segunda-feira, 30 de novembro de 2020

ESTÁ NA HORA DE VOCÊ SE TOCAR

Em um posto do SUS vejo o folheto sobre hanseníase, uma doença que era chamada de lepra, palavra que lançava ignomínia ao portador do mal e ao longo dos séculos gerou preconceito contra portadores da doença. A medicina ignorava as causas, o tratamento do mal envolvia “obscuras práticas médicas” e assim os doentes procuravam se esconder para ocultar a deformidade e a sociedade os excluía em leprosários para se salvaguardar. Nesse jogo cruel, o isolamento voluntário ou não se tornou uma das formas para enfrentar a hanseníase.

            Só para se ter uma ideia do tamanho do problema em 1266 a França tinha mais de dois mil leprosários recenseados. Só na diocese de Paris havia 43. No século XII, Inglaterra e Escócia tinham um milhão e meio de habitantes e 220 leprosários. O avanço da doença na Europa se deu, segundo Michel Foucault (1926-1984), a partir da alta Idade Média até o final das Cruzadas, quando se interrompeu o contato com os focos orientais da doença.

Assim, a partir da Idade Média a lepra praticamente desapareceu do mundo ocidental. Os leprosários se esvaziaram. Em 1635 a população de Reims (França) realizou uma procissão para agradecer a deus por ter livrado a cidade do mal. Além do final das Cruzadas, outro fator muito importante, de acordo com Foucault, foi resultado espontâneo da segregação.  

Desde o século passado a doença tem cura, mas ainda há um longo caminho para a erradicação: Índia e Brasil são, atualmente, os países com maior número de doentes de hanseníase: em 2017, a Índia teve 126.164 casos e o Brasil registrou 26.875. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). O folheto do SUS explica que a doença tem cura e o tratamento é gratuito. Ela é “transmitida pelo ar, através do convívio com pessoas doentes com hanseníase que não estão se tratando”, e atinge a pele os nervos e pode levar a deficiências físicas. Os sintomas são manchas na pele de cor variada: esbranquiçada, avermelhada ou acastanhada; manchas com diminuição de sensibilidade ao frio, calor, dor e toque; dor, dormência, sensação de choque, agulhadas ao longo dos nervos dos braços e pernas; caroços no corpo; e diminuição da força muscular das mãos, pés ou face.

A doença chegou ao Brasil com os colonizadores e os doentes foram segregados até meados do século passado, quando finalmente a legislação mudou. Encontraram-se referências à lepra em hieróglifos de 1350 a. C. e Hipócrates (c. 460 a. C. - 370 a. C) foi quem deu a denominação à doença.

Na época medieval, os doentes eram obrigados a usar um sino para alertar sobre a sua aproximação. 



Mais informações nos sites:

www.prefeitura.sp.gov.br/convisa ou ligue 156.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-01/

Fonte: Historia da Loucura, Michel Foucault. São Paulo: Editora Perspectiva, 2019.

domingo, 29 de novembro de 2020

DEGAS, VILLA-LOBOS E O FAGOTE.

Último domingo de novembro com arte. Edgar Degas (1834-1917) pintou L'orchestre de l'opéra” em 1870. A obra (óleo sobre tela) encontra-se no Museu d' Orsay, Paris. O maestro Heitor Villa-Lobos (1887-1959) compôs "Ciranda das Sete Notas" para fagote e cordas em 1933. 

L'orchestre de l'opéra (1870), óleo sobre tela de Edgar Degas, Museu de Orsay, Paris.


sábado, 28 de novembro de 2020

QUEM SABE

 Foi bem antes da internet que eu quis comprar uma gravação dessa modinha de Carlos Gomes  (1836-1896). Percorri várias lojas de CDs e ninguém sabia de nada. Lembrei-me de uma loja de música famosa nas imediações da Praça da Sé. Loja de música porque tinha desde instrumentos musicais, partituras, song books até discos/CDs. O vendedor foi até um balcão e trouxe o CD. Para meu espanto vi que se tratava se uma gravação de Agnaldo Timóteo (1936). Naturalmente, eu conhecia vários sucessos do cantor mineiro que frequentara as paradas de sucesso dos anos de 1960/1970. Sem contar que pouco antes da eleição da Assembleia Nacional Constituinte de 1986 eu o entrevistei em Santos onde ia fazer um show. Encontro bizarro. Nunca o havia ouvido cantando Carlos Gomes...  Hoje pesquei o CD numa das pilhas de música brasileira... E para este final de novembro selecionei no youtube esta postagem.




