Hoje é dia de Saci, Saci-Pererê, e ele me pregou várias peças, mas fez meu dia especial.
terça-feira, 31 de outubro de 2023
domingo, 29 de outubro de 2023
O TERREIRO DO PAÇO
Um dos lugares que aprecio em Lisboa é o antigo Terreiro do Paço, agora Praça do Comércio. A primeira vez que fui à cidade sem querer fiz o caminho certo: ao chegar à rua Augusta vislumbrei ao longe um belo arco que enquadrava uma estátua equestre. Lá fui eu desvendar esse mistério e desemboquei numa das maiores praças que vi na vida. Majestosa, mas infelizmente, estava em obras (preparativos para a visita de um papa) e não pude admirá-la pelos melhores ângulos. Foi para este local, que o rei D. Manuel I (nosso velho conhecido das aulas sobre o “descobrimento” do Brasil) mudou não só com o guarda-roupa e a família em 1511, mas com as obras de arte e biblioteca. A família real portuguesa manteve-se no Terreiro do Paço até 1755, quando o grande terremoto praticamente destruiu a cidade, inclusive o palácio real e suas preciosidades – obras de Rubens, Correggio e Ticiano, além de 70 mil livros da biblioteca
De repente, me lembro do modesto Paço
Imperial (Largo do Paço/Praça XV) no Rio de Janeiro com vista para o mar.... O
prédio brasileiro é de 1743 e serviu de residência de governadores-gerais, vice-reis
e família real. E no Rio também há uma estátua equestre, rei português que abrigamos
em tempos atribulados: D. João VI. Enfim, uma associação de ideias e imagens,
talvez devido ao sol escaldante do outono luso.
Voltando a Lisboa... E lá se foi a família real morar na
Real Barraca ou Paço de Madeira, na Ajuda – o rei da vez exigiu que a nova
moradia fosse de madeira porque não queria morar em algo de alvenaria. Só para
complementar: três décadas depois foi destruída num incêndio.
O prédio monumental
com 79 arcos e passeio coberto atualmente abriga repartições públicas, lojas e
até hotel. Mais tarde acho que deverá acontecer algum evento porque trabalhadores montam
barracas pela praça. Há turistas para todos os lados e de todas as procedências.
Grupos ouvem os guias contar a história do lugar; quase todos fotografam, se
fotografam, falam pelos cotovelos; e alguns parecem ter pressa, já chegam com a
mala.
O rio me atrai. Há à margem do rio uma calçada convidativa para uma andança. Uma boa ideia foi a colocação de cadeiras num deck – no momento todas vazias. Ainda é cedo e decido que meu destino é o Cais do Sodré.
sábado, 28 de outubro de 2023
A DISCRETA TABACARIA
A cadeira ao lado da escultura de Fernando Pessoa, no Chiado,
raramente está vazia. Todas as pessoas que posam ao lado do poeta têm como cenário
ou pano de fundo a Casa Havaneza, a mais antiga tabacaria portuguesa cuja
fundação é atribuída a dois belgas, François Caen e Charles Vanderin, por volta
de 1864 – época em que a Rua Garret ainda se chamava rua das Portas de Santa
Catarina. A casa tornou-se conhecida pela qualidade de seus produtos e atraía
intelectuais, políticos e aristocratas; continua um ponto de referência para os
amantes de bons charutos e têm dinheiro para queimar. Foi esse
detalhe na foto que me lembrou a “Tabacaria”, o belíssimo poema de Álvaro de
Campos, heterônimo de Fernando Pessoa. A escultura é do português Lagoa
Henriques (1923-2009).
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a
verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e
achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
(...).
quarta-feira, 25 de outubro de 2023
ALMADA NEGREIROS
“Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos que terei de vida. Não chegam, não duro nem para metade da livraria.”
José Sobral de Almada Negreiros (1893-1970), artista plástico e escritor
modernista português, está bem vivo na estação Saldanha do metrô de Lisboa,
graças à bonita intervenção criada pelo filho dele, arquiteto José Almada
Negreiros. Impossível não parar para ler as frases e ser conquistada pelo
autor, nascido em São Tomé e Príncipe, um país formado por duas ilhas e que, atualmente,
tem cerca de 204 mil habitantes.
Os olhos da nossa memória veem melhor do que os nossos.
•Belo não é o «gosto pessoal», é todos os gostos
pessoais.
•Arte não é uma opinião, é um conhecimento.
•Pintar é falar consigo-mesmo para que alguém nos
entenda.
•O idioma é a maior fortuna de um povo.
