Paulista é mais do que a cara de São Paulo, ela é o retrato do Brasil, com todas as suas diferenças e similaridades. Rico ou pobre, nativo ou e migrante, todos estão aqui. Problemas? Proporcionais, mas nem por isso gosto menos de São Paulo. 
São Paulo, 462 anos. 

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

ANIVERSÁRIO DE SANTOS

Um passeio gratuito em escuna para conhecer o complexo portuário é o presente que Santos oferecerá à população no próximo dia 28 de janeiro para comemorar três datas importantes do município: o aniversário da cidade (26 de janeiro), o Dia do Trabalhador Portuário (28 de janeiro) e Dia do Porto (2 de fevereiro). Durante o trajeto guias falarão sobre a importância do Porto para a economia nacional e explicarão o funcionamento do complexo portuário santista.
 Os passeios serão oferecidos no período das 9 h às 18 h 20 e o embarque será na Ponte Edgard Perdigão, Avenida Almirante Saldanha da Gama, próximo ao Clube de Regatas Vasco da Gama, na Ponta da Praia. Os ingressos serão ser distribuídos no local.
A promoção é da Secretaria Municipal de Assuntos Portuários e Marítimos com patrocínio da Marimex – Inteligência.
Horários de partida
Os interessados devem chegar meia hora antes do embarque.
• Tamburutaca (90 passageiros): 9h, 11h, 13h, 15h e 17h
• Genesis (150 passageiros): 9h40, 11h40, 13h40, 15h40 e 17h40.
• Lady Linda (110 passageiros): 10h, 12h, 14h, 16h e 18h.
• Mestre dos Mares (198 passageiros): 10h20, 12h20, 14h20, 16h20 e 18h20.

Porto de Santos visto do Monte Serrat. Foto: HPA. 



(Fonte: Diário Oficial de Santos.)

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

ESTRELA ULTRAPOBRE

A mais brilhante estrela ultrapobre em metais (UMP) conhecida até agora foi identificada por uma equipe de astrônomos do Brasil e dos Estados Unidos, coordenada pelo professor Jorge Meléndez, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo. O trabalho desenvolveu-se no Observatório Europeu do Sul (ESO), sediado no Chile.
A ultrapobre não recebeu nenhum nome poético, pelo menos até agora; ganhou uma identificação alfanumérica bem sem graça: 2MASS J18082002–5104378. O informativo do IAG/USP explica que estrelas com menor quantidade de metais são essenciais para o estudo detalhado do início da Via Láctea (onde está localizado o sistema solar) porque elas são mais primitivas. A distância aproximada da estrela em relação ao sistema solar é de 2500 anos-luz, ou seja, a luz da estrela demora 2.500 anos para chegar a Terra.
O esplendor do céu noturno ou a fúria da natureza sempre atraíram a curiosidade e o interesse do homem. Os vestígios das culturas pré-históricas – como iranianos, babilônios, chineses, hindus, gregos e maias – mostram com clareza essa preocupação de observar metodicamente os astros. Cláudio Ptolomeu (110-170), usando dados de vários observadores, fez uma descrição matemática dos movimentos planetários do Sol e da Lua, que serviram de base para a astronomia ocidental durante os catorze séculos seguintes até que Copérnico (1473-1543) demonstrou que a Terra girava em torno do Sol e não o contrário. O resto é história da ciência e da política.
Os astrônomos da antiguidade viam muito mais que astros pelo céu. À medida que identificavam as constelações davam-lhes nomes de animais, de figuras mitológicas ou de objetos que reconheciam nos desenhos. Das 48 constelações descritas por Ptolomeu, 47 continuam com o mesmo nome. E há ainda os poetas, que se encarregaram de dar mais beleza ao cenário vislumbrado da Terra. Os gregos representavam a Lua como uma bela jovem que percorre o céu num carro de prata puxado por dois cavalos; figura semelhante à de Apolo, deus da Luz, que transporta diariamente o carro do Sol para o alto do céu e depois o guarda atrás das montanhas. Nem Ptolomeu resistiu à beleza: “[...] Mas, quando sigo à minha vontade a densa multidão de estrelas no seu curso circular, os meus pés deixam de tocar a Terra...”.
A astronomia desenvolveu-se a partir do século XX graças aos avanços da tecnologia, permitindo inclusive o grande salto para Lua em 20 de julho de 1969. Dia ou noite o céu continua maravilhoso, apesar dos aviões, foguetes e satélites artificiais que desde o século XX – para o bem ou para o mal – circulam por lá.
Canal da Mancha, 8 de junho, 2015. Foto: H.P.A. 