sexta-feira, 27 de novembro de 2020

PASSEIO PARA APROVEITAR O SOL

Programa do dia um pouco diferente: descer a Rua Domingos de Moraes para ir à agência dos Correios. No caminho, aproveito o sol enquanto observo muitas pessoas com sacolas de compras. Ah! Black Friday, que se junta ao dia das bruxas nessa ânsia tupiniquim de imitar Tio Sam. Noto que o endereço fatídico fez nova vítima. Explico: trata-se de uma loja de esquina que já abrigou vários tipos de comércio, mas nada vai além de dois ou três anos. Nem uma famosa casa de comida árabe resistiu. Na papelaria, noto uma oferta imperdível: Agendas de 2020 por R$ 4,90! Comprar em novembro uma agenda do ano corrente já não me parece razoável e em se tratando de 2020 então... Na agência, as coisas não correm muito bem e resolvi que talvez seja melhor consultar o site. Caminhei mais um pouco para refrescar a cabeça, mas o sol estava quase a pino e retornei. Enquanto aguardava o sinal de pedestres (quem liga para isso?), descobri que sem máscara não se entra no Paraíso. O lado bom é que não saio sem máscara. 





quinta-feira, 26 de novembro de 2020

MUITO MAIS QUE COMER E BEBER

Um livro é sempre revelador. Descobrimos coisas sobre o autor, sobre lugares, sobre pessoas desconhecidas e até mesmo sobre nós. Com ele podemos mergulhar em dramas, romances, comédias... Esse amigo mudo nos remete a lugares que visitamos, a que desejamos voltar ou não, ou ainda vir a desbravar, quem sabe, um dia... E o que é mais importante: sempre nos ensina alguma coisa. É o que está acontecendo com a leitura de “O almofariz de Deméter. Uma breve geografia de vinhos, afeições, alimentos e apetites” do jornalista e escritor José Guilherme R. Ferreira. Estou lendo aos poucos para prolongar o prazer da leitura.  

        É bom deixar claro, logo de início, que adoro viajar, mas não tenho grandes interesses em comida, contudo, um bom vinho quem recusa? A primeira crônica (“À mesa, com convicção”) foi uma ótima surpresa porque trata do inspetor Salvo Montalbano, personagem criado pelo escritor italiano Andrea Camilleri (1925-2019), que descobri anos atrás na série de TV da RAI. Ah! E retorno à maravilhosa Sicília cuja paisagem é inesquecível. A crônica é uma ode à boa mesa siciliana, revelada através da obra de Camilleri.

        Foi na segunda crônica (“A sopa do imperador”) que se fez a revelação: em matéria de comida sou como Napoleão Bonaparte “que sempre considerou a comida uma mera necessidade, a ser consumida o mais rápido possível”.  Assim, em minhas viagens raramente me interesso pela cozinha local. Exceções: Portugal, França, Itália, Marrocos e Grécia. Nos Estados Unidos, New Orleans.

      Avanço sem me incomodar com a sequência. Ah! Quero voltar a Taormina (Sicília) e conhecer as Ilhas Cayman (Caribe). E aquele delicioso creme chantilly foi criado pela falta de ovos? Não me lembrava dos figos-da-índia, que em casa chamávamos de figos do inferno e nunca mais vi em feiras e mercados. Respiro aliviada ao saber que o consumo de içás no Brasil não é esquisitice de paulista. Amei a descrição das castanhas europeias...

        Revelações do autor e da leitora: quando o autor se lembra das férias em Santos, nos tempos de criança, “não eram férias de verdade, sem o Opala alaranjado e a raspadinha, colorida de groselha”. E eu, santista, descubro que nunca saboreei raspadinha...

“O almofariz de Deméter. Uma breve geografia de vinhos, afeições, alimentos e apetites.” Santana do Parnaíba, SP: Pioneira Editorial, 2020. 

José Guilherme R. Ferreira é autor de "Vinhos no Mar Azul – Viagens Enogastronômicas". (Editora Terceiro Nome). 

