Quem trafega da avenida Angélica para a avenida Paulista
provavelmente ignora que isso se tornou possível porque uma senhora, nascida no
século XIX, achou que seria uma boa ideia. Ela era dona da área e viu na Paulista,
inaugurada em1891, o futuro da cidade.
Maria
Angélica Souza Queiroz (1842-1929), filha de Francisco Antônio de Souza
Queiroz, barão de Souza Queirós, e de Antônia Eufrosina de Campos Vergueiro,
nasceu em Rio Claro. Cresceu na fazenda São Jerônimo em Limeira, recebeu uma
educação esmerada e passava temporadas em São Paulo na chácara localizada na
atual avenida São Luís. Casou-se aos 20 anos com o primo Francisco de Aguiar Barros,
filho do barão de Itu, mudando para a chácara do marido, na rua Alegre
(Brigadeiro Tobias), no bairro de Santa Ifigênia. O casal teve dez filhos: o
primeiro foi Francisco, que nasceu em Itu em 1863, seguiram-se: Bento, Maria
Angélica, Leonarda, Alfredo, Antônia, Guiomar, Paula, Raul e Beatriz.
Com
tantos filhos, Francisco adquiriu então a chácara das Palmeiras, uma
propriedade formada em 1849; comprada em 1860 pelo médico dinamarquês Germano
Frederico Borghoff que cultivou nela cinco mil pés de chá, um pomar de pêssegos
e uvas; ele também criava vacas leiteiras e ainda vendia o capim que nascia
naturalmente na propriedade. Após enfrentar problemas financeiros, Borghoff pôs
a propriedade em leilão em 1874, e quem arrematou foi Domingos Marques da Silva
Ayrosa, dono da “Padaria das Famílias” (Rua do Comércio, 15. O novo proprietário
também teve muitos problemas para manter a chácara e a colocou à venda, quando
foi adquirida por Francisco de Aguiar Barros.
Num
mapa atual, a sede da chácara era na esquina da Alameda Barros com a rua
Albuquerque Lins, onde se encontra a capela de São Vicente de Paulo, mas o
perímetro do terreno era delimitado pelas atuais ruas das Palmeiras,
Conselheiro Brotero, avenidas Higienópolis e Angélica. Não achei muitas
informações sobre a vida do casal até 1890, quando Francisco morreu vítima de
um problema cardíaco. Viúva e muito rica, Angélica seguiu o exemplo de sua
“vizinha” Veridiana: resolveu construir um palacete e contratou o arquiteto
alemão Matheus Haussler, autor dos projetos da casa de Elias Antônio Pacheco e
Chaves (Campos Elíseos) e da Hospedaria dos Imigrantes. Haussler não deixou por
menos: inspirou-se no Palácio de Charlottenburg (Alemanha). A construção ficava
em posição elevada e era cercada de jardins. Angélica mudou para a nova
residência em 1893 e doou a casa da chácara das Palmeiras para a Associação das
Damas da Caridade de São Vicente de Paulo que tratou de lá instalar um orfanato
para meninas e um externato para ambos os sexos.
Surpreendentemente,
esta senhora inicia urbanização da região por suas terras, abrindo as primeiras
ruas do que se tornou o bairro de Santa Cecília. A primeira a ser criada (1895)
foi a Avenida Viúva Barros (Angélica), apenas o trecho entre a rua das
Palmeiras e a esquina da Jaguaribe. Da
mesma época é o primeiro trecho da rua Barão de Tatuí e uma transversal que foi
denominada Alameda Barros. Foi um projeto bem sucedido que se estendeu por anos.
A Câmara promoveu um acordo entre Angélica e o negociante Martinho Bouchard
para que dividissem as despesas de obras de um dos empreendimentos; em 1901 ela
pediu, e obteve isenção, total dos impostos por cinco anos para todos os
terrenos situados na Alameda Barros, Rua São Vicente de Paulo, Avenida Angélica
e nas demais “ruas que abrir desta Avenida em direção à cidade”. E assim Angélica
continuou a abrir ruas às quais foi dando o nome de seus familiares: Baronesa de
Itu (tia avó), Alameda Barros (marido) e amigos Conselheiro Brotero, Basílio
Machado e Gabriel dos Santos entre outros.
Das três grandes senhoras paulistas,
Angélica contribuiu, sem dúvida, de forma decisiva para a configuração do
bairro de Santa Cecília e entorno. Em 1898, a avenida Angélica era considerada uma das
mais formosas da cidade, como afirmou o vereador Serafim Leite.
Maria
Angélica Souza Queiroz faleceu em 1929.
Foto Wikipedia: Maria Angélica com a filha Angélica.
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