quarta-feira, 30 de abril de 2025

TRABALHO CAPRICHOSO

Ele cuida da limpeza do vidro e para que as pessoas possam admirar o cenário e fazer fotos. Fica de plantão observando o movimento e, faz-se então uma pausa, para ele limpar as digitais deixadas pelos visitantes mais entusiasmados com essa visão de uma parte do Centro Histórico de São Paulo...   À esquerda do Vale do Anhangabaú, vê-se o Edifício Martinelli e o Edifício Matarazzo, sede da prefeitura, com seu jardim suspenso. No centro, o edifício o prédio CBI Esplanada, que deixa apenas uma nesga do Teatro Municipal à vista. À direita o centenário prédio dos Correios. Sampa Sky, 24 de julho de 2023. Foto: Hilda Araújo.







segunda-feira, 28 de abril de 2025

O CALCETEIRO

 

Há alguns anos eu atravessava a Praça Ramos de Azevedo quando o vi trabalhando na calçada. Um calceteiro! Lembrei-me dos tempos de Santos, onde vi pela primeira vez o trabalho minucioso desses homens que revestem calçadas com pedras portuguesas – pedrinha por pedrinha, formando desenhos que admiramos sem lembrar quem os executou. Uma profissão em extinção pelo que observo atualmente no Centro Histórico de São Paulo, onde placas de concreto cinzentas cobrem os calçadões reformados – seguras para os pés apressados do paulistano, porém, monótonas para os olhos que passeiam pela paisagem.

As calçadas portuguesas estão desaparecendo silenciosamente. O chão calcetado é usado desde a Antiguidade, mas a calçada portuguesa data do século XIX e é uma arte genuinamente lusitana e que faz parte do patrimônio cultural de Portugal. A Praça do Rossio foi a segunda área de Lisboa ganhar uma calçada portuguesa, iniciativa que se espalhou pela cidade, pelo país e pelas colônias.

A Câmara de Lisboa criou em 1986 a Escola de Jardinagem e Calceteiros para renovar o efetivo de profissionais municipais e preservar e divulgar o calcetamento. Na escola, homens e mulheres aprendem a “arte de calcetar ao quadrado, o desdobrar da pedra e o malhetar”, expressões comuns entre os mestres calceteiros. As pedras usadas são geralmente de calcário branco e preto ou basalto; encontram-se também o vermelho e o verde. As cores tradicionais são o preto e o branco.

            Anotei o nome do calceteiro que trabalhava na Praça Ramos, mas infelizmente o papelzinho perdeu-se.

A Escola de Calceteiros funciona na Avenida Dr. Francisco Luís Gomes 1800, no Arroios, Lisboa. 

O calceteiro na Praça Ramos de Azevedo.

Lisboa, Praça do Rossio e a calçada portuguesa, 2023.

Praça João Mendes: calçada portuguesa com as cores paulistas, 2025.

As ondas de Copacabana (RJ), 2015.


A calçada portuguesa da Praia do José Menino, Santos (SP), 2019.




domingo, 27 de abril de 2025

O JARDINEIRO

Os jardineiros em São Paulo têm um trabalho inglório: nas praças e nos parques lineares, plantam flores e plantas ornamentais com muito cuidado. Deixam a cidade bonita, com muito colorido; porém, infelizmente, uma parte da população ignora esse trabalho e insiste em fazer dos jardins da cidade sua lata de lixo. Mas, como dizem os poetas

"SEGUE o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

(...)."

Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa).

Praça Marechal Deodoro, na Barra Funda: a escultura de Murilo Vaz Toledo faz parte de um conjunto em homenagem aos trabalhadores terceirizados de São Paulo.



"Quelquefois dans un beau jardin
Où je traînais mon atonie,
J'ai senti, comme une ironie,
Le soleil déchirer mon sein,

Et le printemps et la verdure
Ont tant humilié mon coeur,
Que j'ai puni sur une fleur
L'insolence de la Nature."

À CELLE QUI EST TROP GAIE  Baudelaire.