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

PACIÊNCIA

Lenini

 Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma

Até quando o corpo pede um pouco mais de alma

A vida não para

 

E quando o tempo acelera e pede pressa

Eu me recuso faço hora vou na valsa

A vida é tão rara

 

Enquanto todo mundo espera a cura do mal

E a loucura fingi que isso tudo é normal

Eu finjo ter paciência

 

O mundo vai girando cada vez mais veloz

A gente espera do mundo, o mundo espera de nós

Um pouco mais de paciência

 

Será que é tempo que lhe falta pra perceber

Será que temos esse tempo pra perder

E quem quer saber a vida é tão rara, tão rara

 

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma

Até quando o corpo pede um pouco mais de alma

Eu sei a vida não para, a vida não para não

 

Será que é tempo que lhe falta pra perceber

Será que temos esse tempo pra perder

E quem quer saber a vida é tão rara, tão rara

 

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma

Até quando o corpo pede um pouco mais de alma

Eu sei a vida não para, a vida não para não

 

A vida não para e é tão rara

A vida não para a vida é tão rara

A vida não para

  

Oswaldo Lenine Macedo Pimentel, ou Lenine (1959), recebeu vários prêmios ao longo da carreira: Grammy Latino (seis), APCA (dois) e vários de MPB. Lenine é engenheiro químico, músico, compositor, escritor e produtor musical entre muitas outras atividades.


domingo, 22 de novembro de 2020

QUANTAS VEZES LAVOU AS MÃOS HOJE?

Com a pandemia, milhões de pessoas voltaram a praticar com mais empenho um ensinamento que nossos antepassados cansaram de repassar aos pimpolhos: sempre lavar as mãos. Com a facilidade da transmissão do coronavírus-19, tornou-se essencial lavar as mãos frequentemente, tomar banho e trocar de roupa ao voltar da farmácia e supermercados, passar álcool gel em tudo que chega da rua ou água sanitária diluída em água. Nada de cumprimentos, abraços e beijinhos. Rosto protegido por máscaras. Sapatos desinfetados ou de preferência à moda japonesa, deixados do lado de fora da casa ‒ no caso daqueles que saem por necessidade ou se aventuram a sair para alguma atividade saudável. Mas, por favor, não transforme a porta do seu apartamento em uma sapataria desagradável. Mulheres e homens, munidos de vassouras, rodos, aspirador de pó (robôs também?) esfregam a casa para eliminar a possibilidade de que o coronavírus se aloje em algum cantinho estratégico para atacar a qualquer momento. 

        No século XVII, os neerlandeses eram o povo mais limpo da Europa, como registraram vários visitantes estrangeiros. “As cidades brilhavam de limpas graças às horas dedicadas incansavelmente a varrer, escovar, raspar, polir, lustrar, lavar” ‒ conta o historiador inglês Simon Schama (1945). Segundo ele, o fato era “fruto mais de obsessão que preocupação razoável com a salubridade”. Havia até um manual popular que tinha um capitulo com instruções sobre as tarefas que deviam ser realizadas semanalmente. Assim, a entrada da casa tinha que ser lavada todos os dias; segunda e terça eram dias dedicados a espanar e lustrar salas e quartos; quinta, escovar e arear; sexta, limpar cozinha e porão. Todos os dias batiam-se os travesseiros pela manhã, lavavam-se os pratos após as refeições e a roupa. E assim ia a vida nos Países Baixos.

“Minha escova é minha espada; minha vassoura, minha arma,

Dormir não sei o que é, nem repousar. [...}

Nenhum trabalho é pesado demais; nem cuidado é muito grande

Para deixar tudo reluzente e imaculadamente limpo.

Esfrego e areio, lustro e escovo [...]

E não admito que ninguém leve embora minha tina.”

Os versos são de Pieter van Godwijck (1649-1712) e dão uma ideia da preocupação dos holandeses com a limpeza em tempos em que ser limpo equivalia, segundo Schama, a uma afirmação de individualidade: “Limpar era diferenciar e excluir”.  

No século XXI, a pandemia despertou nas pessoas uma preocupação maior com o asseio em geral. Os "manuais" sobre limpeza pessoal e do ambiente proliferam na internet ‒ OMS, instituições ligadas à saúde, empresas farmacêuticas e de produtos de higiene pessoal e ambiental.

