quinta-feira, 17 de outubro de 2024

A RUA JÁ FOI MASCULINA

 

É importante a convivência de pessoas idosas com jovens porque eles muitas vezes fazem comentários que levantam questões bem interessantes. A frase abaixo de Guilherme de Almeida me fez lembrar de um estagiário que participava de um grupo de pesquisa para uma publicação empresarial. Na ocasião, conseguimos um filme de curta metragem da cidade de São Paulo em 1940 em ótimas condições. Estavamos assistindo, quando ele estranhou a reduzida presença feminina nas ruas bastante movimentadas da cidade já naquele tempo. Bem observado.

Até a II Guerra (1939-1945) a rua era território masculino. Os passeios eram em família e, eventualmente, com amigas. Poucas mulheres trabalhavam fora. Professoras, secretárias, enfermeiras, parteiras, telefonistas eram as principais profissões “femininas”. Muitas atuavam no serviço público. Minhas tias são um bom exemplo: uma casou-se cedo e dedicou-se à família; outra era professora de piano e a mais jovem, contadora e funcionária pública – ambas casaram e continuaram suas atividades. Evidentemente, havia um pequeno número de caixeiras (comerciárias), além das costureiras, chapeleiras, modistas, muitas das quais trabalhavam em casa.

Direito e Medicina atrairam as mulheres que não estavam interessadas no magistério. Maria Augusta Saraiva (1879-1961) foi a primeira mulher a se formar em Direito e a primeira a exercer a advocacia em São Paulo. Zuleika Sucupira Kenworthy formou-se em 1940 e em 1941 entrou para o Ministério Público como estagiária e mais tarde tornou-se a primeira promotora e procuradora de justiça. Esther de Figueiredo Ferraz (1915-2008) formou-se  primeiro professora pela Faculdade de Filosofia e em Direito: turma de 1944. Esther foi a primeira mulher a ocupar um Ministério – o da Educação.  As escritoras Lygia Faguntes Telles (1918-1922) e Hilda Hilst (1930-2004) formaram-se em direito em 1946 e 1948, respectivamente.

As duas primeiras médicas que conseguiram romper as barreiras de acesso ao masculino e prestigiado campo da medicina em São Paulo eram estrangeiras e formadas no exterior: a belga Maria Rennotte e a italiana Olga Caporali. Maria Rennotte formou-se pelo Woman’s Medical College of Pensylvania e, após revalidar o diploma pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, regularizou o registro profissional em 1895 e se inscreveu no Serviço Sanitário de São Paulo. “Das 33 médicas registradas entre 1892 e 1932, 24% eram estrangeiras; as 76% restantes eram brasileiras e a maioria nascida em São Paulo.”

Uma das poucas mulheres a flanar pelas ruas paulistanas foi Hildegard Rosental (1913-1990), a primeira fotojornalista do Brasil. Nasceu na Suiça, viveu até a adolescência na Alemanha e emigrou para o Brasil em 1937. 

O mundo mudou muito desde então. Melhorou? Sim, mas ainda está longe da perfeição. As ruas são de todos. O mundo profissional evoluiu desde então. As mulheres vão ocupando todos os postos de trabalho. Nem sei se falta algum para que conquistem.

Não encontrei o filme, mas selecionei algumas fotos da cidade naqueles tempos em que as ruas eram masculinas. 

             



Café da manhã. No fundo, a moça no mundo masculino, 1954. Acervo: Instituto Moreira Salles. 


Fila do bonde: Folhapress, 1966. São Paulo.



Mercearia Cruzeiro do Sul, em Santos, anos 1950.



A frase é de Guilherme de Almeida na apresentação do livro de poesias sobre São Paulo, feitas durante suas andanças pela cidade para as crônicas que escrevia para os jornais paulistanos. Como repórter, sempre gostei das ruas e sua agitação.


segunda-feira, 14 de outubro de 2024

PROFESSORES

 

Tudo começou com dona Branca Luís da Costa, minha primeira professora (Escola Portuguesa) e ao longo da vida foram muitos professores que me ajudaram a caminhar pela vida, tentando decifrar o mundo. É verdade que esqueci o nome de muitos, o que não significa que tenham tido pouca importância. De alguns lembro comentários marcantes, que até hoje me fazem refletir sobre o assunto. Quando era bem pequena, provavelmente na época em que entrei na escola, ganhei um quadro negro, uma caixa de giz e brincava de professora. As alunas eram muito comportadas – as bonecas.