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016


TRAVESSIA


O veterano inglês da II Guerra retornava da França, onde participara das comemorações dos 71 anos do Desembarque e, em Caen (Normandia), quando ia embarcar para uma travessia do Canal da Mancha cheia de tristes recordações, foi abordado pela senhora francesa que agradeceu calorosamente a contribuição dele para a Liberação. (E note-se que nem havia nascida na época!) Emocionado, ele se despediu e, com uma valentia bem diferente, marchou a passos trôpegos para o ferry, onde o esperavam outros companheiros daqueles tempos sombrios. Depois daquele beijo, quem sabe o coração do velho guerreiro tenha se aquecido e batido com mais vigor? (8/6/2015) Fotos: Hilda P. Araújo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

AS LOIRAS DE HITCHCOCK
Sem programa para as noites chuvosas? Que tal assistir aos filmes de Alfred Hitchcock? Mesmo quem conhece a obra do diretor inglês radicado nos Estados Unidos não ficará entediado e até se surpreenderá porque a qualidade é muito superior ao que se exibe, atualmente, por aí como ótimo. Depois há ainda a possibilidade de descobri-lo em meio ao filme ou de apreciar as loiras que estrelavam seus filmes: Grace Kelly, Ingrid Bergman; Kim Novak; Marlene Dietrich, Doris Day, Julie Andrews e Tippi Hedren entre tantas outras.  
       Difícil escolher por onde começar a organizar um festival Hitchcock (1889-1990) caseiro. Uma boa solução para a seleção seria a ordem cronológica das principais produções norte-americanas. Em 1940 ele dirigiu “Rebeca, a mulher inesquecível”, com Laurence Olivier, Joan Fontaine e George Sanders. Uniu-se ao esforço de guerra e produziu “O Sabotador” em 1941 e “Um barco e nove destinos” em 1944. Divertido assistir a “Notorious” (1946) que se passa em uma caricatura do Rio de Janeiro (diga-se Brasil) e tem como protagonistas Cary Grant e Ingrid Bergman. Em 1948 lançou “Festim diabólico”, primeiro filme colorido de Hitchcock. Ator principal: James Stewart.
          A década de 1950 começa com um clássico a que diretores atuais não resistem: “Pacto Sinistro” com Robert Walker, Farley Granger e Ruth Roman. Não há refilmagem que o supere. Em “O homem que sabia demais” (1956), James Stewart está de volta com Doris Day, que canta “O que será, será” na tentativa de localizar o filho sequestrado. Em 1958, ele estrelou “Um corpo que cai” (1958). A loira da vez foi Kim Novak. Perfeito (apesar da cena em que ela é resgatada da água com os sapatos calçados!).
          As obras seguintes são: “Intriga Internacional” (1959) – Cary Grant, Eva Marie Saint e James Mason; “Psicose” (1960) – Antony Perkins e Janet Leigh; “Os Pássaros“ (1963) – Rod Taylor e Jessica Tandy; “Marnie, Confissões de uma ladra” (1954) – Sean Connery e Tippi Hedren: “Cortina Rasgada” (1966) – Paul Newman e Julie Andrews.
Estes são os principais filmes do mestre do suspense, mas há muito mais. O Netflix tem vários à disposição dos assinantes.

Grant e Bergman em cena de "Notorius".


  

domingo, 10 de janeiro de 2016

SEMPRE ATUAL
Florença: cópia do Davi de Michelangelo. Foto: H. Araújo.

“Que sua primeira preocupação, jovens, seja a de zelar pelo seu caráter: as qualidades da alma se somam aos atrativos do rosto. O amor baseado no caráter é durável; a beleza será devastada pela idade e rugas sulcarão seu rosto sedutor. Viera um tempo em que vocês deplorarão sua imagem no espelho e esse desgosto lhes trará novas rugas. A virtude basta, dura toda vida, tão longa ela seja, e alimenta o amor enquanto ela própria sobrevive.”
 Ovídio (43 a. C./ 17 d. C.), “A Arte de Amar” (São Paulo: L&PM Pocket, 2013). 