Enfim, hoje contamos com a química e a tecnologia para aprimorar e facilitar a faxina diária ‒ naturalmente para quem tem meios para tanto.

(Reprodução: "Sinnepoppen", Houghton Library, Harvard University. e "Lavadeiras (1861), tela de Eliseu Visconti (1866-1944).




FONTE: "O desconforto da Riqueza. A cultura holandesa na época de ouro", de Simon Schama, Companhia das Letras, 1992.

sábado, 21 de novembro de 2020

VOLTAIRE. SEMPRE ATUAL.

François-Marie Arouet tornou-se conhecido como Voltaire. Filósofo iluminista e escritor, Voltaire escreveu poesia, teatro, romances e suas ideias tiveram grande influência tanto na Revolução americana quanto na francesa. Nasceu em Paris em 1694, filho de família rica, estudou com jesuítas; levou uma vida bastante desregrada, adotou o pseudônimo de Voltaire em 1718, quando sua peça “Édipo” estreou. Voltaire, de acordo com biógrafos, tinha dois vícios: jogo e café - bebida cara na época e ele chegava a consumir 20 xícaras por dia. 

Sua defesa do livre pensar levou-o três vezes para a prisão: aos 23 anos passou um ano na Bastilha por causa de sátiras sobre o duque de Orléans; aos 32 anos entre a prisão e o exílio, preferiu ir para a Inglaterra. O período de exílio resultou na publicação das “Cartas Filosóficas” ou “Cartas da Inglaterra”, em que criticava o absolutismo da monarquia francesa. A obra foi queimada em praça pública. Novamente, ele fugiu de Paris para onde retornou em 1735. Em 1746 tornou-se membro da Academia Francesa de Letras. Na velhice, foi viver no campo, mas morreu em Paris. Suas confrontações com a Igreja provocaram a ira de um bispo que proibiu que o corpo fosse enterrado na abadia escolhida pela família, mas a proibição chegou tarde. Entretanto, com o advento da Revolução Francesa (1789), os restos foram transladados para o Pantheon de Paris (antiga igreja de Santa Genoveva), no Quartier Latin. Foto: Estátua de Voltaire do Pantheon, de H.P. Araújo. Reprodução do quadro de Nicolas de Largillière (1656-1746), Wikipedia. 



sexta-feira, 20 de novembro de 2020

TEMPO DE SOMBRINHAS

Você usa sombrinha para se abrigar do sol e guarda-chuva para se proteger da chuva, mas, pelo menos em São Paulo, dizem que sombrinha é  para mulher e guarda-chuva para homem como tentou se justificar alguém quando me pus a protestar por causa do nome equivocado dado ao objeto em questão. Eu considero mais prático o chapéu que deixa as mãos livres. Nesta sexta-feira primaveril de novembro de um ano completamente atípico, resolvi passear pelas telas impressionistas dos séculos XIX e XX já que não posso flanar pela cidade a meu bel prazer. 

A LEITORA, do pintor americano Frank Weston Benson Pintor (1862-1951).



 
LISA COM A SOMBRINHA NA FLORESTA (1867), óleo sobre tela de Pierre-Auguste Renoir. Museu D’Orsay, Paris. Lise Tréhot era companheira de Renoir. Acima à esquerda;

O PASSEIO, Mulher com sombrinha, 1875, Claude Monet, óleo sobre tela, National Gallery (Washington D.C.).  Acima à direita.


THE CONSERVATORY (1879), de Édouard Manet (1832-1883).  Alte Nationalgalerie, em Berlim.




Retrato de Nadezhda Repina (1900), tela dee Ilya Repin (1844-1930). Tretyakov Gallery, Moscou. Acima à esquerda.

SPRING (Jeanne Demarsy), óleo sobre tela de 1881, de Édouard Manet. The J. Paul Getty Museum, Los Angeles. Acima à direita.

MULHER COM SOMBRINHA BRANCA, de Nadezda Petrovic (1873-1915). Norodini Museum Belgrado.

A SOMBRINHA PERDIDA, obra do pintor inglês Arthur Hacker (1858-1919).

