quarta-feira, 24 de abril de 2024

PÉ NA ESTRADA

A serviço no Parque Estadual Ilha do Cardoso, década 1990. Foto: Chuvisco.

Frequentemente, escrevo sobre minhas viagens ao exterior, mas viajei pelo Brasil antes de atravessar as fronteiras do país. Sou paulista e, naturalmente, São Paulo é o estado que melhor conheço. Nasci em Taubaté, cidade que só fui conhecer há nove anos, e cresci em Santos, que é realmente a minha cidade. Posso dizer que conheço bem o litoral paulista – de Norte a Sul. Minha primeira viagem foi a Tambaú, para onde os milagres do padre Donizete Tavares de Lima atraiam centenas de peregrinos. Devia ter uns quatro ou cinco anos. Lembro vagamente da viagem de carro com a família e da terra vermelha da cidade. Depois que minhas tias casaram, ficamos apenas eu e minha avó e às vezes viajávamos para o interior. Saíamos muito cedo de casa para o passeio, tomávamos o ônibus para São Paulo onde nos transferíamos para outro. Foi assim que visitei Araras, Leme, Rio Claro, Campinas e Caçapava. Quando fiz 15 anos, ela me proporcionou um presente tão maravilhoso quanto os livros que me deu ao longo da vida: uma viagem de trem para Minas Gerais. O começo da aventura foi em Bauru, onde voltei outras vezes. 

            Tento me lembrar das cidades que conheço ou visitei a serviço – estas são a maioria, mas é difícil. São poucas, pois o Estado de São Paulo tem 645 municípios. Assis, Campinas, Campos do Jordão, Diadema, Eldorado, Embu das Artes, Franca, Guarulhos, Itapetininga, Itariri, Itu, Jarinu, Jundiaí, Mairiporã, Mauá, Miracatu, Mogi das Cruzes, Osasco, Piracicaba, Pirassununga, Porto Feliz, Registro, Ribeirão Preto, Ribeirão Pires, Santa Isabel, Santa Rita do Passa Quatro (terra natal de minha avó), São Bernardo do Campo, São Caetano, São Carlos, São José do Rio Preto, São José dos Campos e Teodoro Sampaio.

Todas as vezes que fui a Piracicaba, lembro de ter feito refeições num restaurante à beira rio; de Teodoro Sampaio, boas recordações do Parque Estadual do Morro do Diabo. A primeira cobertura de interdição de uma rodovia por enchente foi em Miracatu.

O litoral de São Paulo possui cerca de 880 km de extensão: Ubatuba, Caraguatatuba, São Sebastião, Ilhabela, Bertioga, Guarujá, Santos, São Vicente, Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém, Peruíbe, Iguape, Ilha Comprida e Cananeia. Cubatão, embora não tenha praia, faz parte do Litoral Sul. Fiz caminhada de um dia de Peruíbe a Iguape duas vezes; acampei várias vezes em São Sebastião; fiz piqueniques em Mongaguá e Peruíbe; em Itanhaém, uma inesquecível Festa do Divino; quantos domingos ensolarados na praia do Tombo em Guarujá ou no Gonzaga em Santos ou no Gonzaguinha, em São Vicente... E por aí vão as recordações.

 

terça-feira, 23 de abril de 2024

DIA DO ESCOTEIRO

Hoje é dia do Escoteiro, a maior organização mundial de voluntariado, voltada para a educação de jovens. Foi fundado em 1907 na Inglaterra por Robert Baden-Powell, um militar britânico. Quando Baden-Powell formulou a Lei Escoteira, não inclui proibições, mas conceitos para a formação de pessoas generosas. O escotismo é praticado ao ar livre e promove o trabalho em equipe. Os conceitos da Lei Escoteira, idealizada por Baden-Powell, pregam honra, integridade, lealdade, presteza, amizade, cortesia, respeito e proteção à natureza, responsabilidade, disciplina, coragem, ânimo, bom senso, respeito pela propriedade e autoconfiança. Após a realização do primeiro acampamento, a ideia espalhou-se rápida e espontaneamente pela Inglaterra.

            Ao Brasil, chegou por meio de oficiais da Marinha do Brasil, que na ocasião souberam da iniciativa e trouxeram as informações e até uniformes para a prática do escotismo.  Com eles estava outro entusiasta do movimento – Mário Sergio Cardim, que conheceu e estudou com Baden-Powel. Cardim foi o responsável por iniciar em 1914 o movimento para “crianças do escotismo feminino”, no estado de São Paulo.

