O paulista José Datrino (1917-1996) ficaria feliz se visse o mural feito
pelos alunos da Escola Estadual MAJOR ARCY* (Aclimação). Datrino ficou
conhecido como profeta, pregava nas ruas em meados do século passado e seu lema
era: Gentileza gera gentileza. Sua história remonta ao incêndio do Gran Circo. Nessa época, ele era um pequeno
comerciante no Rio de Janeiro; casado, tinha cinco filhos e levava vida modesta,
que se transformou completamente naquele dia por causa de uma tragédia em
Niterói. Verão, férias e a estreia de um circo que anunciava muitas atrações sob
a nova lona. Os ingressos esgotaram. Artistas e animais estavam empenhados no
espetáculo, quando um trapezista viu o fogo e deu o alarme. O incêndio
provocado por um ex-funcionário inconformado com a dispensa causou cerca de quinhentos
mortos.
O
fato abalou Datrino profundamente. Dias depois ele começou a “ouvir
vozes” e foi para Niterói; instalou-se entre as ruínas do circo, consolou os
que perderam familiares e transformou o lugar em um jardim, que denominou “Paraíso
Gentileza”. Viveu por lá cerca de quatro anos e depois morou em casas de
conhecidos, sempre em condições precárias. Tornou-se uma figura popular (usava
longas barbas e túnica branca) e ficou conhecido como Profeta Gentileza.
Para o professor Leonardo Guelman, da Universidade Federal Fluminense,
ele “era uma espécie de cavaleiro andante contemporâneo. Suas aparições
inusitadas se davam em momentos de grande movimentação. Ficar indiferente à sua
chegada, de estandarte na mão, cheio de apliques e penduricalhos, era impossível.
O fato é que Gentileza era um profeta, e assim se dirigia às pessoas”. Guelman
é o autor do livro “Univvverrsso Gentileza”, editora Mundo das Ideias, 2008.
O fato é que sua máxima – gentileza gera gentileza – o consagrou. Entre
os anos 1970 e 1980 viajou de carona por todo o Brasil divulgando suas ideias.
Ao retornar ao Rio de Janeiro escreveu seu ideário nas pilastras do Viaduto do Gasômetro
(RJ), cobrindo uma extensão de 1km5. Em 2000 os murais foram tombados, mas não escaparam
ao vandalismo em 2016.
Gentileza morreu em Mirandópolis (SP), cidade próxima de Cafelândia, onde
ele nasceu, mas continua bastante lembrado: por Gonzaguinha em 1980; pela
família e admiradores que organizaram em 2000 uma ONG para divulgar sua obra e pela
Escola de Samba Acadêmicos do Grande Rio em 200 entre outras ações.
Eu não o chamaria de profeta, mas sem dúvida foi um personagem que a despeito das dificuldades conseguiu chamar atenção para questões básicas.
*R. Dr. José de Queirós Aranha, 451.
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