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

SANEAMENTO BÁSICO E BANHEIRO PARA TODOS

Hoje é um dia importante para refletir sobre uma coisa que parece tão banal em nossas vidas, mas que ainda é privilégio: SANEAMENTO BÁSICO. Privilégio, sim, quando 4,2 bilhões de pessoas das 7,8 bilhões que constituem a população mundial vivem sem acesso a um sistema de saneamento seguro. Hoje é o Dia Mundial do Saneamento Básico e do Banheiro, que este ano tem como tema “Saneamento sustentável e mudanças climáticas”.

As mudanças climáticas provocam enchentes e elevação do nível do mar, ameaçando os sistemas de saneamento ‒ desde banheiros, fossas sépticas e até estações de tratamento. A principal ameaça é a danificação e contaminação de poços usados tanto para consumo humano como irrigação agrícola, causando doenças crônicas e mortais como cólera e febre tifoide. O alerta é da Organização Mundial de Saúde cujo objetivo (muito otimista) é fornecer água e estender o saneamento para todos até 2030.

O IAS promove hoje debates sobre o Saneamento com a participação de especialistas, ativistas e líderes da sociedade civil. O evento ocorre durante todo o dia - de 9 h 30 às 17 h, no canal do IAS no YouTube e na página do Facebook. 

https://www.youtube.com/watch?v=E1d5-HO9P6U&ab_channel=Instituto%C3%81guaeSaneamento

(Foto: ONU. Eriam Sheikh, de 7 anos, sai do "banheiro" sobre palafitas. Mumbai, Índia.

HOJE É DIA DA BANDEIRA

 


terça-feira, 17 de novembro de 2020

A ARTE DE WILLIAM FOURNEAUT

Em casa não se assobiava, embora uma das minhas tias fosse perita em assobios. “Não é polido” ‒ dizia minha avó que comandava a família. Até hoje sinto-me desconfortável quando ouço alguém assobiando para chamar outra pessoa. Entretanto, por uma dessas contradições da vida, toda a família adorava a arte de William Fourneaut que se apresentava em shows de televisão na década de 1960. Ele era um assobiador exímio e muito simpático.

        Infelizmente, não encontrei muitas referências sobre ele. Era conhecido como o homem dos sete instrumentos. Dizem que tinha ouvido absoluto, denominação da rara capacidade de reproduzir “uma imagem auditiva interna de qualquer tom musical marcado por um símbolo apropriado”. Foi a principal atração da orquestra de Georges Henry (1919-2017), maestro que comandou o show de inauguração da televisão no Brasil ‒ a TV Tupi (18/9/1950) de São Paulo. De acordo com o maestro "Muitas e muitos lembram de William Fourneaut que foi a principal atração de minha orquestra brasileira dos anos 40 e 50. William era um fenômeno musical. Gordo, era leve como uma pluma quando dançava. Cantava e imitava todos os cantores líricos ou populares. Tocava piano sem ter estudado ‒ e como tocava! Assobiava como se seu assobio fosse um instrumento tocado com a virtuosidade e o bom gosto de um verdadeiro musico”.

Fontes:

http://opontodosmusicos.blogspot.com/2015/01/william-fourneau.
html https://pt.wikipedia.org/wiki/Ouvido_absoluto


segunda-feira, 16 de novembro de 2020

DIA INTERNACIONAL DA TOLERÂNCIA

Eis o que mais está em falta em todo o mundo: tolerância. Tolerância social - aceitação de pessoas ou grupos que se diferenciam por seus valores morais. Tolerância racial ‒ aceitação de pessoas de diferenças raças. Tolerância religiosa ‒ respeito às diferentes confissões de fé. Tolerância política ‒ aceitação das diferentes opções políticas de cada um. O conceito remete à Declaração Universal dos Direitos Humanos que estabelece que todas as pessoas têm direito à liberdade de pensamento, consciência e religião (Artigo 18) e todos têm direito à liberdade de opinião e expressão (Artigo 19).  A data foi instituída pela ONU e se refere à assinatura de constituição da UNESCO: em 16 de novembro de 1945.

Sugestão de leitura: “Tratado sobre a tolerância”, de Voltaire (1694-1778). São Paulo: Edipro, 2017. O livro foi publicado em 1763 e Voltaire pôs nele todo seu talento em defesa da justiça e contra a barbárie. Vale para os dias atuais.


domingo, 15 de novembro de 2020

LEMBRANÇAS DO RIO DE JANEIRO

Era 15 de novembro e também um domingo. Não tão distante: 2015. O antigo Distrito Federal ainda dormia e eu perambulava pela Praça da República, onde a banda militar homenageava a data. O fato histórico ocorreu há 131 anos no Campo de Santana, que hoje divide o espaço com a Praça da República. 