A primeira organização escoteira do Brasil surgiu no Rio de Janeiro (capital do país) com o nome de Centro de Boys Scouts do Brasil. A União dos Escoteiros do Brasil (UEB), órgão regulador do escotismo nacional, reconhece como data oficial do início das atividades do movimento no país o dia 29 de novembro de 1914, quando foi instituída a Associação Brasileira de Escoteiros (ABE), com sede em São Paulo. A UEB foi criada em 1924 e seu primeiro presidente foi Affonso Penna Jr.

De de acordo com o site da entidade, o movimento existe em 607 cidades que reúnem há 1.265 grupos, cerca de oitenta mil escoteiros, enquanto vinte mil adultos prestam serviço voluntário (um adulto para cada três jovens). 

            Na Praça da República em São Paulo, há um busto do fundador do escotismo, doado à cidade pela UBE, por ocasião do centenário de nascimento de Baden-Powell. Obra em bronze sobre pedestal de granito do escultor Vicente Larocca.

            Bons relações públicas do movimento são Huguinho, Zezinho e Luizinho, os sobrinhos do Pato Donald – escoteiros que vivem muitas aventuras em acampamentos sempre com o “Manual do Escoteiro Mirim” debaixo da asa para sair das enrascadas. Maurício de Souza também trabalhou com o tema, mostrando em uma das aventuras do Cebolinha em que o personagem se entusiasma ao descobrir o significado do escotismo.

        

Praça da República. Foto: Hilda Araújo, 24/07/2023.

 





segunda-feira, 22 de abril de 2024

DIA DA TERRA


 Blue Marble  a primeira foto da nossa casa foi feita pela tripulação da Apollo 17 a caminho da Lua em  7/12/1972.  Foto NASA.

domingo, 21 de abril de 2024

AYRTON SENNA, A LENDA.

 




“Hoje – Neste dia de 1985, chovia a cântaros. Numa pista do Autódromo do Estoril completamente alagada, um jovem piloto brasileiro, ao volante de um Lotus que estava muito longe de ser competitivo, obtinha a sua primeira vitória num GP de Fórmula 1. Começava a lenda de Ayrton Senna, brutalmente interrompida nove anos depois.”  (SAPO, portal de notícias português.)

 

sábado, 20 de abril de 2024

LEMBRANÇAS DE VIAGEM

Fiz minha primeira viagem para o exterior em 1993 e eu fiz um roteiro que incluía quatro países: Inglaterra, França, Itália e Grécia. Na época, a VASP estava em agonia e tinha apenas um voo semanal para a Europa e para uma única cidade: Bruxelas. Havia dois problemas: a VASP falir antes de eu voltar e o fato de que meu interesse pela Bélgica era nenhum. Resolvi arriscar e fazer um passeio por Bruxelas e depois conhecer Bruges antes de atravessar o canal da Mancha até Dover (Inglaterra) por Oostende. A viagem foi perfeita. 

Como a volta seria por Bruxelas, 40 dias depois cheguei à cidade na véspera do embarque para São Paulo. Resolvi ir um pouco mais cedo para o aeroporto – fazia muito frio e garoava. Ao entrar no saguão, conferi os voos no monitor (naquela época as telas dos monitores tinham fundo preto com letras verdes). E lá estava “VASP – voo cancelado”! Com o coração um pouco acelerado, fui procurar o balcão da companhia para me informar sobre motivos e providências para resolver o problema. O problema, entretanto, aumentou de tamanho, quando percorri toda área de check-in e não vi nem sinal de VASP. Fiz nova volta e nada. Respirei fundo. Ainda faltavam umas três horas para início do check-in, nenhum conterrâneo à vista e então pensei que era melhor esperar sentada porque assim que os brasileiros chegassem a confusão estaria estabelecida. Dito e feito. Nem precisei esperar muito porque minutos depois localizei a funcionária da VASP puxando a placa da companhia seguida por um batalhão de brasileiros alvoroçados. Juntei-me ao grupo. Sem recursos, a empresa brasileira não tinha um balcão fixo. Alugava um espaço horas antes dos voos. Uma confusão generalizada se estabeleceu junto ao balcão, já com a tabuleta de identificação. Motivo do cancelamento de acordo com o que nos disseram: a VASP tinha apenas um avião na rota e, como fizera um voo extra, ele se atrasou na volta. Nosso voo fora transferido para o dia seguinte. Tivemos direito a um telefonema rápido para o Brasil, fomos levados para um ótimo hotel onde nos serviram o jantar e o café da manhã. Ainda fiz outras viagens pela VASP que, tristemente, encerrou suas atividades após 72 anos de existência. 



quinta-feira, 18 de abril de 2024

"ALÉM DA FANTASIA"

 


O Farol Santander sempre apresenta exposições para públicos de todos os gostos. O artista atualmente em cartaz é o premiado Yoshitaka Amano (1952). Ele é pintor, designer, cenógrafo, figurinista e ilustrador. Uma ótima oportunidade para conhecer os belos trabalhos em que ele une o tradicionalismo japonês com inspirações na arte nouveau, surrealismo e pop art. “Yoshitaka Amano, com sua paleta etérea e estilo distintamente fluído, convida-nos a explorar universos onde a beleza se manifesta tanto na luz quanto na sombra, e onde cada pincelada é um convite para viajar além da fantasia” como diz o curador Antonio Curti no catálogo da mostra “Além da Fantasia”.

