SANTOS, 470 ANOS.
Santos vista do Monte Serrat. Foto: Hilda Araújo.
O português Brás Cubas, que chegou à
Ilha de São Vicente muito jovem, trabalhou arduamente – plantou cana, construiu
curtume e engenho, mas enxergou mais longe e com os homens que confiaram nele
mudou o porto para o lado próximo do continente e acreditou que um hospital
seria importante para todos – habitantes e visitantes. Que a obra foi
importante, ninguém duvida: 470 anos depois o Porto e a Santa Casa de
Misericórdia estão em pleno funcionamento. É certo que amou Santos porque
retornou a Portugal apenas uma vez para concluir negócios e, apesar de ter
ficado muito rico, nunca mais voltou. Santos é assim: conquista as pessoas.
E para terminar, Fernando Pessoa.
ODE
MARÍTIMA
Sozinho,
no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho
pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho
e contenta-me ver,
Pequeno,
negro e claro, um paquete entrando.
Vem
muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa
no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem
entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui,
acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se
velas, avançam rebocadores,
Surgem
barcos pequenos detrás dos navios que estão no porto.
Há
uma vaga brisa.
Mas
a minh’alma está com o que vejo menos.
Com
o paquete que entra,
Porque
ele está com a
Distância,
com a Manhã,
Com
o sentido marítimo desta Hora,
Com
a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como
um começar a enjoar, mas no espírito.
Olho
de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E
dentro de mim um volante começa a girar, lentamente.
Os
paquetes que entram de manhã na barra
Trazem
aos meus olhos consigo
O
mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Trazem
memórias de cais afastados e doutros momentos
Doutro
modo da mesma humanidade noutros pontos.
Poesias de Álvaro de
Campos, in Fernando Pessoa/ Obra Poética.
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