A Proclamação da República (1893), óleo sobre tela de Benedito Calixto Acervo: Centro Cultural São Paulo.

A proclamação da República, óleo sobre tela de Oscar Pereira da Silva. Acervo: Museu Casa de Benjamin Constant, Rio de Janeiro.

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

CONTOS E RECANTOS DO BRASIL


Novo livro do amigo de longa data
Silvestre Silva. Repórter fotográfico, um artista de fina sensibilidade que nos últimos anos focaliza suas lentes na natureza. Capturou imagens maravilhosas de árvores, flores e frutas nativas pelo Brasil afora, disponíveis em vários livros; mas agora ele nos brinda com "Contos e Recantos do Brasil relatos de um fotógrafo aventureiro por um Brasil cheio de histórias incríveis" (Editora Europa). Já encomendei. Tenho certeza de que deve ser muito bom, afinal, ele sempre soube contar histórias com muito sabor.



quinta-feira, 12 de novembro de 2020

SOBRE ANJOS E UMA PRINCESA

Ela foi uma das mais belas atrizes americanas e acabou se casando com um príncipe, bem no estilo conto de fadas. Aquela parte do “foram felizes para sempre” fica a critério de cada um dos fãs que se deu ao trabalho de ler sua biografia. É muito provável que a época mais divertida tenha sido aquela que trabalhou como modelo e fez teatro e cinema. Grace Kelly nasceu em 12 de novembro de 1929 na Filadélfia em família rica e influente. Dos onze filmes que estrelou três foram sob a direção de Hitchcock. Ela abandonou o cinema para se casar em abril de 1956 com o príncipe Rainier III (1923-2005), de Mônaco. Grace Kelly morreu em consequência de um acidente de carro em setembro de 1982 em Mônaco.  

         O último trabalho como atriz foi “Alta Sociedade” em 1956, dirigido por Charles Walters (1911-1982). O filme reúne a nata da música americana: Louis Armstrong, Frank Sinatra e Bing Crosby e ainda tem canções de Cole Porter (1891-1964). Mais para quê? 


A POESIA DE AUGUSTO DOS ANJOS

Quem relaciona poesia a romance, imagens elegantes e sentimentos nobres, precisa conhecer o paraibano Augusto de Carvalho Rodrigues da Silva ou simplesmente Augusto dos Anjos (1884-1914). Não sei a que escola literária pertence, mas me parece realista, pois seus versos embalam palavras pouco comuns em poesia e imagens fortes para espíritos que buscam enlevo e delicadeza. Augusto dos Anjos formou-se em Direito em Recife e foi professor na escola em que estudou; mais tarde mudou com a família para Minas, onde morreu de pneumonia no dia 12 de novembro de 1914. Publicou apenas um livro - “EU” (1912). Escolhi dois poemas em homenagem ao grande poeta brasileiro.

 PSICOLOGIA DE UM VENCIDO

 Eu, filho do carbono e do amoníaco,

Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

 A LÁGRIMA

– Faça-me o obséquio de trazer reunidos
Cloreto de sódio, água e albumina…
Ah! Basta isto, porque isto é que origina
A lágrima de todos os vencidos!

-“A farmacologia e a medicina
Com a relatividade dos sentidos
Desconhecem os mil desconhecidos
Segredos dessa secreção divina”

– O farmacêutico me obtemperou. –
Vem-me então à lembrança o pai Yoyô
Na ânsia física da última eficácia…

E logo a lágrima em meus olhos cai.
Ah! Vale mais lembrar-me eu de meu Pai
Do que todas as drogas da farmácia!

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

HOJE TEM FEIJOADA

Quarta-feira é dia de feijoada. Pelo menos em São Paulo todo restaurante que se preza oferece à distinta clientela feijoada como prato principal. Eu gosto demais do sabor da feijoada - adoro feijão preto, mas só como a carne seca e o paio; houve época em que me deliciava com a costela de porco, mas foram outros tempos. Que tal uma apreciar uma feijoada poética, à moda de Vinicius de Moraes (1913-1980)? Em casa nunca temperamos o feijão com tomate e louro, como o poeta receita. Enfim, vamos lá.