A exposição pode ser visitada até 16 de junho. Rua João Brícola, 24 – Centro.









domingo, 14 de abril de 2024

ERA UMA VEZ ZÉLIA MARIA

 

Achei uma matéria que fiz para o JORNAL DA USP em fevereiro de 1992 sobre o retorno da ex-ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello à vida acadêmica na Universidade de São Paulo, logo após deixar o governo Collor. Aqui vai a transcrição de parte da reportagem que acabou gerando muito descontentamento do Conselho Universitário por causa da publicação da charge feita pelo tesoureiro do Centro acadêmico, na época. Para achar o motivo é preciso olhar com muita atenção os detalhes.

Zélia vem aí. E já está na mira dos alunos.

Zélia Cardoso de Mello reassume no dia 24, como professora MS3 de Economia Brasileira Contemporânea. O Centro Acadêmico da FEA vai recepcioná-la, vestindo os calouros com camisetas em que aparece a charge da ex-ministra ao lado dos colegas Sayad, Delfim, Pastore e Macedo. Por Hilda Prado.

Um pouco antes das 9h30 da manhã do dia 24 próximo – uma segunda-feira que ninguém sabe se será ensolarada ou não – uma professora elegante e com uma aparência austera deve tentar entrar no prédio da Faculdade de Economia e Administração (FEA) de forma discreta, como sempre fez. Pode ser que consiga, como todos os seus pares; porém, muito provavelmente, terá que ultrapassar uma barreira de câmaras de tevê, fotógrafos e jornalistas muito interessados em saber como ela vai conciliar a volta ao magistério e sua vida familiar. Imprensa e perguntas indiscretas não a assustam, ela tira de letra, porque fizeram parte do seu cotidiano.

Neste caso, toda essa curiosidade é natural, porque, afinal, queiram ou não, a professora Zélia Maria Cardoso de Mello é notícia. Entre os alunos, nenhum frisson especial, pois estão acostumados a encontrar pelos corredores e a conviver com alguns dos principais monstros sagrados da economia brasileira: João Sayad, Affonso Celso Pastore, Andrea Calabi, Roberto Macedo, Paul Singer e Delfim Netto (que este ano dá a aula magna da FEA).

            Aliás, a última aula que Zélia deu foi exatamente a aula magna da FEA, no Anfiteatro das Convenções, três dias antes de assumir o Ministério da Economia do governo Collor e anunciar um plano tão heterodoxo que deixou o país literalmente aparvalhado. Agora, retorna para dar aula de Economia Brasileira Contemporânea para os alunos do 7º semestre do período diurno. Um detalhe interessante: a maioria dos alunos desta turma já teve esta matéria no semestre passado, mas Zélia não corre o risco de enfrentar uma classe quase vazia, já que muitos estudantes do 6º semestre vão antecipar seus créditos frequentando esta aula.

0 TOQUE DOS ALUNOS – Zélia Cardoso de Mello não foi a primeira mulher a ocupar um ministério, mas certamente foi a mulher que concentrou mais poder no país em todos os tempos. A ex-ministra, a ex-dama de ferro ou ex-Tatcher brasileira polarizou a mídia nacional por quase 13 meses, mas tudo terminou numa sexta-feira (5 de maio de 1991). Quando saiu do governo, Zélia disse que saía magoada, mas estava feliz e lembrou que “a vida dá muitas voltas”. Os problemas da vida privada acabaram se tornando públicos e a ex-ministra lançou um livro, redigido por Fernando Sabino, que lhe rendeu mais críticas do que os 13 meses de governo juntos.

            A professora Zélia (que não respondeu ao pedido de entrevista solicitada pelo Jornal da USP) volta à vida acadêmica. Se fosse ministra estaria ganhando algo em torno de Cr$ 5milhões; como docente MS3 receberá Cr$1.508.380,00 (salário de fevereiro). Por enquanto ela não tem sala (o secretário de Planejamento, Roberto Macedo, ainda mantém a sua) e deverá usar a dos professores. Zélia não veio à USP para regularizar sua volta nem para escolher seu horário, o que foi feito por sua secretária particular.