O GARI

Quase ninguém sabe quem ele é, entretanto, milhões de pessoas falam seu nome diariamente pelo Brasil. Era francês; na década de 1870, ainda bem jovem veio para o Brasil, estabelecendo-se no Rio de Janeiro onde criou uma empresa de limpeza – aliás, como bom observador, percebera que limpeza não era exatamente uma qualidade da cidade. Quando o lixo se tornou um sério problema de saúde pública, o Ministério do Império instituiu a limpeza sistemática das ruas Rio e no dia 10 de outubro de 1876 foram contratados os serviços de Aleixo Gary para cuidar da limpeza pública do Rio de Janeiro e transportar todo o lixo para a ilha de Sapucaia, na baía da Guanabara. Os trabalhadores da limpeza eram populares na cidade e os cariocas referiam-se a eles como os “os meninos de Gary” e com o tempo eles passaram a ser chamados apenas de “Garys”. O nome se popularizou. Essa é a origem da palavra gari – um ótimo exemplo de metonímia para as aulas de Português da garotada. 

O contrato de Aleixo Gary durou até 1891 – já no período republicano, mas o pessoal da limpeza pública continua firme e forte até hoje levando, sem saber, o nome dele pelas cidades brasileiras num trabalho sem fim, já que as pessoas continuam ignorando as boas maneiras e jogando o lixo onde não deve. No Dia do Trabalho, uma homenagem a esses trabalhadores anônimos que participam de nossas vidas e que a maioria da população nem um bom dia lhes deseja. A escultura faz parte de um conjunto em homenagem aos trabalhadores terceirizados de São Paulo, na Praça Marechal Deodoro, obra de Murilo de Sá Toledo.

        Em tempo: as ilhas de Sapucaia, dos Pinheiros, de Bom Jesus e do Fundão foram aterradas na década de 1940 para a construção da Cidade Universitária.

Foto: Otávio Ástor Vaz Costa. 



sábado, 26 de abril de 2025

RUAS DE DICKENS

 

Oxford Street, Londres, 2015.


“Poucos de nós compreendemos a rua. Até quando pisamos nela, pisamos desconfiados, como se entrando numa casa ou numa sala em que há estranhos. Poucos de nós vemos através do luminoso enigma da rua, as estranhas pessoas só pertencem à rua – caminhante da rua ou o árabe da rua, os nômades que sob a luz do sol, geração após geração, guardaram seu antigo segredo. Sobre a rua noturna muitos de nós sabemos ainda menos. A rua noturna é uma grande casa trancada. Mas se alguém jamais teve a chave da rua, essa pessoa é Dickens. Suas estrelas eram as luzes da rua, seu herói era o homem da rua. Ele podia abrir a porta mais interna da sua casa – a porta que leva ao corredor secreto ladeado de casas e tem um teto de estrelas.” G. K. Chesterton (1874-1936).

Charles Dickens é um dos meus escritores favoritos. Na adolescência deliciei-me com os livros dele. Li uma biografia resumida em algum dos cursos de inglês que frequentei e só agora soube que ele era um caminhante prodigioso, de acordo com Merlin Coverly, escritor e livreiro britânico, adepto da psicogeografia. Esta é outra novidade para mim – a Psicogeografia definida como "o estudo das leis precisas e dos efeitos específicos do ambiente geográfico, conscientemente organizados ou não, sobre as emoções e o comportamento dos indivíduos". (Leis precisas num tema como esse me parece algo exagerado.)

Coverly, citando outros autores, conta que Dickens em uma carta escreveu que se não pudesse caminhar rápido e até a um lugar distante, explodiria e morreria”. Em seus romances há muitas cenas de caminhadas por Londres, protagonizadas pelos habitantes sofridos da cidade, uma tentativa de “explicar a metade que caminha para a metade que anda sobre rodas”. O escritor britânico diz que apenas em “A loja de antiguidades” (1841) um personagem faz uma longa caminhada fora de Londres.

Há pesquisas bem estranhas, como a do escritor britânico Miles Jebb (1930), que compilou as andanças dos personagens de Dickens: Oliver Twist andou 20 milhas para roubar uma casa Chertsey; David Copperfield andou 23 milhas de Blackheath até Chatham e de outra vez andou 25 milhas do Pickwick Club (que financiava viagens pelo interior da Inglaterra); a fuga de Nickleby e Smike de Dotheboys Hall em Yorkshire para Londres; e a caminhada de Chuzzlewit e Pinch para jantar em Salisbury. Se alguém quiser conferir...