As brincadeiras mudam com a idade e com as novidades, a maior delas a descoberta dos livros e do fato de que não tinha (nem tenho) vocação para o magistério; porém, em 1964 por seis meses lecionei no Ateneu Progresso Brasileiro, que funcionava num casarão situado na avenida Ana Costa, em Santos, derrubado para a abertura da rua Claudio Doneux. Ali eu tive certeza de que não queria ser professora. Dei aula para os alunos (classe masculina) do segundo ano primário. Eram uns 20 garotos indisciplinados – acho que havia uns três bem comportados. Lembro bem do melhor da turma: Guilherme Navarro. Ele era educado, disciplinado, sempre bem arrumado e cumpridor dos deveres. Muitos anos depois descobri que ele se formara em Medicina. Lembro também do Pedro, que era filho de Jesus. Ele deu trabalho, mas também era bem educado. Guardo dele, com carinho especial, um cartão que acompanhou o presente que me deu no dia dos professores. Como lembro o nome do pai? Era o cartão de visitas de Jesus e Pedro escreveu a mensagem no verso. Está guardado no meu baú.


Hoje, contudo, homenageio a Gislene, professora de educação física, que trabalha com público da terceira idade com muito entusiasmo e nos estimula a superar as dificuldades físicas. Ontem, ela ganhou uma merecida festinha e os mimos de suas turmas de segunda-feira.

domingo, 13 de outubro de 2024

PAULISTANO DESCOBRE A LIBERDADE

 

Depois de passar pelo Museu do Livro Esquecido na rua Santa Luzia, resolvi comer pastel na Liberdade. Subi a velha rua dos Estudantes e já na esquina da rua da Glória comecei a achar que não tinha sido uma boa ideia, mas me animei porque o metrô era logo adiante. Ledo engano! A cada passo via mais gente – uma surpresa quando passei pela Travessa dos Aflitos que, graças à feira, estava intransitável. E daí para frente a situação ficou mais complicada. Calçadas e ruas tomadas por uma multidão – gente comprando, gente batendo papo, gente em filas de padarias, restaurantes, mercados, lojas e sei lá mais o quê. É preciso se desviar de sacolas, mochilas e pacotes. Chegar à praça foi um sacrifício especialmente para quem não gosta de multidão como eu.

A essa altura já nem me lembrava de pastel, queria mesmo chegar ao metrô, mas não consegui alcançar a entrada e para alcançar o outro acesso tive que me esgueirar entre pratos de macarrão, bolinhos e outros quitutes que as pessoas equilibravam enquanto falavam e caminhavam em busca de mais petiscos.

Quem são essas pessoas? Pelo que consegui observar – o público é bem variado, mas os jovens predominam, alguns capricham na vestimenta estranha, mas ninguém se vira espantado. O diferente é indiferente. Quando encontro as escadarias do metrô, vejo um batalhão subindo a escadaria... Lembrei do bairro chinês de San Francisco, onde a avenida é mais ampla e tudo parece mais organizado.

Há algum tempo o paulistano descobriu o bairro da Liberdade e ele está, invariavelmente, muito movimentado. E o público, volto a dizer, é bem jovem. Sexta-feira eu já havia passado por lá e havia muita gente circulando, mas nada tão impactante como ontem, pois deu tempo até fazer uma parada na Esquina do Morango (uma barraquinha) e comprar jabuticaba.

A caminho da Praça da Liberdade. 

Ontem, as jabuticabas estavam no meio da rua dos Estudantes.


sexta-feira, 11 de outubro de 2024

BELLA CIAO

A música é do século XIX e de autor desconhecido. Provavelmente, era um canto de trabalho entoado pelas mulheres que se deslocavam da Emilia Romagna para o trabalho sazonal nos arrozais do Vale do rio Pó na Itália. No século XX, a melodia foi usada para um canto de protesto contra a I Guerra (1914-1918) e mais tarde para a música da resistência italiana na II Guerra (1939-1945) contra o fascismo. As primeiras gravações foram da cantora Giovanna Daffini (1914-1969), que foi trabalhadora temporária (mondina), e Yves Montand (1921-1991), italiano naturalizado francês.

A música é sobre um homem que um dia acorda com a chegada do invasor e despede-se da mulher ao sair para a luta, pedindo-lhe que se ele morrer o enterre na montanha à sombra de uma bela flor para que as pessoas ao passarem saibam que aquela é a flor da resistência de um homem que morreu pela liberdade. “Ciao, Bella, ciao.”



https://www.youtube.com/watch?v=4CI3lhyNKfo


Quem preferir, a versão com Yves Montand.
https://www.youtube.com/watch?v=mv3iY4v9EOc

terça-feira, 8 de outubro de 2024

LEMBRANÇAS DE VIAGEM



 

O mosquito (zanzara) da Dengue assusta italianos. Estação ferroviária Termini, Roma.

Sede em Roma do jornal "Ill messaggero.

A Via Oscura, em Viterbo (IT), já foi iluminada, mas voltou às origens.

Ah! Esses apaixonados! Viterbo.

Velhos tempos das bancas de jornal. Viterbo.

SICILIA


Travessia do estreito de Messina por trem: a composição é dividida para embarcar
no ferry-boat. A rota é Messina-San Giovanni-Roma (ou vice-versa). O estreito no Mediterrâneo separa a Sicilia (ilha) da Calábria, no Sul da Itália, e liga os mares Adriático e Jõnico. Na foto, uma passageira que não encontrava a escada de acesso à plataforma 
superior do ferry. Custou, mas descobriu a tempo de ver a bela paisagem. 