Embora tudo transcorra rotineiramente lá pela FEA, há uma certa expectativa no ar. No balcão do Serviço de Graduação, funcionários atrapalhados com o acúmulo de trabalho, ouvem frequentemente a pergunta de alunos interessados em saber se “é verdade que a Zélia está voltando”. A confirmação está no quadro, que fica no corredor. Bastava dar uma olhadinha, mas parece que alguns não acreditam. Fazem questão de perguntar.

            Os alunos do Centro Acadêmico “Visconde de Cairu”, que não perdem a chance de fazer “artes”, criaram uma camiseta que vão distribuir entre os calouros, com uma charge em que  Sayad, Delfim, Zélia, Pastore e Macedo aparecem no melhor estilo de bicho, no traço de Giorgio Caputo, tesoureiro do Centro. Como os calouros não terão aulas de Economia Brasileira Contemporânea, Zélia dificilmente se confrontará com a sua caricatura usando “maria Chiquinha” na classe.


Zélia entre Sayad, Delfim, Pastore e Macedo. Reprodução JUSP.

sábado, 13 de abril de 2024

"OLHA O PASSARINHO!"

Vi a cena quando saía da Livraria da UNESP na Sé. Um lambe-lambe nesse mundo da fotografia digital? Não resisti à curiosidade, apesar da pressa, e fui ver o que ele fazia. Deduzi que o modelo dele era o monumento do apóstolo São Paulo, com a epístola na mão. Lembrei-me dos lambe-lambes da Praça dos Andradas, em Santos, onde atendiam àquela clientela que não podia pagar por fotografias de estúdio, num tempo em que máquina fotográfica era artigo supérfluo. Eram fotógrafos que trabalhavam em praças, jardins e praia. Carregavam um tripé onde colocavam uma caixa de madeira com uma lente e, após tirar a foto, o processo de revelação e copia era feito na hora. O que vi ontem me pareceu “inserido no contexto” (ah! o Pasquim!) contemporâneo. E o homem que passava distraído, parou para ler a placa de identificação da escultura curioso, talvez, pelo interesse do fotógrafo.




Praça da Sé, na hora do almoço. O fotógrafo  O homem caminha distraído.(Foto: Hilda Araújo, 10/04/2024.)

O fotógrafo ajusta o foco, analisa a luminosidade, capricha na fotografia enquanto o homem se informa... (Foto: Hilda Araújo, 10/04/2024.)

“Olha o passarinho!” – dizem que a expressão é muito antiga, vem dos tempos em que a tirar fotografia exigia muito tempo e paciência do fotógrafo e do fotografado. No caso de fotografar crianças, era difícil mantê-las imóveis por muito tempo, mas alguém teve a ideia de pendurar gaiolas no estúdio atrás do fotógrafo, que na hora da foto dizia aos pimpolhos “Olha o passarinho!” Deve haver outras versões para a expressão.


domingo, 7 de abril de 2024

DRAMA RÁPIDO

 

Dedo médio da mão machucado e preto. O farmacêutico recomenda que procure um médico para fazer um raio-X porque pode ser osso trincado. No posto, a clínica geral ouve os fatos acontecidos havia três dias, examina a vítima, me encaminha para o raio-X. O técnico faz o serviço em menos de três minutos. Volto para a médica. Alarmada, em tom baixo, diz que a fratura é muito grave. Puxa o monitor do PC, mostra o raio-X e aponta o local em que o osso se rompeu. Hum! Hum! – digo só para dizer algo. “A senhora precisa operar para religar o osso. Vamos interná-la, enquanto a senhora aguarda a ida para o hospital.” Lá pelas tantas ela disse “en passant” que perderia o movimento do dedo. Idosa, mas não lerda. Ora, fazia três dias que o dedo estava preto, não doía quase nada e continuava com todos os movimentos. Operar? Contei até dez e perguntei, educadamente, o que aconteceria se eu não operasse. “A senhora perde o movimento do dedo.” Penso cá com os meus botões que deve ter alguma coisa errada e peço a confirmação: sim – fizesse ou não a operação o resultado seria o mesmo. Ela está quase pegando a guia de internação, mas eu digo que tinha um compromisso naquele dia e voltaria “amanhã”. Ela me dá conselhos e uma receita com anti-inflamatório e analgésico. Pergunto se não pode pôr uma tala no dedo. “Só se a senhora for internada.” Ah! Bom!! Levanto, digo que voltarei “amanhã” sem falta e agradeço a atenção. Hoje fui a um ortopedista. Relato o acidente, a consulta e urgência da operação. Ele examina cuidadosamente a mão, o dedo, o pulso, que não registram nenhuma dor, e tenta disfarçar o sorriso, mas evita comentar o “diagnóstico” da colega. “Não vejo necessidade de operação nem me parece que tenha havido fratura.” Pede novos exames para tirar qualquer dúvida. Estou com Hagar, o Horrível: o que eu queria dizer era “Amanhã, vou mudar de médico”.