sábado, 9 de janeiro de 2016

A DAMA DO JARDIM


Esta senhora fica de sentinela no acesso à Ilha das Cobras, na baía de Guanabara (RJ). Um lugar estratégico: o jardim do Serviço de Documentação da Marinha de onde olha nostálgica para a cidade. Apesar do rosto um tanto quanto deteriorado pelo destino trágico, digamos assim, ela é bela e atrai o olhar do pedestre logo que ele inicia a travessia da pequena ponte que liga o continente à ilha.
A dama é espanhola e estava a caminho da Argentina a bordo do vapor Príncipe de Asturias, quando a embarcação naufragou perto da Ilha de São Sebastião, na madrugada de 6 de março de 1916. Morreram 445 pessoas, sobrevieram 143. A dama desapareceu. O destino dela era compor o monumento “La Carta Magna e las Cuatro Regiones Argentinas”, que estava sendo erguido em Buenos Aires.
Como havia outras peças para o monumento no navio naufragado, só restou aos argentinos fazer nova encomenda aos espanhóis. Entretanto, quando o novo material chegou em 1919, houve um problema na aduana portenha que reteve tudo por um bom tempo. Enfim, problemas não faltaram nos anos seguintes e o monumento só foi inaugurado em 1927.

Nossa dama só reapareceu em 1990, quando foi resgatada do casco do naufrágio para a segurança do jardinzinho da Ilha das Cobras, que abriga o complexo do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ), o Hospital Central da Marinha, o Centro de Perícias Médicas da Marinha, o Comando Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, o Presídio da Marinha, entre outras repartições da Marinha de Guerra do Brasil.


sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

HÁ 80 ANOS

      “Carnaval nos Arcos da Lapa”, tela de Heitor dos Prazeres (1898-1966), músico e compositor carioca que também foi pintor primitivista. Ele participou da I Bienal de São Paulo, em 1951 e sua obra ficou em terceiro lugar (prêmio aquisição). O trabalho foi exibido na Bienal de Veneza e no I Festival Mundial de Arte Negra de Dakar. É dele e de Noel Rosas (1910-1937) o clássico “Pierrô apaixonado”, sucesso do Carnaval de 1936, gravado pela dupla Joel e Gaúcho. 
        O registro vale porque faltam menos de 30 dias para o "tríduo momístico" - como se costumava dizer no início do século passado. Carnavalescos esquentando os tamborins.  

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

LONGE DE CASA

A jovem parou e olhou em torno em dúvida, mas o que me chamou a atenção foi o que ela trazia nas mãos. Algo que reconheci e prontamente me identifiquei com ela. Quantas vezes já me vi em situação igual e sempre encontrei alguém para me guiar! O que ela trazia nas mãos era um mapa grande de Sampa. E, portanto, quando ela pediu informação, retribuí do mesmo jeito. Com um leve sotaque, disse que procurava a Avenida Vinte e Três de Maio, mostrou um ponto verde no mapa e tentou dizer o nome do local de destino, mas foi vencida por um punhado de vogais. A jovem queria ir ao Parque do Ibirapuera. Expliquei que a avenida não era a opção adequada e depois de me certificar de que pretendia ir mesmo a pé, ensinei-lhe o melhor caminho e despedi-me da jovem alemã, que fala um português quase perfeito – desde que não esbarre com palavras indígenas. Ela é da Bavária e passa as férias no Brasil. O sotaque dela não era de Portugal, como é comum entre os europeus que falam o idioma de Camões.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

PARA NÃO ESQUECER
Discurso das “Quatro Liberdades”, proferido pelo presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, em 6 de janeiro de 1941:
     “(...) almejamos um mundo fundado em quatro liberdades humanas essenciais. A primeira é a liberdade de expressão — em todos os lugares do mundo. A segunda é a liberdade de toda pessoa adorar deus à sua própria maneira — em todos os lugares do mundo. A terceira é a liberdade de viver sem passar necessidade (...) em todos os lugares do mundo. A quarta é a liberdade de viver sem medo (...) em todos os lugares do mundo.”
      Infelizmente, 75 anos depois, boa parte da população mundial ainda almeja liberdade de expressão, liberdade de culto, liberdade de viver sem passar necessidade e liberdade de viver sem medo.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

