quarta-feira, 18 de maio de 2016

DOCES CAMICASES


Tudo o que elas precisam para viver está na própria natureza: as árvores, as flores, o pólen, a água, o sol e uma temperatura amena. Moradia? Elas mesmas constroem. Trabalho? Não falta: elas começam a lida logo cedo, com a primeira claridade do dia e só param quando o sol se põe. Vivem tranquilas, mas podem se tornar perigosas ao se sentirem ameaçadas.
Uma abelha operária vive em media um mês e meio. Se há escassez de néctar, ela é obrigada a voar muito para conseguir o alimento, sobrecarregando a musculatura; mas se ela for pouco exigida, dura até oito meses, principalmente no frio. A rainha vive até seis anos porque recebe a geleia real rica em proteína. Para um inseto que depende de flores, as cores não são o principal atrativo das abelhas, mas o perfume. O vermelho não passa de cinza para a abelha que, no entanto, enxerga o ultravioleta, imperceptível para a vista humana; ela vê ainda o azul, o amarelo e o branco.
É nas flores que elas encontram o néctar – líquido açucarado com o qual produzem o mel armazenado por elas nas colmeias. À medida que recolhem o néctar polinizam as plantas, propiciando a reprodução das espécies. O mel pode ter perfume suave e sabores diferentes, dependendo das flores que as abelhas visitam.
Essas pequenas criaturas conquistaram um dia um advogado a ponto de fazê-lo trocar os livros de Direito pelos de História Natural e se tornar uma das maiores autoridades em meio ambiente: Paulo Nogueira-Netto (94), um dos fundadores do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. O professor criou o apiário do IB onde ministrou um curso sobre O Mundo das Abelhas, dentro do Programa USP para a Terceira Idade. (O curso não existe mais.)
Há alguns anos ele contava em entrevista que apareceram pessoas com diferentes ideias sobre abelhas e até aquelas que não distinguiam uma abelha de uma mosca. Para enfrentar um público tão heterogêneo Nogueira-Netto adotou como técnica a linguagem da televisão. “Quando a televisão estava no inicio, fui convidado para fazer um programa e quis saber como deveria me expressar. O professor Paulo Vanzolim me disse que todo texto deveria ser acessível a uma criança de doze anos e dessa forma todos entenderiam o conteúdo da matéria”.
Há muitas espécies de abelhas, mas no curso ele tratava apenas de três: as mamangabas, Apis melífera e as meliponídeas. Ele ensinava as características de cada uma e falava sobre os seus produtos: a cera, o mel, a própolis e a polinização. As mamangabas são abelhas sociais que se veem nas flores, encontram-se por toda parte. A irapuã é inoportuna – corta o broto de plantas (como a laranjeira) e se enrosca no cabelo das pessoas como forma de defesa.  A jataí não tem ferrão e faz suas colmeias em pedras, relógios de luz e muros. As mais bravas são as abelhas africanas, introduzidas no Brasil em 1956.  
 Os alérgicos podem sofrer ataque anafilático e morrer após a picada da abelha e por isso é recomendável procurar logo ajuda no Instituto Butantã. Pouca gente sabe que a abelha deixa o ferrão e parte do intestino na vítima, o que causa a morte do inseto (exceto a mamangaba cujo ferrão tem estrutura diferente). “O ataque é uma ação de camicase” – explicava o professor.


(Sumário de entrevista que me foi concedida pelo professor Paulo Nogueira-Netto para o Calendário de Extensão Universitária – USP, s/d)

Av. Vital Brasil, Butantã, SP, 2014. Hilda Araújo.

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