ESPERANDO ÔNIBUS

 FIM DE TARDE NA PRAÇA JOÃO MENDES


Foto: Hilda Araújo, 5/4/2024.

                                               Foto: Hilda Araújo, 5/4/2024.


Foto: Hilda Araújo, 5/4/2024.

segunda-feira, 1 de abril de 2024

DIA DA MENTIRA

ESTA MANHÃ – O Governo irá acabar com o 1.º de Abril, por achar que já ninguém cai nessas coisas, que só os incautos ainda se deixam enganar, e que depois das 'petas' ainda há o trabalho de vir desmentir o que foi dito, não vá uma mentira várias vezes repetida transformar-se em verdade. Assim, o 1.º de Abril irá ser substituído por todos os dias de campanha eleitoral de todas as eleições futuras.” Publicado no portal português SAPO. Hoje.

"O Grito", 1893. Obra do norueguês Edvard Munch.



domingo, 31 de março de 2024

DOMINGO DE SOL

 

Domingo cheio de sol. Céu azul! Quando era criança, na Páscoa, além do ovo tradicional de chocolate, eu ganhava um presente e, desde que aprendi a ler, era um livro de Monteiro Lobato. Guardo todos até hoje. Dessa época, lembro das músicas eruditas que as rádios transmitiam na sexta-feira, das refeições à base de peixe – bacalhau de preferência, servidas em um ambiente sério, de poucas palavras. No sábado, ouviam-se fogos na hora do almoço – era o início da malhação do judas – geralmente uma personalidade em desgraça no momento, que a garotada "castigava". Hoje seria difícil escolher. À noite, havia bailes de Aleluia – na verdade, bailes de Carnaval promovidos por muitos clubes da cidade. A semana, dita santa, terminava com o almoço da família no domingo, mas logo cedo o “coelho” deixava o ovo colorido para mim, mais ou menos como Papai Noel. Muitas vezes ouço relatos de pessoas magoadas ou desapontadas por terem sido levadas a acreditar em Papai Noel ou no coelho. Acho que nunca acreditei nas lendas, pois fiz a transição para a vida adulta sem choque com a realidade, talvez porque sempre tenha gostado da encenação. Até hoje gosto do bom velhinho... Quanto ao ovo, não ligo mais há muitas décadas. Chocolate é chocolate, não importa a forma. Um ótimo domingo para todos.



domingo, 24 de março de 2024

BANHO EM DOMICÍLIO

 

Em casa faziam-se as compras da mercearia e da farmácia por telefone. Isso em meados do século passado, época em que o cartão de crédito era a caderneta, onde o comerciante anotava os valores e enviava um papel para o cliente acompanhar os gastos. No fim do mês, acervam-se as contas. Agora, em tempos de internet e celular, tudo está disponível on line. Você só precisa sair da poltrona para receber a encomenda. Quem nunca usou o sistema, foi impelido pela pandemia a adotar o tal delivery. Acho que me enganei quando achei que se entregava de tudo em domicílio, pois não conhecia a aventura comercial de Monsieur Villete, um parisiense que em 1819 implantou em Paris uma inovação alemã: “bain à domicilie”. A empresa entregava em casa ou apartamento do interessado todo o equipamento necessário para o banho – banheira, roupão e um lençol, água quente, morna ou fria, como desejado. Após o banho tudo era levado embora e a água servida, geralmente, era escoada por uma mangueira da banheira até a sarjeta. M. Villete se comprometia a atender tanto quem morava em casa como em apartamento, mesmo no último andar do prédio! (Imagino a vizinhança!) Não devia ser um serviço barato e mesmo assim em 1838, quando Paris tinha mais de um milhão de habitantes, somente mil pessoas encomendaram os banhos domiciliares.

É bom lembrar que havia as casas de banho públicas para quem fizesse muita questão de limpeza. “Cada um tem suas próprias regras para o banho: alguns tomam banho a cada oito dias, outros, a cada dez, outros, uma vez por mês, e muitos banham-se uma vez por ano, por oito ou dez dias seguidos, quando tempo está adequando.”! M. Dejean, Traité des odeurs, 1777. Fonte: George Vigarello (1941).


"A banheira" (1886), tela de Edgar Degas.


sábado, 23 de março de 2024

SANTOS, 1930.

