Achei uma matéria que fiz para o JORNAL DA USP em fevereiro de 1992 sobre o retorno da ex-ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello à vida acadêmica na Universidade de São Paulo, logo após deixar o governo Collor. Aqui vai a transcrição de parte da reportagem que acabou gerando muito descontentamento do Conselho Universitário por causa da publicação da charge feita pelo tesoureiro do Centro acadêmico, na época. Para achar o motivo é preciso olhar com muita atenção os detalhes.
Zélia vem
aí. E já está na mira dos alunos.
Zélia Cardoso de Mello reassume no
dia 24, como professora MS3 de Economia Brasileira Contemporânea. O Centro
Acadêmico da FEA vai recepcioná-la, vestindo os calouros com camisetas em que
aparece a charge da ex-ministra ao lado dos colegas Sayad, Delfim, Pastore e
Macedo. Por Hilda Prado.
Um pouco
antes das 9h30 da manhã do dia 24 próximo – uma segunda-feira que ninguém sabe
se será ensolarada ou não – uma professora elegante e com uma aparência austera
deve tentar entrar no prédio da Faculdade de Economia e Administração (FEA) de
forma discreta, como sempre fez. Pode ser que consiga, como todos os seus
pares; porém, muito provavelmente, terá que ultrapassar uma barreira de câmaras
de tevê, fotógrafos e jornalistas muito interessados em saber como ela vai
conciliar a volta ao magistério e sua vida familiar. Imprensa e perguntas
indiscretas não a assustam, ela tira de letra, porque fizeram parte do seu
cotidiano.
Neste
caso, toda essa curiosidade é natural, porque, afinal, queiram ou não, a
professora Zélia Maria Cardoso de Mello é notícia. Entre os alunos, nenhum frisson
especial, pois estão acostumados a encontrar pelos corredores e a conviver com
alguns dos principais monstros sagrados da economia brasileira: João Sayad,
Affonso Celso Pastore, Andrea Calabi, Roberto Macedo, Paul Singer e Delfim
Netto (que este ano dá a aula magna da FEA).
Aliás, a última aula que Zélia deu
foi exatamente a aula magna da FEA, no Anfiteatro das Convenções, três dias
antes de assumir o Ministério da Economia do governo Collor e anunciar um plano
tão heterodoxo que deixou o país literalmente aparvalhado. Agora, retorna para
dar aula de Economia Brasileira Contemporânea para os alunos do 7º semestre do
período diurno. Um detalhe interessante: a maioria dos alunos desta turma já
teve esta matéria no semestre passado, mas Zélia não corre o risco de enfrentar
uma classe quase vazia, já que muitos estudantes do 6º semestre vão antecipar
seus créditos frequentando esta aula.
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TOQUE DOS ALUNOS – Zélia Cardoso de Mello não foi a primeira mulher a ocupar um
ministério, mas certamente foi a mulher que concentrou mais poder no país em
todos os tempos. A ex-ministra, a ex-dama de ferro ou ex-Tatcher brasileira
polarizou a mídia nacional por quase 13 meses, mas tudo terminou numa sexta-feira
(5 de maio de 1991). Quando saiu do governo, Zélia disse que saía magoada, mas
estava feliz e lembrou que “a vida dá muitas voltas”. Os problemas da vida
privada acabaram se tornando públicos e a ex-ministra lançou um livro, redigido
por Fernando Sabino, que lhe rendeu mais críticas do que os 13 meses de governo
juntos.
A
professora Zélia (que não respondeu ao pedido de entrevista solicitada pelo Jornal
da USP) volta à vida acadêmica. Se fosse ministra estaria ganhando algo em
torno de Cr$ 5milhões; como docente MS3 receberá Cr$1.508.380,00 (salário de
fevereiro). Por enquanto ela não tem sala (o secretário de Planejamento,
Roberto Macedo, ainda mantém a sua) e deverá usar a dos professores. Zélia não veio
à USP para regularizar sua volta nem para escolher seu horário, o que foi feito
por sua secretária particular.
Embora
tudo transcorra rotineiramente lá pela FEA, há uma certa expectativa no ar. No balcão
do Serviço de Graduação, funcionários atrapalhados com o acúmulo de trabalho,
ouvem frequentemente a pergunta de alunos interessados em saber se “é verdade que
a Zélia está voltando”. A confirmação está no quadro, que fica no corredor. Bastava
dar uma olhadinha, mas parece que alguns não acreditam. Fazem questão de
perguntar.
Os alunos do Centro Acadêmico “Visconde de Cairu”, que não perdem a chance de fazer “artes”, criaram uma camiseta que vão distribuir entre os calouros, com uma charge em que Sayad, Delfim, Zélia, Pastore e Macedo aparecem no melhor estilo de bicho, no traço de Giorgio Caputo, tesoureiro do Centro. Como os calouros não terão aulas de Economia Brasileira Contemporânea, Zélia dificilmente se confrontará com a sua caricatura usando “maria Chiquinha” na classe.
Um comentário:
Muito bom!!!!
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