quarta-feira, 9 de outubro de 2019

MÁRIO, SEMPRE MÁRIO.

"Na rua Aurora eu nasci
na aurora de minha vida
E numa aurora cresci.

No largo do Paiçandu
Sonhei, foi luta renhida,
Fiquei pobre e me vi nu.

Nesta rua Lopes Chaves
Envelheço, e envergonhado
Nem sei quem foi Lopes Chaves.

Mamãe! me dá essa lua,
Ser esquecido e ignorado
Como esses nomes da rua."

Mário Raul de Moraes Andrade nasceu em São Paulo em 9 de outubro de 1893 e faleceu em 25 de fevereiro de 1945 na casa da Rua Lopes Chaves, 546 - Barra Funda.

Carta de Mário de Andrade para Cândido Portinari, em 25 de março de 1935:
          “Si eu pudesse e si houvesse uma boa revista que publicasse tricomias, escrevinhava como o Manuel um ensaio sobre Meus Dois Pintores, você e o Segall. Mostraria então o que foi pra mim uma revelação, um verdadeiro soco na barriga quando descobri: é que você me revelou o meu lado angélico, ao passo que o Segall  me revelou o meu lado diabólico, as tendências más que procuro vencer. Às vezes me paro em frente do seu quadro e fico, fico, fico, não só perdido na beleza da pintura, mas me refortalecendo a mim mesmo. Porque de-fato você mais que ninguém, não apenas percebeu, mas me revelou que eu ... sou bom. Seu quadro me dá confiança em mim, me dá mais vontade de trabalhar, de continuar, é um verdadeiro tônico. Foi um bem enorme que você me fez.” 
À esquerda o retrato feito por Cândido Portinari e à direita o de Lasar Segall.



Mário de Andrade, Carnaval de 1922, sobre o retrato dele pintado por Anita Malfatti:
          “(...) A pintora, com as pálpebras semicerradas, trabalhava rápido, febril. Sua mão agílima abandonava pincéis, misturava cores, criava tons inebriantes, imateriais, num frenesi potente de criação. Toda entregue ao prazer de pintar, não me escutava, direi mesmo que não me via. Isso consolava-me um pouco da minha pobre figura esguicho, sem cores, muito morna. (...) Pintava. Pintava sempre. Pintava de cor, trêmula de ânsia, gloriosa de força divinatória. Suas cores eram fantasmagorias simbólicas, eram sinônimos. Por trás de minha face longa, divinizada pelo traço do artista, um segundo plano arlequinal, que era mina alma. Tons de cinza que eram minha tristeza sem razão... Tons de oiro que eram minha alegria miliária... Tons de fogo que eram meus ímpetos entusiásticos... Eu vibrava, como que recoando a ressonância anímica da artista. E o atelier era como que uma sinfonia de vidas incriadas, inexistentes, em acordes físicos sobrefortes, em melodias espirituais sobre-elevadas! Lá fora a manhã infantil cambalhotava pelos morros. Era a vida num momento de rir! Na penumbra do atelier um entusiasmo artificial, um lirismo sem nexo, fantasias sem modelo, colocava-nos para além das alegrias e das dores. Era a arte num momento de sonhar!”
"As margaridas de Mário", obra de Anita Malfatti, 1922. 


"Eu sou um escritor difícil

Que muita gente enquisila,

Porém essa culpa é fácil

De se acabar de uma vez:

É só tirar a cortina

Que entra luz nessa escuridez."

(“A costela do Grão Cão”)

MÁRIO E AS CRIANÇAS

Mário de Andrade, convidado pelo prefeito Fábio Prado (1934/1938), criou o Departamento de Cultura do município de São Paulo em 1935 e em sua gestão implantou os parques infantis destinados a crianças de famílias operárias com idade entre três e 12 anos. Mário de Andrade continuava moderno: esta foi a primeira experiência brasileira pública municipal de educação e a proposta da iniciativa era “a criação de espaços de brincadeira, aprendizado e recreio, de maneira conjugada com a incipiente assistência social da época”. Os pais podiam deixar seus filhos em segurança enquanto trabalhavam e se quisessem podiam cadastrar os filhos para acompanhamento de atividades de assistência odontológica e de saúde. Os três primeiros parques infantis foram  construídos no Ipiranga, na Lapa e no Parque D. Pedro I. 

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