SÃO PAULO
JOVEM BOEMIA - Na segunda metade do século XIX, o segundo Barão de Piracicaba, Rafael Tobias de Aguiar (1830-1897), e Antonio Pinto de Rego Freitas (1835-1886) doaram a área para a construção de um hospital em uma região ainda rural. As obras estenderam-se e quando se concluiu o prédio em estilo gótico ali se instalou a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo fundada, provavelmente, em 1560. (A Santa Casa de Santos data de 1534.) A Santa Casa é considerada hoje, o maior hospital filantrópico da América Latina e atende cerca de oito mil pessoas diariamente em todas as especialidades médicas de acordo com o site da instituição.
Em 1877, Dona Veridiana Prado, que morava em um palacete na Rua da Consolação, separou-se do marido Martinho da Silva Prado, foi passar uma temporada na Europa de onde voltou com o projeto de um palacete assinado pelo engenheiro Luis Liberal Pinto. O local escolhido para a nova residência foi a Rua da Santa Casa (atualmente Dona Veridiana com Avenida Higienópolis) e de sua varanda conta-se que era possível ver o bairro de Santa Cecília. O palacete em estilo eclético tem 3.500 m² e cinco mil metros quadrados de jardins. Ali Dona Veridiana recebeu ilustres personalidades brasileiras e estrangeiras – Capistrano de Abreu, Ramalho Ortigão, Oscar Pereira da Silva, José do Patrocínio, Luis Gama, a princesa Isabel e D. Pedro II em sua ultima visita a São Paulo.
Em 1959 a casa foi comprada por um grupo de empresários para instalar o São Paulo Clube – clube exclusivo, conhecido também como “clube dos banqueiros” por ser a profissão de boa parte dos sócios. A entidade fechou suas portas em 2008, quando o casarão, tombado pelo CONDEPHAAT desde 2001, foi adquirido pelo Iate Clube de Santos.  Curiosamente, o ICS foi fundado na mesma casa em 1947 pelo bisneto de Dona Veridiana, empresário Jorge da Silva Prado.
Quando Rego Freitas morreu, a chácara de propriedade dele foi vendida para a empresa de urbanismo cujos sócios eram o Senador Rodolfo Miranda e o engenheiro Manuel Buarque de Macedo – de onde provem o nome do novo bairro.   
          A Vila Buarque é um bairro de artistas, intelectuais, boêmios e estudantes. Lá estão a Universidade Presbiteriana Mackenzie, o Centro Universitário Maria Antonia – antiga sede da Faculdade de Filosofia da USP, a Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, a Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Há vários teatros – como o Eugenio Kusnet – onde funcionou o histórico Teatro de Arena –, SESC, Aliança Francesa e o Paiol Cultural; Biblioteca Municipal Monteiro Lobato e Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo. Livrarias, inclusive a Martins Fontes.
          Com tantos estudantes no bairro, durante o ano letivo, os finais de tarde na Vila Buarque podem ser surpreendentes: muita cerveja nas mesas que escorregam dos barzinhos e música que se espalha pela vizinhança. 
O verde abriga o antigo casarão de intrusos.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

O POETA 

Para começar a semana nada melhor do que Paulo Bomfim. 

Soneto I 

Venho de longe, trago o pensamento
Venho de longe, trago o pensamento 
Banhado em velhos sais e maresias; 
Arrasto velas rotas pelo vento 
E mastros carregados de agonia. 

Provenho desses mares esquecidos 
Nos roteiros de há muito abandonados 
E trago na retina diluídos 
Os misteriosos portos não tocados. 

Retenho dentro da alma, preso à quilha 
Todo um mar de sargaços e de vozes, 
E ainda procuro no horizonte a ilha 

Onde sonham morrer os albatrozes... 
Venho de longe a contornar a esmo, 
O cabo das tormentas de mim mesmo.



 

domingo, 3 de janeiro de 2016

A AÇÃO DIFERE DO DISCURSO
Quando repórteres perguntam a populares, celebridades e políticos sobre os problemas ambientais, todos dizem que é preciso salvar o planeta. Diante das declarações de amor à natureza de todos resta a pergunta: quem deixou 142 toneladas de detritos na faixa de areia em Santos (SP) entre o emissário submarino e o canal 7 e as assustadoras 363 toneladas de lixo que cobriram somente a praia de Copacabana neste réveillon – na orla toda do Rio de Janeiro o total foi de 645 toneladas?
Em Santos houve aumento da quantidade de lixo: 18 toneladas a mais do que no ano passado, enquanto no Rio foram 14 toneladas a mais. E o mais incrível é que os responsáveis comemoram a redução de garrafas jogadas fora graças a campanhas (Santos) e no Rio festejou-se o fato de ter aumentado a quantidade lixo reciclável depositado em tendas de recolhimento montadas na praia.  
É lamentável que as pessoas se comportem dessa maneira em pleno século XXI. Em uma entrevista um “porcalhão” pego em flagrante diz ao jornalista que joga mesmo o lixo no chão porque o gari virá logo limpar. Quanta consideração pelo trabalhador cuja tarefa seria menos desgastante se todos colaborassem com a limpeza! A questão é que por mais que se limpe a praia muita coisa ficará perdida na areia causando danos à fauna e mesmo a esse bicho horrível que é o Homem nada sapiens. O “porcalhão”, que disse ser operador de marketing, precisa saber que o planeta não se sustentará sem a prática cotidiana de pequenos gestos que diminuem o impacto do lixo sobre a natureza.

