NO CABARÉ
VERDE
(às cinco da
tarde)
Oito dias de
estrada, as botas esfoladas
De tanto caminhar. Em Charleroi, desvio:
– Entro no Cabaré Verde: peço torradas
Na manteiga e presunto; que não seja frio.
Despreocupado estiro as pernas sobre a mesa
Verde e me esqueço a olhar os temas primitivos
Sobre a tapeçaria. – Adorável surpresa,
A garota de enormes tetas, olhos vivos,
– Essa, não há de ser um beijo que a afugente! -
Rindo, vem me trazer meu pedido numa
Bandeja multicor: pão com presunto quente,
Presunto rosa e branco aromado de um dente
De alho, e o chope bem gelado, boa espuma,
Que uma réstea de sol doura tardiamente.
Arthur Rimbaud
Outubro de 1870.
O poeta francês Arthur Rimbaud (1854-1891)
foi um enfant terrible. Viveu pouco, mas intensamente. E caminhou muito
pela vida afora. Fugiu de casa aos 15 anos com destino a Paris, depois de
vender os livros que ganhara como prêmio na escola para pagar o trem, mas como
a quantia não cobriu o itinerário todo foi preso ao desembarcar na estação de
Estrasburgo. Resgatado por um professor, passa uns tempos com a família do
protetor até que a mãe o chame. Rimbaud não fica muito tempo em casa. Foge
novamente – desta vez faz uma parte do percurso de trem e inicia suas caminhadas;
vai para em Bruxelas e, no retorno para casa, traz poesia como bagagem. Entre
idas e vindas, ele retorna a Paris em 1871, quando encontra o poeta Paul-Marie Verlaine
(1844-1896) com quem mantém por três anos uma relação amorosa tempestuosa.
Não li uma biografia de Rimbaud, mas deve ser bem interessante conhecer melhor esse jovem inquieto para o qual a falta de dinheiro não é um empecilho para viajar. Afinal sempre pode ir a pé. "Sou um pedestre, nada mais." Em 1875, por exemplo, na Suíça, sobe a pé o Monte São Gontardo para chegar a Milão, na Itália. Foram anos de andanças até que em 20 de fevereiro de 1891, na Etiópia, ele reconhece: “Vou mal agora”. Um dos joelhos estava muito inchado e com o passar do tempo piora consideravelmente até que em abril parte para Marselha numa viagem de dor e agonia. Ao ser internado no hospital, teve a perna amputada na altura do joelho. Ele não desiste. Encomenda uma perna de pau de dois quilos com a esperança de voltar a caminhar em breve. Volta para a família, a irmã cuida dele com dedicação.
Rimbaud não
desiste apesar de todo sofrimento e parte com a ajuda da irmã com destino a
Argel, mas em Marselha é internado em estado crítico. Em setembro ele ainda
aguarda a perna artificial. Em 20 outubro completa 37 anos e no dia 10 de
novembro morre, após um longo sofrimento. “Vejo em Rimbaud o sentido de
caminhar como sendo fugir. (...) Sabe-se sempre porque se está caminhando. Para
avançar, partir, atingir, tornar a partir.” Afirmação do filósofo Fredéric Gros.
Como poeta influenciou o
modernismo.
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