Atrás da igreja histórica, vê-se um dos navios cruzeiro atracados em Messina.


Taormina, uma igreja diferente.



As escadarias para Isola Bella - laterais ocupadas pelos produtos dos ambulantes.

Praia de pedras, cheia. Isola Bella ao fundo.


Vista da Praia de Mazzarò, Taormina.

domingo, 6 de outubro de 2024

PASSEIO POR REGGIO CALABRIA

A cidade fica no sul da Itália, a cerca de 40 minutos de barco Messina (Sicilia) e ao desembarcar terá uma bela ideia do que é a Reggio Calabria, graças ao projeto urbano implantado à beira-mar que proporciona aos moradores e visitantes ótimos momentos de descanso, lazer e cultura, sem contar a paisagem. Há ainda inúmeros bares e restaurantes do outro lado da avenida. No jardim central, destacam-se três obras de Rabarama, ou Paola Epifani, artista que nasceu em Roma e, depois de se formar na Academia de Belas Artes de Veneza em 1991, estabeleceu-se em Pádua, onde vive e trabalha. Rabarama cria esculturas de pessoas e decora a superfície com símbolos e hieróglifos.

Fundada em 664 a. C., ela é uma cidade peculiar – de um lado banhada pelo mar e do outro Messina vai galgando um morro, que se sobe por escadarias muito bem conservadas ou ladeiras pelas ruas transversais. E, por incrível que pareça, as vias principais, que seguem paralelas à praia, são planas. Minha maior surpresa foi na Via Giudecca, onde avistei escadas rolantes (tapis roulantes) cobertas para conforto dos pedestres. Que maravilha! O projeto foi financiado pela Comunidade Europeia pelo que li numa placa. A questão é que tem hora de funcionamento: das 7h45 às 13h15 e das 14h45 às 20h15.

            Aproveitei do meu modo a cidade. Fui andando e observando e assim, que depois de sair da igreja de são Jorge, achei a Libreria Culture Di Caccamo Vincenzo – Anche Museo (Via Zaleuco, 9). Um lugar muito diferente e interessante. Na verdade, é um espaço em que há os livros e também obras de arte – pinturas, esculturas e artesanatos, onde também acontecem palestras e exposições.

            A catedral metropolitana de Maria Santíssima Assunta in Cielo foi danificada durante o terremoto de 1908 e reconstruída em estilo eclético (no caso mistura do medieval e gótico), sendo consagrada em 1928. Ao castelo Aragonês cheguei exatamente na hora do almoço e a moça, educadamente, me disse que voltasse outra hora, fechando a porta. Dessa forma fui ao Museu Arqueológico Nacional de Reggio Calabria.

            Hora do almoço. Momento de descanso aos pés. 


Bem-vindo a Reggio Calabria.


As obras abaixo fazem parte do calçadão à beira-mar. 

Monumento aos cadetes da aeronáutica mortos em batalha em 1943, (Esq.)
Obra da artista Katrin Puyia (1976). (Dir.)

Nos jardins, destacam-se três obras de Rabarama, ou Paola Epifani, artista que nasceu em Roma e, depois de se formar na Academia de Belas Artes de Veneza em 1991, estabeleceu-se em Pádua, onde vive e trabalha. Rabarama cria esculturas de pessoas e decora a superfície com símbolos e hieróglifos.






As escadas rolantes.






Aspectos da livraria/galeria.




quinta-feira, 3 de outubro de 2024

MENINOS, EU VI!

Estava esperando o VLT em Messina, na Sicilia (Itália).. Sol de fim de tarde ainda ardente. Os dois pontos têm abrigos com bancos. Sentei no que estava vazio porque no outro havia um rapaz deitado, sem os tênis que estavam arrumados em frente ao banco. Logo ele abandonou a inércia e começou a fazer alongamento como se estivesse no quintal de casa. Como o VLT demorou, deu tempo para ele fazer toda a sequência recomendada pelos fisioterapeutas. Então levantou, calçou os tênis e foi embora todo feliz.







Quando for à Catânia, Sicilia, e quiser comer carne, ao examinar cardápio certifique-se de que o seu pedido não é carne equina. É isso mesmo: um dos pratos preferidos da população desta cidade siciliana é de carne de cavalo. Os campeões são os chineses e mexicanos, seguidos de Cazaquistão, Mongólia, Argentina, Itália, BRASIL e Quirguistão. Surpreso com nossa participação na lista? Saiba que o Brasil é um dos maiores produtores e o maior exportador de carne equina do mundo e com ela fazem-se almondegas, mortadela, salame, salsinha, carne defumada e sashimi. Bom apetite!


ARANCINI

É um bolinho de risoto, versão italiana do bolinho de arroz. Delicioso. E os conterrâneos já deram opinião, devidamente registrada em Messina.