Londres, 2015.


terça-feira, 22 de abril de 2025

ERRO DE PORTUGUÊS

Oceano Atlântico, 22 de abril de 1500. O grumete balançando na gávea da caravela gritou “Terra à vista”. Foi aí que tudo começou – Pindorama, Santa Cruz e Brasil... 

"Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português."

"Erro de Português" -Oswald de Andrade.


A Caravela Portuguesa

LEGENDA DO PAINEL

"Na década de 1440, surgem as primeiras referências a “caravelas de descobrir” a qual passa a ser o principal tipo de navio utilizado pelos exploradores portugueses nas seguintes décadas do século XV.

Navio robusto, apresentando excelentes qualidades náuticas, o seu tamanho acompanhou as viagens que se tornaram cada vez mais longas, passando de dois para três mastros de pano latino (velas triangulares), que lhe permitiam navegar mesmo com ventos contrários (bolinar).

Mais tarde, a partir de 1500, surge um novo tipo de navio, a “caravela redonda” ou “de armada”. Trata-se de um tipo distinto de navio, destinado ao apoio das grandes naus de viagem ou à guerra do mar. Com aparelho misto de pano latino e redondo (vela quadrangular) no traquete (mastro de vante), o que lhe confere maior velocidade e manobrabilidade, características necessárias àquelas funções."  Museu da Marinha, Lisboa, 2023.


Bolina – navegação com vento lateral. (Dic. Michaelis)



 

segunda-feira, 21 de abril de 2025

FELIZ PÁSCOA

 TODO ANO É A MESMA COISA: AS GALINHAS PÕEM OVOS E OS 

COELHOS LEVAM A FAMA.









PUBLICADO ORIGINALMENTE ONTEM, DOMINGO DE PÁSCOA, MAS DELETADO POR ENGANO.

SUMMERTIME

Há quem sempre tenha uma desculpa para ficar em casa e uma delas é a falta de tempo. O poeta norte-americano Frank O’Hara (1926-1966) é um bom exemplo de que sempre se pode caminhar e aproveitar a cidade em que se vive. Ele trabalhava no Museu de Arte Moderna de Nova York e aproveitava a hora do almoço para caminhar pela cidade, o que resultou no livro Lunch Poems. Claro, não estou sugerindo que todos os pedestres tenham de escrever sobre suas experiências pelas ruas e parques de suas cidades. O importante é aproveitar os poucos momentos disponíveis para apreciar a cidade em que se vive – não importa se é Nova York, Tóquio ou São Paulo. Uma delícia observar as ruas e as pessoas para descobrir que o cenário muda sempre. Há sempre novidades numa rua, os rostos na multidão nunca são os mesmos. Mesmo aqueles que encontramos no cotidiano variam suas expressões – um dia têm o rosto alegre, no outro parecem tristes ou ainda distraídos...

    Frank O’Hara mudou para Nova York em 1951 e explorou a cidade de tal modo que um leitor poderia usar seus poemas e crônicas como roteiro, mas também contou suas experiências pessoais como em The Day Lady Died (uma elegia à cantora Billy Holiday). Aqui O’Hara conta suas atividades naquela sexta-feira, 17 de julho de 1959, quando saiu para almoçar às 12h20, depois foi engraxar os sapatos porque descerá do trem das 16h19 em East Hampton, Nova York, às 19h15, de onde irá direto para um jantar e quer causar boa impressão. É um dia muito quente de verão. Ele almoça um burger com milkshake, vai ao banco, compra um jornal literário, passa por uma livraria – onde fica em dúvida sobre o que escolher e finalmente dirige-se a uma loja de bebidas para comprar um Strega para o amigo Mike. Nesse ponto, O’Hara volta para a 6ª Avenida compra cigarros na loja do Teatro Ziegfeld e um tabloide com a foto de Billie Holiday na capa com a notícia do falecimento dela. Lembra-se então de quando a ouviu cantar acompanhada ao piano por Mal Waldron e conclui: Her performance took everyone's breath away”.


https://www.youtube.com/watch?v=THflqYOqm3A


domingo, 13 de abril de 2025

KIERKEGAARD, CAMINHANTE ATÉ O FIM

 

O filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard (1813-1855) foi o precursor do flâneur francês: gostava de caminhar a esmo pelas ruas de Copenhague, onde nasceu e viveu seus 42 anos. Por causa de uma queda na infância, Kierkegaard tinha uma forte curvatura na coluna e por isso caminhava um tanto inclinado para trás, o que dava a impressão de insegurança ao seu deslocamento. Caminhar era uma fonte de diversão e prazer para ele, apesar de todos os problemas de saúde que enfrentou. E como se isso não bastasse, após uma disputa pública com uma revista satírica, tornou-se vítima de uma campanha impiedosa de zombarias nas ruas de Copenhague. Kierkegaard passou de observador a observado, como registrou Coverley. “Por causa da minha melancolia e do meu enorme trabalho, eu precisava de uma situação de solidão na multidão para descansar. Por isso me desespero. Já não posso encontrá-la. A curiosidade me cerca por todos os lados.”

O filósofo não desistiu: “Acima de tudo não perca o desejo de andar: todo dia eu caminho num estado de bem-estar, e andando me afasto de todas as doenças. Tenho tido meus melhores pensamentos enquanto ando, e não sei de nenhum pensamento tão opressivo que a pessoa não possa afastar enquanto caminha. Mesmo que alguém precisasse caminhar por razões de saúde e que ela estivesse constantemente um pouco adiante – ainda assim eu diria ‘Ande!’”.

Durante uma de suas caminhadas desmaiou e morreu.

(Embora não tenha cunhado o termo que só surgiu em meados dos anos 1940, ele foi o primeiro filósofo a abordar o existencialismo.)

 

Retrato inacabado de Kierkegaard feito por seu irmão Neils Christian Kierkegaard – Royal Library of Denmark.

sábado, 12 de abril de 2025

PARQUE DAS BICICLETAS

Eu não conhecia o Parque das Bicicletas, situado em Moema. O Parque, inaugurado em agosto de 2000, tem 44 mil metros quadrados; porém, não acolhe apenas ciclistas. O paulistano encontra nessa área atividades de lazer, esportes e pesquisa como o Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa – COTP e o Centro Esportivo Mané Garrincha, que frequento há dois anos. Há infraestrutura para os adeptos de patins, skate e patinete; uma academia ao ar livre, aulas de yoga, fitdance (aula coletiva que mistura dança com o universo fitness) e hit funcional (aula que combina exercícios funcionais e de alta intensidade).  E quem não se interessa por nada disse sempre pode caminhar pelas alamedas arborizadas ou simplesmente se acomodar em um dos bancos para apreciar a paisagem.

PARQUE DAS BICICLETAS: Alameda Iraé, 35, funciona das 6 às 22 horas, diariamente. 

Passeio matinal longe do burburinho do entorno da área verde.


Pista de atletismo e arquibancada.

No caminho um cacaueiro carregado de frutos.


quarta-feira, 9 de abril de 2025

POETAS CAMINHANTES

 

“Eu adoro uma estrada pública: poucas coisas

Me agradam mais ver; ela teve poder

Sobre a minha imaginação desde a aurora

Da infância, quando a sua linha que sumia,

Vista diariamente muito ao longe, numa escarpa desguarnecida

Além dos limites pisados pelos meus pés,

 Era como um guia para a eternidade,

Pelo menos para coisas desconhecidas e sem limite.”

William Wordsworth

 

Nem tudo é como desejamos. Diminui drasticamente minhas caminhadas ou passeios pela cidade. O campo não me atrai. Sou um bicho essencialmente urbano. Para compensar essa momentânea pausa que, espero, dure pouco, dedico-me a ler o relato das experiências de caminhantes famosos. Um dos pioneiros foi Jean-Jacques Rousseau, na França, mas teriam sido os românticos que se lançaram às caminhadas, moda considerada extravagante pelos contemporâneos, pois até o século XVIII as pessoas costumavam caminhar apenas por necessidade econômica e não como recreação. Esses primeiros caminhantes eram uma espécie de caçadores de paisagens – suas andanças eram feitas em direção ao campo e destinadas à apreciação da natureza.

