Na Avenida
Paulista.
O segundo morador da Avenida Paulista foi Francesco Antônio Maria
Matarazzo (1854-1937), imigrante italiano que se tornou o homem mais rico do
Brasil, graças ao seu talento empreendedor. Manteve-se nesse patamar por várias
décadas. Francisco Matarazzo comprou em 1896 o lote 83 na esquina com a Rua
Pamplona, contratou o engenheiro Giulio Saltini e o mestre de obras Luigi
Mancini, ambos italianos, para fazer o projeto da casa. Com o passar dos anos ele
foi adquirindo lotes vizinhos para ampliar a propriedade. Quando Francesco, mais conhecido como Francisco Matarazzo
morreu, assumiu o comando da família Francisco Matarazzo Jr. (1900-1977), que comandou
a grande reforma da casa.
Depois de avaliar vários trabalhos
apresentados, Francisco Matarazzo Jr. (Chiquinho Matarazzo) aprovou o projeto
do arquiteto italiano Tomaso Buzzi (1900-1981), que ele conheceu durante uma
visita de Buzzi ao Brasil. A reforma se processou durante o período da II
Guerra e a comunicação entre ambos ocorreu por cartas. Assim, em 1940 em pleno
conflito mundial o novo palacete em estilo neoclássico ficou pronto: tinha
4.400 metros quadrados de área construída em terreno de doze mil metros
quadrados. Eram dezenove quartos, dezessete salas, uma biblioteca – em que se
destacavam livros raros –, refeitórios e três adegas (Evoé Baco!). Havia ainda
piscina e adega. O acabamento e a pintura combinavam com o mármore travertino,
que revestia alguns cômodos da mansão – parte dele, sobras do edifício
Matarazzo do Anhangabaú. O mobiliário incluía móveis venezianos, mesas chinesas
e todas as preciosidades que o dinheiro dos Matarazzo podia comprar.
Em 1917 Francesco
recebeu do rei Vitor Emanuel III o título de conde como agradecimento pela
ajuda financeira à Itália durante a I Guerra (1914-1918). Chiquinho Matarazzo
herdou o título. Assim, nada mais natural que a família tivesse um brasão. E a mansão
da Avenida Paulista ostentava no pórtico de entrada o brasão esculpido em
mármore de Carrara. Pesava 150 kg.
Com as
grandes transformações econômicas e sociais, a família deixou o palacete e o
destino da propriedade gerou muita discussão na cidade, o que não impediu a
demolição da Vila Matarazzo em 1996. Uma polêmica que, na verdade, se repetia: na
década anterior a “Casa Mourisca” já fora demolida.
O campineiro Henrique Schaumann (1856-1922) formou-se
em Farmácia na Alemanha, país de origem de sua família, fundadora da famosa Botica
“Ao Veado d’Ouro” (Rua São Bento) que ele ao retornar assumiu e anos depois
vendeu, dedicando-se especialmente à política. Em 1906 Henrique Schaumann foi
morar perto do cunhado Von Büllow à Avenida Paulista, esquina com a Alameda
Joaquim Eugênio de Lima. O projeto era dos engenheiros Augusto Fried e Carlos
Ekman. Em 1934, o empresário Abraão Andraus, imigrante libanês e um dos sócios
da Casa Três Irmãos, na Rua Direita, perto do Largo da Misericórdia, comprou o imóvel,
contratou o construtor José Câmara para realizar o projeto de uma grande
reforma que o transformou na famosa “Casa Mourisca”. O Oriente estava em todos
os lugares do palacete: salas, quartos e banheiros. Uma visão europeizada do
Oriente.
José Câmara já havia feito a reforma da casa 63a da Paulista,
entre 1933 e 1934, introduzindo a moda do orientalismo na avenida. O cliente
era o irmão de Abraão e sócio da Casa Três Irmãos: Amin Andraus. Amin foi mais
comedido. O casarão tinha como destaque no interior um fumoir com pinturas ornamentais orientais e o mobiliário com
incrustações de madrepérola, proveniente de Beirute, como narra Renato
Brancaglionere Cristofi em sua dissertação de mestrado*, apresentada na FAU/USP
em 2016.
Cristofi reuniu em seu trabalho várias fotos do
interior da residência de Amin Andraus: “Nessas fotografias (...) percebemos
como era novamente diversificado o conjunto de resultados criativos do que
seria um palacete mourisco, concebido nessa tênue fronteira entre os elementos
e sentidos da representação do Oriente e as expectativas do viver à francesa’”. A “Casa Mourisca”
encantava a todos, mas em 1982 os proprietários (família Lotaif) não se
comoveram com a repercussão negativa da decisão de demolir a mansão antes
que ela fosse tombada pelo patrimônio histórico como um marco da arquitetura
paulistana. Na calada de uma noite de julho de 1982, foi posta abaixo.
* “O orientalismo arquitetônico em
São Paulo – (1895-1937)”, disponível para leitura na Internet.
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