 FEIJOADA À MINHA MODA 

Rio de Janeiro, 1962

Amiga Helena Sangirardi 
Conforme um dia eu prometi 
Onde, confesso que esqueci 
E embora - perdoe - tão tarde 

(Melhor do que nunca!) este poeta 
Segundo manda a boa ética 
Envia-lhe a receita (poética) 
De sua feijoada completa. 

Em atenção ao adiantado 
Da hora em que abrimos o olho 
O feijão deve, já catado 
Nos esperar, feliz, de molho. 

E a cozinheira, por respeito 
À nossa mestria na arte 
Já deve ter tacado peito 
E preparado e posto à parte 

Os elementos componentes 
De um saboroso refogado 
Tais: cebolas, tomates, dentes 
De alho - e o que mais for azado 

Tudo picado desde cedo 
De feição a sempre evitar 
Qualquer contato mais... vulgar 
Às nossas nobres mãos de aedo 

Enquanto nós, a dar uns toques 
No que não nos seja a contento 
Vigiaremos o cozimento 
Tomando o nosso uísque on the rocks. 

Uma vez cozido o feijão 
(Umas quatro horas, fogo médio) 
Nós, bocejando o nosso tédio 
Nos chegaremos ao fogão 

E em elegante curvatura: 
Um pé adiante e o braço às costas 
Provaremos a rica negrura 
Por onde devem boiar postas 

De carne-seca suculenta 
Gordos paios, nédio toucinho 
(Nunca orelhas de bacorinho 
Que a tornam em excesso opulenta!) 

E - atenção! - segredo modesto 
Mas meu, no tocante à feijoada: 
Uma língua fresca pelada 
Posta a cozer com todo o resto. 

Feito o quê, retire-se caroço 
Bastante, que bem amassado 
Junta-se ao belo refogado 
De modo a ter-se um molho grosso 

Que vai de volta ao caldeirão 
No qual o poeta, em bom agouro 
Deve esparzir folhas de louro 
Com um gesto clássico e pagão. 

Inútil dizer que, entrementes 
Em chama à parte desta liça 
Devem fritar, todas contentes 
Lindas rodelas de linguiça 

Enquanto ao lado, em fogo brando 
Desmilinguindo-se de gozo 
Deve também se estar fritando 
O torresminho delicioso 

Em cuja gordura, de resto 
(Melhor gordura nunca houve!) 
Deve depois frigir a couve 
Picada, em fogo alegre e presto. 

Uma farofa? - tem seus dias... 
Porém que seja na manteiga! 
A laranja gelada, em fatias 
(Seleta ou da Bahia) - e chega. 

Só na última cozedura 
Para levar à mesa, deixa-se 
Cair um pouco da gordura 
Da lingüiça na iguaria - e mexa-se. 

Que prazer mais um corpo pede 
Após comido um tal feijão? 
- Evidentemente uma rede 
E um gato para passar a mão... 

Dever cumprido. Nunca é vã 
A palavra de um poeta... - jamais! 
Abraça-a, em Brillat-Savarin 
O seu Vinicius de Moraes. 


 "O homem de sete cores" (1916), de Anita Malfatti. 

terça-feira, 10 de novembro de 2020

A PANDEMIA NÃO TERMINOU

Sexta-feira, na volta das miniférias, atravessei a cidade para chegar ao meu reduto e fiquei pasma ao observar que tudo parecia ter voltado ao normal: trânsito intenso que obrigou o motorista a mudar de caminho várias vezes, passando da Marginal para lugares como a Barra Funda, o Minhocão e o Centro, tudo muito movimentado. Será que ninguém mais se importa com o coronavírus? Muita gente sem máscara. A pandemia está longe de terminar. A segunda onda já ameaça a Europa. Muito preocupante. Domingo tive que ir a um supermercado da Vila Mariana e peguei o metrô, apenas uma estação, e fiquei surpresa por ver que num dia ensolarado e quente, a estação estava vazia, como em abril... A população do bairro em que moro parece mais esclarecida. Embora o movimento tenha aumentado, está longe de parecer com os velhos tempos...

