Gastei mais tempo no trajeto ferroviário de ida e volta do Rio de Janeiro a Santa Cruz do que propriamente no distrito. Meu destino era a Base Aérea e fui informada que era longe da estação. O conselho da simpática jovem a quem pedi informações foi chamar Uber, explico que não uso o aplicativo; ela pergunta se estou disposta a ir de mototáxi. Dou risada. Vou de táxi. Ela me indica a direção do ponto próximo.
Gostei do bairro à primeira vista. No entorno da estação há um mar de barraquinhas que ocupam as calçadas em frente às lojas comerciais. Tudo muito colorido, agitado e barulhento. Consulto o taxista, ele explica que é meio complicado entrar na Base, que o hangar é longe da entrada, enfim, nas entrelinhas, fica a ideia de que a idosa não suportaria a distância. O que ele não sabe é que, felizmente, distâncias não me assustam. Aproveita para mostrar alguns lugares históricos da cidade ‒ sim, mais que um bairro Santa Cruz parece uma pequena cidade do extremo oeste carioca.
Tudo começou com a Fazenda de Santa Cruz doada aos jesuítas que a desenvolveram e a propriedade chegou abranger a área entre Mangaratiba e Vassouras. O latifúndio era identificado por uma imensa cruz de madeira. Tudo terminou quando o Marquês de Pombal expulsou os jesuítas de Portugal em 1759 e as propriedades da Companhia de Jesus foram transferidas para a Coroa e, no Brasil, subordinaram-se aos vice-reis. A chegada da família real em 1808 mudou o panorama local, quando a fazenda tornou-se lugar de veraneio, tendo o convento sido transformado em paço real ou Palácio Real de Santa Cruz e, com a independência, Palácio Imperial de Santa Cruz.
A presença dos príncipes impulsionou o desenvolvimento de Santa Cruz. Assim, quando a ferrovia chegou em 1878, o lugar era havia muitos anos o local preferido da família real para longas estadias. Foi lá também que se instalou a primeira agência postal do Brasil em 22 de novembro de 1842.
O Palácio Imperial hoje abriga a sede do Batalhão-Escola de Engenharia ‒ Batalhão Vilagran Cabrita. O Palacete Princesa Isabel, muito bem conservado, foi inaugurado pelo imperador D. Pedro II em 1881 para ser a sede administrativa do matadouro público e a meta da prefeitura é transformá-lo em Centro Cultural Princesa Isabel. A bela fonte Wallace, um dos cem exemplares doados pelo filantropo inglês Sir Richard Wallace a várias cidades do mundo no século XIX, também faz parte da história imperial em Santa Cruz.
O hangar do Zeppelin, que me atraiu, foi inaugurado em dezembro de 1936 e é tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Para os mais jovens o Zeppelin é a denominação do aeróstato (grosso modo, um balão inflado por 200 mil m³ de hidrogênio) dirigível criado pelos alemães nos anos de 1930 para viagens transatlânticas. O primeiro a pousar no Brasil foi em 21 de maio de 1930 em Recife e no dia 25 pousou no Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Houve mais três viagens até que fosse inaugurado o hangar em Santa Cruz. Ao todo foram nove viagens entre Brasil e Alemanha, mas a tragédia de Nova York em 1937 ‒ o incêndio do Hindenburg que causou a morte de 35 pessoas ‒ e o panorama político internacional provocaram o fim da era de transporte por balões.
O hangar brasileiro é um dos raros do mundo que estão preservados, mas infelizmente não foi ainda desta vez que consegui visitar o hangar. Mais um motivo para voltar ao Rio de Janeiro.
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