•O idioma é a instrução dum povo. A Arte a sua
educação.
•Os olhos são para ver e o que os olhos veem só o desenho o
sabe.
•O desenho é o nosso entendimento a fixar o
instante.
•A geometria é a medição da natureza com o
entendimento humano.
•O cânone não é obra do homem, é a captação que o
homem pode da imanência.
•A perfeição contém e corrige a exactidão.
•Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já
estavam todas escritas, só faltava uma coisa – salvar a humanidade.
•Há sistemas para todas as coisas que nos ajudam a
saber amar, só não há sistemas para saber amar!
terça-feira, 24 de outubro de 2023
FÉRIAS: COISAS ESTRANHAS.
A viagem
começou num sábado à tarde em Viracopos. Um choque. Lembrei-me dos tempos de
isolamento social da pandemia. O aeroporto estava absolutamente vazio. Creio
que, se espirrasse, ouviria o eco. Simplesmente vazio. Na área de vistoria de
bagagem – somente eu e os funcionários. Passei pelo controle de passaporte: no
imenso salão um funcionário solitário aguardava que eu, sozinha, fosse até o
guichê. Entrei na área de embarque e ali estava o Duty Free em situação até
pior porque não vi passageiros e muito menos funcionários. Lembrei-me de filmes
de terror: onde estavam as pessoas? Mais adiante ouvi passos e era um
passageiro se aproximando. Comentei com ele que nunca havia imaginado uma
situação como aquela. Ele riu e gostou da comparação com filme de terror. No espaço
dos portões de embarque, um senhor cochilava ao lado da mala. No final da tarde,
começaram a chegar passageiros e o cenário a se animar.
Escolhi
uma cadeira que dava uma visão global do amplo espaço dividido em portões de
embarque. Observo o interminável desfile de malas, malinhas e maletas – todas
com rodas, e até mochilas. O carrinho de mão não se vê mais, apenas os carros
enormes dos terminais de passageiros. A mala combina com o dono? Talvez sim,
talvez não. Pessoas elegantes (não precisa ser rico para ser elegante) apreciam
uma bagagem discreta. Foi-se o tempo das opções serem preto ou marrom.
Atualmente todas as cores do espectro visível – amarelo, azul, ciano, laranja,
verde e vermelho – estão disponíveis, sem contar o branco, bege, cor de rosa etc. Há as
estampadas também.
Quando
fiz minha primeira viagem para a Europa em 1993, minha mala não tinha rodinhas
– na verdade era uma mala pequena que eu podia transportar com facilidade;
entretanto, na viagem noturna de trem entre Paris e Roma, minha companheira de
cabine era uma senhora francesa que me aconselhou várias vezes a adquirir um
carrinho de mão dobrável porque “le pods de la valise est nocif pour le dos”.
Relutei, mas não esqueci o conselho e acabei comprando o carrinho em Atenas e
tenho até hoje guardado no maleiro.
Nessa
época a figura do carregador de malas era popular tanto em aeroportos como em
ferrovias e rodoviárias. Eis uma profissão que acabou em meados dos anos 1970, quando
o sr. Bernard Sadow, dono de uma loja de malas e casacos em Massachusetts (EUA), ao
passar pela esteira rolante, teve a ideia de colocar rodinhas em sua bagagem e
puxá-la com uma alça. A novidade custou a ser incorporada. A segunda
modificação introduzida nas malas aconteceu em 1987, quando o piloto Robert
Plath, da Northewest Airlines, adicionou à mala de rodas uma longa haste que
permitia que os viajantes puxassem a bagagem na vertical com facilidade. Se os
viajantes adoraram a ideia, Plath ainda mais: abandonou a aviação e fundou em
1987 a Travelpro International, uma das maiores fabricantes de malas do
mundo.
segunda-feira, 23 de outubro de 2023
FERNANDO, SEMPRE FERNANDO...
Fernando Pessoa (1888-1935).
É o melhor poeta português, mas isso é dizer pouco porque Fernando Pessoa ultrapassa fronteiras e continua contemporâneo. Sua obra foi traduzida para mais de 40 idiomas.
Pessoa prestou serviços a diversos escritórios. No período de 1923 a 1935, cuidou da correspondência comercial do Moitinho de Almeida, de importações e exportações, situado na rua da Prata, na Baixa. Fernando Pessoa usava esta máquina de escrever Royal 10, modelo 1919, tanto para o serviço da empresa como para suas atividades literárias, tendo as chaves e a autorização de Moitinho de Almeida para ir até lá a qualquer hora.