na aurora de minha vida
E numa aurora cresci.
No largo do Paiçandu
Sonhei, foi luta renhida,
Fiquei pobre e me vi nu.
Nesta rua Lopes Chaves
Envelheço, e envergonhado
Nem sei quem foi Lopes Chaves.
Mamãe! me dá essa lua,
Ser esquecido e ignorado
Como esses nomes da rua."
Mário Raul de Moraes Andrade nasceu em São Paulo em 9 de outubro de 1893 e faleceu em 25 de fevereiro
de 1945 na casa da Rua Lopes Chaves, 546 - Barra Funda.
Carta de Mário de Andrade para Cândido Portinari, em 25 de março de 1935:
“Si eu pudesse e si houvesse uma boa
revista que publicasse tricomias, escrevinhava como o Manuel um ensaio sobre
Meus Dois Pintores, você e o Segall. Mostraria então o que foi pra mim uma
revelação, um verdadeiro soco na barriga quando descobri: é que você me revelou
o meu lado angélico, ao passo que o Segall
me revelou o meu lado diabólico, as tendências más que procuro vencer.
Às vezes me paro em frente do seu quadro e fico, fico, fico, não só perdido na
beleza da pintura, mas me refortalecendo a mim mesmo. Porque de-fato você mais
que ninguém, não apenas percebeu, mas me revelou que eu ... sou bom. Seu quadro
me dá confiança em mim, me dá mais vontade de trabalhar, de continuar, é um
verdadeiro tônico. Foi um bem enorme que você me fez.”
À esquerda o retrato feito por Cândido Portinari e à direita o de Lasar Segall.
À esquerda o retrato feito por Cândido Portinari e à direita o de Lasar Segall.
“(...) A pintora, com
as pálpebras semicerradas, trabalhava rápido, febril. Sua mão agílima
abandonava pincéis, misturava cores, criava tons inebriantes, imateriais, num
frenesi potente de criação. Toda entregue ao prazer de pintar, não me escutava,
direi mesmo que não me via. Isso consolava-me um pouco da minha pobre figura
esguicho, sem cores, muito morna. (...) Pintava. Pintava sempre. Pintava de
cor, trêmula de ânsia, gloriosa de força divinatória. Suas cores eram
fantasmagorias simbólicas, eram sinônimos. Por trás de minha face longa,
divinizada pelo traço do artista, um segundo plano arlequinal, que era mina
alma. Tons de cinza que eram minha tristeza sem razão... Tons de oiro que eram
minha alegria miliária... Tons de fogo que eram meus ímpetos entusiásticos...
Eu vibrava, como que recoando a ressonância anímica da artista. E o atelier era
como que uma sinfonia de vidas incriadas, inexistentes, em acordes físicos
sobrefortes, em melodias espirituais sobre-elevadas! Lá fora a manhã infantil
cambalhotava pelos morros. Era a vida num momento de rir! Na penumbra do
atelier um entusiasmo artificial, um lirismo sem nexo, fantasias sem modelo,
colocava-nos para além das alegrias e das dores. Era a arte num momento de
sonhar!”
"As margaridas de Mário", obra de Anita Malfatti, 1922. |
"Eu sou um escritor difícil
Que muita gente enquisila,
Porém essa culpa é fácil
De se acabar de uma vez:
É só tirar a cortina
Que entra luz nessa
escuridez."
(“A costela do Grão Cão”)
MÁRIO E AS CRIANÇAS
MÁRIO E AS CRIANÇAS
Mário de Andrade,
convidado pelo prefeito Fábio Prado (1934/1938), criou o Departamento de
Cultura do município de São Paulo em 1935 e em sua gestão implantou os parques infantis destinados a crianças de famílias operárias com
idade entre três e 12 anos. Mário de Andrade
continuava moderno: esta foi a primeira experiência brasileira pública municipal
de educação e a proposta da iniciativa era “a criação
de espaços de brincadeira, aprendizado e recreio, de maneira conjugada com a
incipiente assistência social da época”. Os pais podiam deixar seus
filhos em segurança enquanto trabalhavam e se quisessem podiam cadastrar os
filhos para acompanhamento de atividades de assistência odontológica e de saúde.
Os três primeiros parques infantis foram construídos
no Ipiranga, na Lapa e no Parque D. Pedro I.
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