O reverendo William Gilpin (1724-1804) foi um pintor inglês amador, que apreciava paisagens selvagens e acidentadas; ele desenvolveu pela primeira vez a ideia do pitoresco. Na mesma época, surgiram as excursões a pé, atividade em que o poeta inglês William Wordsworth e a irmã Dorothy logo se destacaram. William Wordsworth (1770-1850) tinha 20 anos quando fez sua primeira excursão a pé, considerada por todos como “louca e impraticável”: atravessar a Europa continental – passando pela França, Itália, Alemanha e Suíça. Ele foi na companhia de um amigo e colega de estudos; percorreram 550 quilômetros na primeira quinzena, fazendo em média 50 quilômetros diários!!! Em um poema ele diz que “foi uma marcha de velocidade militar”. O poeta nunca mais deixou de caminhar e viveu de suas caminhadas.
O escritor inglês Thomas De Quincey (1785-1859) escreveu que “Wordsworth não era, no geral, um homem bem acabado. Suas pernas eram enfaticamente condenadas por todas as conhecedoras de pernas que ouvi palestrarem sobre esse tópico. (...) Não havia nelas nenhuma deformidade, e sem dúvida elas prestaram um serviço além do padrão médio da exigência humana, porque eu calculei, baseado em bons dados, que com aquelas pernas Wordsworth deve ter percorrido uma distância entre 175 mil a 180 mil milhas – uma forma de esforço que para ele se igualava ao vinho, à aguardente e a todos os outros estimulantes do espírito animal, ao qual ele foi devedor por uma vida de felicidade sem nuvens, e nós, por seus escritos mais excelentes”.
Dorothy Wordsworth (1771-1855) começou a caminhar ainda na infância por influência do irmão e, naturalmente, a família e os amigos a criticavam pela excentricidade de suas caminhadas, consideradas vergonhosas pela família. A primeira caminhada de longa distância que ela fez com William foi em 1794, quando percorreram em um único dia 55 quilômetros; porém a primeira excursão a pé foi em 1797, ocasião em que os dois irmãos foram à casa do amigo e poeta Samuel Taylor Coleridge (1772-1834), que se uniu à dupla em outras jornadas. Dorothy mantinha um diário dessas andanças, mas com informações lacônicas. Fotos: Fragmentos de mural: Termas de Caracala., Roma, 2014.





sexta-feira, 4 de abril de 2025

MAIS QUE UM SIMPLES JOGO

Quando o basquete se tornou um produto importante da televisão, o astrônomo e astrofísico norte-americano Carl Sagan (1934-1996) vislumbrou nesse esporte um meio para o ensino de Ciência e Matemática. Sagan foi divulgador científico e explicou muito bem o motivo que o levou a pensar em algo aparentemente tão excêntrico. Num artigo, ele definiu o basquete como um jogo que se tornou “em seus melhores momentos – a síntese esportiva suprema de inteligência, precisão, coragem audácia, intuição e astúcia, espírito de equipe, elegância e graça”. 

E aí pergunta-se, onde entra a ciência nesse coletivo de adjetivos? Sagan explicou que “para entender uma média de arremesso livre de 0,926 é preciso saber converter as frações em decimais. Uma bandeja é a primeira lei newtoniana do movimento posta em ação. Todo arremesso representa o lançamento de uma bola de basquete num arco parabólico, uma curva determinada pela mesma física gravitacional que especifica o voo de um míssil balístico, a Terra girando ao redor do Sol ou uma nave espacial indo ao encontro de um mundo distante. Quando o jogador enterra a bola na cesta, o centro de massa do seu corpo fica por breve instante em órbita ao redor do centro da Terra.”

E ele continua. “Para enfiar a bola na cesta, é preciso levantá-la na velocidade correta: 1% de erro, e a gravidade deixa o jogador em má situação. Os arremessadores de três pontos, sabendo ou não, compensam a resistência aerodinâmica. Cada uma das pancadas sucessivas de uma bola solta fica mais próxima do chão por causa da segunda lei da termodinâmica. Daryl Dawkins ou Shaquille O’Neal espatifando a tabela é uma oportunidade para ensinar – entre outras coisas – a propagação das ondas de choque.”

Essa é a beleza da Ciência. A Ciência e a Matemática permeiam nossas vidas e aprender a encontrá-las é o jogo mais fascinante que se pode praticar – a cada passo sempre há possibilidade de uma nova descoberta. 

Carl Sagan – “O mundo assombrado pelos demônios. A ciência vista como uma vela no escuro.” Companhia das Letras.

Foto: Wikipedia.