 

Fevereiro. Tirei a tarde para pesquisar a coleção do jornal A TRIBUNA, de Santos, na Hemeroteca do Arquivo do Estado. Folheio o livrão de janeiro/fevereiro de 1930. Uso luvas. O papel amarelado e seco exige manuseio cuidadoso. Meu interesse é genérico. Fatos curiosos, personagens anônimos que um dia (bom ou mau) viraram notícia. Algumas coisas despertam lembranças adormecidas da minha infância, sobras de conversas familiares.

Como a notinha do bilhete premiado vendido pelo “Chalet Brasil”, situado na rua do Rosário (João Pessoa), 7. Sim, as casas lotéricas eram chamadas de chalés, mas eu tinha a impressão de que a denominação abrangia também as casas de jogo do bicho, o que o Michaelis confirma. O fato é que uma das características da cidade de Santos são os chalés, construções simples de madeira, geralmente, sobre pilastras de concreto, que ainda existem em alguns bairros da cidade – como Jabaquara e Marapé. Uma das minhas tias morava em um gracioso chalé no bairro do Macuco. 

Chalés, bairro do Jabaquara. Foto: Hilda Araújo, 2016.

NATAL DOS GRILOS – Ah! Bons tempos em que os proprietários de automóveis se mobilizavam para dar “caixinha” de Natal para os inspetores de veículos do município. Objetivo: “proporcionar aos referidos inspetores um dia feliz, no seu lar modesto”. A notícia é da edição de janeiro, anterior ao dia de Reis, e informa que a administração do jornal, atendendo a pedidos dos leitores, “aceita qualquer importância que os interessados queiram destinar ao fim aludido”. E os grilos? Bem, era assim que a população se referia aos guardas de trânsito. Provavelmente por causa do apito... 

AO PÉ DE ANJO – Achei que era uma sapataria, mas a imagem tosca do clichê me fez ler o anúncio minimalista, espremido em um canto de página. Em seis linhas e meia informa que “ninguém supera a casa em vendas, compras, reformas, peças sobressalentes, linhas de todas as cores e escola de bordados”. E ainda atende em domicílio! Ah! trata-se de uma casa de máquinas de costura e o nome refere-se às costureiras e bordadeiras que usam os pés para operar o equipamento que ornou milhares de lares. Em casa tínhamos uma Singer, mas nunca se pôde dizer que eu fosse um pé de anjo.





https://www.youtube.com/watch?v=DyDlGpH8kNA

quarta-feira, 20 de março de 2024

AS CORES DO OUTONO

Para nós que vivemos em um país tropical cheio de cores e flores o ano todo, o outono é uma estação de temperatura mais amena que o verão, que está cada vez mais quente. No Hemisfério Norte, entretanto, o outono proporciona um espetáculo inesquecível de cores.

 

CANÇÃO DE OUTONO

No entardecer da terra,
O sopro do longo outono
Amareleceu o chão.
Um vago vento erra,
Como um sonho mau num sono,
Na lívida solidão.

Soergue as folhas, e pousa
As folhas volve e revolve
Esvai-se ainda outra vez.
Mas a folha não repousa
E o vento lívido volve
E expira na lividez.

Eu já não sou quem era;
O que eu sonhei, morri-o;
E mesmo o que hoje sou
Amanhã direi: quem dera
Volver a sê-lo! mais frio.
O vento vago voltou.

                  Fernando Pessoa


Praga, República Checa, 2010. Foto: Hilda Araújo.


Berlim, 2010. Foto: Hilda Araújo.

Bonn, Alemanha, 2010. Foto: Hilda Araújo.

NOVOS CAMINHOS


Que tal explorar a Zona Leste da cidade? Deixar a zona de conforto e ir mais adiante? Que tal um dos bairros mais antigos da cidade? São Miguel Paulista. No metrô Paraíso, me informo que tenho de tomar o trem no Brás. Os trens metropolitanos são muito bons e limpos. Caminho pelos corredores da estação de onde partem três linhas – a 10 Turquesa, a 11 – Coral e a 12 – Safira, mas não vejo a indicação das plataformas de embarque e quem me socorre é a mocinha de um quiosque de doces. Safira é a minha cor. O trem está na plataforma e tem poucos passageiros, mas algumas pessoas, não entendo o motivo, preferem sentar-se no chão. O ar condicionado é um alívio. Acho um lugar e me acomodo. Logo depois chega uma senhora, senta-se ao meu lado, ajeita-se e me pergunta se o trem vai para São Miguel. Sorrio e digo que esperava que sim, porque não vi ninguém para confirmar. Entra um senhor e ela pergunta se era aquele o trem, ele confirma e senta-se do outro lado. Ela já vai me dizendo que vão a um hospital, enquanto mexe no bolso externo da bolsa e resmunga que tentaram roubá-la pois o zíper estava fechado quando saiu de casa. Ela ri porque estava vazio.