Ser elegante e ter charme deve inclui levar uma sacola de lixo para a praia, shows e passeios e usá-la e descartá-la adequadamente. 

sábado, 2 de janeiro de 2016

PARA LER E OUVIR
Ruy Castro está certíssimo quando diz que “A noite do meu bem” é um livro para ser lido e ouvido. Comecei a ler e aí surgiu o dilema: interromper a leitura para ir pegar um disco ou CD para ouvir esta ou aquela música naquele momento ou concluir o livro e então deixar-se levar por aquelas músicas maravilhosas nas vozes privilegiadas que povoaram as décadas de 1940 e 1950? Eu preferi ler e depois ouvir as músicas, afinal, nada me impede de folhear o livro de novo, pois é muito bom.

A noite do meu bem, Ruy Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. 

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

LEITURA
Na Victoria Station, em Londres, embarco no trem com destino a Dover e de lá para Calais a fim de tomar o trem para Paris onde passarei para o Expresso Oriente. A rota exótica promete ser imprevisível: o trem cortará a Europa até Istambul com destino à Ásia, passando por Ancara, Teerã, Cabul... Bem, trata-se de uma viagem literária que faço conduzida por Paul Theroux (1941), pois não teria condições financeiras para uma empreitada – mesmo de trem – de ida e para a Ásia volta por trajetos diferentes.
Professor de Literatura Inglesa e escritor, Paul Theroux conta com maestria a viagem que ele fez em 1975 em seu livro “O Grande Bazar Ferroviário – De trem para a Ásia”. Nada de roteiros de viagens, com indicações do que fazer, onde comer ou o que ver. “A viagem é a meta em si.” – escreve ele citando Michael Frayan (1933), que por sua vez parafraseia Marshall McLuhan (1911-1980).
Theroux adora trens (eu também) e ele narra a viagem de ida e volta para a Ásia por rotas distintas, retratando viajantes e suas diferentes culturas, pintando as paisagens e contando histórias saborosas de suas andanças por lugares pouco conhecidos em busca de uma passagem de trem, suas esperas em estações nos locais mais improváveis ou descrevendo as populações que vivem à margem das ferrovias. Seus eventuais companheiros de viagem parecem saltar de contos de ficção. Falam de sonhos, frustrações, do cotidiano, de sexo e de política. Ou não falam, apenas aparecem e ficam ao seu lado. A passagem pelo Vietnã parece ter desconcertado o americano, afinal, as tropas dos EUA haviam se retirado no ano anterior. Se a beleza do país o comove, a destruição física e moral a que os norte-americanos levaram o país o chocam profundamente.
Minha primeira viagem de trem aconteceu no verão de 1960, quando minha avó Maria Luíza me levou para um passeio por Minas Gerais. Naquela época, a Central do Brasil já estava decadente. Experiência inesquecível. As janelas amplas eram uma tela em contínua mudança; nos corredores do vagão, os passageiros se movimentavam em todas as direções e se renovavam também a cada parada. Uma agradável sensação de pertencer a um lugar e esse lugar ir a outros lugares. O prazer da viagem de trem deixou marcas profundas. Voltei a subir num trem no verão de 1975, novamente para Minas; mas no inverno de 1983, o destino foi Corumbá, onde passei a pé para Porto Suarez, na Bolívia, para pegar o “trem da morte”, numa viagem que lembra um pouquinho as aventuras de Theroux em alguns países asiáticos. Trem bom mesmo (como dizem nossos vizinhos mineiros) só conheci na Europa em 1993 e, atualmente, são muito melhores. 
Como diz o escritor americano “(...) as ferrovias são irresistíveis bazares, serpenteando perfeitamente nivelados qualquer que seja a paisagem, melhorando seu estado de ânimo com sua velocidade sem jamais derramar seu drinque. O trem pode inspirar segurança em lugares muito desagradáveis – muito diferente dos suores de pânico provocados pelos aviões, do odor nauseabundo dos ônibus de longa distância, ou da paralisia que aflige os passageiros de automóveis. Se um trem é grande e confortável, pouco importa seu destino: um assento num canto basta e você pode ser um daqueles viajantes que permanecem em movimento em cima dos trilhos, e nunca chegam nem sentem que precisam chegar – como aquele homem de sorte que passa a vida nos trens da ferrovia italiana porque é aposentado e tem um passe livre”.