  Plataforma de embarque: estação Vila Mariana, 8 de novembro, 11 horas da manhã. 


segunda-feira, 9 de novembro de 2020

A IMPORTÂNCIA E A BELEZA DA CIÊNCIA

O mundo assombrado pelos demônios - A ciência vista como uma vela no escuro” é um dos meus livros preferidos porque em uma linguagem simples e agradável mostra a importância da ciência na vida das pessoas e das nações; e aborda temas polêmicos com sensibilidade. O autor é CARL SAGAN (1934-1936), físico que tornou a ciência acessível aos leigos, assim como Stephen Hawking (1942-2018) e Michio Kaku (1947). 

Sagan formou-se pela Universidade de Chicago em 1954 em Artes e no ano seguinte em ciências. Tornou-se professor de astronomia e ciências espaciais na Cornell University e cientista visitante no Laboratório de Propulsão a Jato do Instituto de Tecnologia da Califórnia; foi agraciado com vários prêmios pelos seus trabalhos na divulgação da ciência. Entre suas obras destacam-se “Cosmos” (1980), “Os Dragões do Eden” (1978), “Bilhões e Bilhões” (1997) e “Pálido Ponto Azul” (1994). Sagan nasceu em Nova York em 9 de novembro. 

“Descobrir que o Universo tem cerca de 8 bilhões a 15 bilhões de anos, em vez de 6 a 12 mil anos*, aumenta a nossa apreciação de sua extensão e grandiosidade; nutrir a noção de que somos uma combinação especialmente complexa de átomos, em vez de um sopro da divindade, pelo menos intensifica o nosso respeito pelos átomos; descobrir, como agora parece provável, que o nosso planeta é um dentre bilhões de outros mundos na galáxia da Via Láctea, e que a nossa galáxia é uma entre bilhões de outras, expande majestosamente a arena do que é possível; saber que nossos antepassados eram também os ancestrais dos macacos nos une ao restante da vida e torna possíveis reflexões importantes ‒ ainda que por vezes tristes ‒ sobre a natureza humana.

 

*’Nenhuma pessoa religiosa inteligente acredita nisso. Isso é coisa do tempo do onça’, escreve um dos consultores deste livro. Mas muitos ‘criacionistas científicos’ não só acreditam, como estão fazendo esforços cada vez mais agressivos e bem sucedidos para que isso seja ensinado nas escolas, museus, zoológicos e livros didáticos. Por quê Porque a soma das gerações, as idades dos patriarcas e de outras figuras da Bíblia, chega a esse númer, e a Bíblia não ‘erra nunca’.” (Excerto de “O mundo assombrado pelos demônios - A ciência vista como uma vela no escuro”. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.)

sábado, 7 de novembro de 2020

LIBERDADE PROVISÓRIA E BOAS LEMBRANÇAS

Depois de quase oito meses restrita ao bairro e duas escapadas ‒ uma até a Praça João Mendes para buscar um livro e outra até o início da Avenida Paulista para aproveitar um dia de sol ‒ fui ver o mar a convite de uma amiga desesperada por liberdade. Assim, descemos a serra até São Sebastião (SP) para nos refugiarmos alguns dias na praia de Juqueí a 150 km de Sampa. Naturalmente, levamos máscaras, álcool em gel e mantivemos distância de todos. 

        Por três dias a vida pareceu quase normal. Céu azul (com uma tempestade passageira), mar azul e convidativo, sol agradável de outono e aquela areia limpa e branca para afundar os pés... Três quilômetros de praia para percorrer sem pressa, ouvindo as ondas chegando como a dar boas-vindas... Do outro lado o maciço verde da Serra do Mar (Parque Estadual da Serra do Mar). Juqueí, que significa “rio do espinheiro que dorme” em Tupi, fica entre os rios Una e Juqueí.

        O recreio terminou. E o retorno a São Paulo incluiu uma breve visão de Bertioga e um trecho da rodovia Mogi-Bertioga (SP-98, Rodovia Dom Paulo Rolim Loureiro), que trouxe lembranças de um passeio exploratório da estrada com dois amigos antes ainda da inauguração ‒ 1982. No topo da serra, impedidos de descer pela via que recebia os retoques finais, fomos por trilha até Bertioga. Uma aventura e tanto!






MOGI-BERTIOGA A PÉ COM AMIGOS: 1982.