            A viagem começa e a primeira parada é velha conhecida: Tatuapé (Caminho dos tatus), um bairro de IDH bastante elevado (0,936). Passamos por Engenheiro Goulart, onde se encontra o Parque Ecológico do Tietê cuja finalidade é preservar a várzea do rio Tietê. Pobre rio! Quem seria esse engenheiro? A homenagem é a Aristides de Oliveira Goulart, engenheiro e militar brasileiro, formado em 1890. Em 1893 foi cedido pelo Exército à Estrada de Ferro Central do Brasil e retornou ao serviço militar em 1896, mas voltou à empresa ferroviária em 1899 e por lá ficou até 1910, quando reingressou no Exército onde permaneceu até a reserva dois anos depois como general.

            Próxima estação: USP/Zona Leste. Merece uma visita especial. Vamos a Comendador Ermelino. A estação foi inaugurada em 1926 e o nome é uma homenagem ao terceiro filho do conde Francisco Matarazzo. Durante a I Guerra, ficou no comando do grupo enquanto o pai manteve-se na Itália. O distrito já fez parte de São Miguel, emancipou-se em 1959. Característica: bairro-dormitório.

            Minha vizinha muda para o banco do lado do companheiro. Chegamos a São Miguel Paulista. A viagem durou 40 minutos. Ao sair do trem sou envolvida pelo ar quente e sufocante desse último dia de verão. Pergunto pela praça do forró e fico aliviada por saber que é perto. Na verdade, a estação é praticamente na praça cujo nome verdadeiro é Praça Padre Aleixo Monteiro Mafra. Na calçada em frente, muitos vendedores ambulantes. Meu destino é a Capela dos Índios, a segunda antiga de São Paulo, século XVI, mas está fechada, sem contar que está protegida por uma cerca. Terei que voltar – abre às quintas-feiras e aos domingos. Vou visitar a matriz, mas essa é outra história. 



Capela de São Miguel Arcanjo, São Miguel Paulista. Foto: Hilda Araújo.

quinta-feira, 14 de março de 2024

ALBERT EINSTEIN

A circunferência de um círculo dividida por seu diâmetro tem sempre o mesmo valor 3,14159265358... É o que chamam de constante matemática, representada pela letra grega π (PI). O primeiro estudo científico sobre o valor do PI é atribuído ao grego Arquimedes (287-212 a.C.), mas até hoje não se tem o valor definitivo do PI, que pode chegar a trilhões de dígitos! Considerado um número irracional por não ser uma dízima periódica, é usado para o cálculo de área, volume e comprimento de figuras geométricas arredondadas. E daí, perguntarão muitos? Hoje é o dia do PI ou π, comemorado em alguns países. O motivo seria a forma como os americanos escrevem as datas, ou seja, hoje é 3/14. (Quanta imaginação!) Mas há um fator que poderia explicar melhor a escolha da data para a “comemoração” do dia do PI: o nascimento do físico Albert Einstein (1879-1955).

O 145º aniversário de nascimento de Albert Einstein - E=mc2.


CHARLES DICKENS

 

“Aos doze anos eu era grumete e já havia enfrentado muitas tempestades na vida, no sentido literal e no sentido figurado do termo. Sempre fui de opinião – a partir do momento em que pude formar uma opinião – que um homem que só entende de um assunto é quase tão enfadonho quanto o que não entende de assunto algum. Por essa razão, ao longo da minha vida, procurei aprender tudo o que podia e, embora eu não seja um homem culto, tenho orgulho em dizer que são muitas as coisas pelas quais nutro um vivo interesse.” O NAUFRAGIO DO GOLDEN MARY, de Charles Dickens e Wilkie Collins.

 E este é só o começo... Uma deliciosa aventura.

“Naufrágio de um cargueiro”. Óleo sobre tela do britânico William Turner (1775-1851). Acervo: Calouste Gulbenkian, Lisboa.



terça-feira, 12 de março de 2024

QUEM FOI A PRIMEIRA?

 ISSO IMPORTA?

A paulistana Yde Schloenbach Blumenschein (1882-1963) começou a escrever aos 13 anos e publicou seus primeiros trabalhos no jornal A TRIBUNA, de Santos, ficando conhecida pelo pseudônimo de Colombina. Ela estudou na Alemanha, era poliglota, pianista e cantora. Casou-se, teve dois filhos e desquitou-se para horror da família e amigos. Considerada poeta parnasiana, colaborou com as revistas Fon-Fon, Careta e O Malho. Em 1932 fundou a Casa do Poeta Lampião de Gás, que funcionava na residência dela e onde editou o jornal O Fanal. A Casa ganhou sede própria em 1948. Yde vivia sozinha, fumava, organizava saraus literários em casa e frequentava os meios literários, além de escrever poesia erótica, o que aumentou o preconceito contra ela. O seu último livro foi “Rapsódia Rubra: Poemas à Carne”.

EXALTAÇÃO

Olhas nos olhos meus. E eu vejo neste instante

toda a terra subir a um céu que desconheço.

Olho nos olhos teus. E fica tão distante

o mundo: e todo o fel que ele contem, esqueço.

 

Sorris… e, contemplando o teu lindo semblante,

o ideal de minha vida, enfim, eu reconheço.

Falas… ouço-te a voz, e, impetuosa, radiante,

num gesto de ternura, os lábios te ofereço.

 

Beijas a minha boca. E neste beijo grande

-- como uma flor que ao sol desabrocha e se expande -- ,

todo o meu ser palpita e freme e vibra e estua.

 

Tudo é um sonho, no entanto; o seu beijo… o meu crime.

Mentirosa ilusão! Pobre ilusão que exprime

somente o meu desejo imenso de ser tua!


Há 131 anos nascia no Rio de Janeiro Gilka da Costa de Melo Machado, que começou a escrever muito cedo e aos 14 anos participou de um concurso literário promovido pelo jornal A IMPRENSA, usando o próprio nome e pseudônimos. Ganhou os três prêmios principais. Ficou conhecida como Gilka Machado. Publicou o primeiro livro em 1915 – “Cristais Partidos”, com prefácio do poeta Olavo Bilac. Gilka também foi uma das pioneiras da poesia erótica, o que lhe valeu por parte da crítica o título de “matrona imoral”. A qualidade do seu trabalho superou o preconceito: ela ganhou o título de “melhor poetisa do século XX” em um concurso organizado pela revista O MALHO em 1933. (Um exagero da publicação, pois ainda faltavam 67 anos para o fim do século.) Foi casada com o poeta Rodolfo de Melo Machado (1885-1923) e teve dois filhos: Hélios e Heros. A filha tornou-se uma famosa bailarina, conhecida como Eros Volúsia. Gilka faleceu em 1980. 



Ser mulher…

Ser mulher, vir à luz trazendo a alma talhada

para os gozos da vida, a liberdade e o amor;

tentar da glória a etérea e altívola escalada,

na eterna aspiração de um sonho superior…


Ser mulher, desejar outra alma pura e alada

para poder, com ela, o infinito transpor;

sentir a vida triste, insípida, isolada,

buscar um companheiro e encontrar um Senhor…


Ser mulher, calcular todo o infinito curto

para a larga expansão do desejado surto,

no ascenso espiritual aos perfeitos ideais…


Ser mulher, e oh! Atroz, tantálica tristeza!

ficar na vida qual uma águia inerte, presa

nos pesados grilhões dos preceitos sociais!

Cristais partidos (1915)



sexta-feira, 8 de março de 2024

SANTOS, OUTROS TEMPOS.

 

Continuo folheando o centenário jornal santista, um bom exercício para conhecer uma época e avaliar os avanços (ou retrocessos) da sociedade em geral. No verão de 1930, as senhoritas estavam alvoroçadas com o concurso de Miss Brasil, instituído pelo jornal A NOITE, do Distrito Federal/Rio de Janeiro, e que em São Paulo era patrocinado pelo jornal A GAZETA. A eleita concorreria ao título de Miss Universo, cujo prêmio era de dez mil dólares, e teria a viagem custeada pelo jornal carioca. As concorrentes tinham que ser brasileiras, ter entre 18 e 25 anos e não podiam ser ou ter sido artistas de teatro, cinema ou outras diversões pagas. As inscrições terminavam em 30 de março. Em Santos, o jornal A TRIBUNA divulgava a competição e a lista das mais votadas da cidade. No dia 15 de janeiro, Joanna Pasquarelli de Rosato liderava as inscritas, com 168 votos – bem distante da mais votada paulistana, srta. Odette Novaes, do bairro da Liberdade, com 682 votos. O nome de uma candidata chama minha atenção: Zezinha Rezende. Seria nossa poeta Maria José Aranha de Rezende (1911 —1999), que sempre foi chamada carinhosamente de Zezinha Rezende? Por que não? Ela foi muito bonita. O concurso terminou com a vitória da gaúcha Yolanda Maria Sabage Pereira (1910-2001), que ganhou o título não reconhecido de Miss Universo, realizado no Texas naquele ano. 



E para encerrar uma crônica de um autor anônimo. Passa quase desapercebida a justificativa para os salários menores para as mulheres.