Março este ano chega
fantasiado, mais alegre, sem aquele jeito sério de ser, deixando as
preocupações com o famigerado leão para mais tarde. Nem se precisa pedir
que chova três dias sem parar, pois em março as águas sempre vão rolar. Foliões
e celebridades de plantão não se importam. Com que roupa? Isso não é mais
problema. Qualquer uma do guarda-roupa moderno. Pelas vitrines da vida percebo
que é carnaval o ano todo. Ou se o corpinho estiver nos conformes, basta seguir
o exemplo de Chiquita Bacana, lá da Martinica, que se vestia com uma casca de
banana. Não sei bem se foi na fantasia da moça que o tal “nego” bebo escorregou
e quase caiu. (Por que bebes tanto assim, rapaz?) Yes, nós temos bananas
Nem sei se está na moda comprar um pierrô
de cetim, um pandeiro e um violão para alegrar o coração. Só se for um pierrô
sentimental, um sonhador desmilinguido por Colombina e que acabou entrando num
botequim bebeu, bebeu, saiu assim, assim e ainda foi tomar vermute com
amendoim. Ah! Essa Colombina que acha o Pierrô cacete e o despacha para tomar
sorvete com Arlequim... Mas no salão, repleto de palhaços, Arlequim chora pelo
amor da Colombina.
É tempo de carnaval. Há sensualidade no ar.
Languidez, voluptuosidade ou libertinagem. Talvez seja o verão, a lua cheia, a
música... O erotismo parece envolver a natureza, pois até “o mar passa
saborosamente a língua na areia (...)” e “por trás de uma folha de palmeira/ A
lua poderosa, mulher muito fogosa/ Vem nua, vem nua/ Sacudindo e brilhando
inteira”.
As musas são Maria, Mimi, Chiquita,
Madalena, Filisbina, Pimpinella, Bráulia, Zazá, Aurora, Juraci, Florisbela,
Júlia, Dedé, Amélia, Luzia e até Dona Balbina – que sem ser libertina, aprecia
a orgia. Anda, Luzia, pega o pandeiro e cai no carnaval.
Os homens correm atrás de sereias nas
praias e nos salões, avenidas e morros; choram seus desencantos em bondes e
barcos e até acreditam que “mais difícil, muito mais é conjugar o verbo amar”.
Loiras, morenas, ruivas não importa, a pergunta é a mesma: “viram meu amor por
aí?” Vão atrás da paixão até de lambreta, se for preciso. Por aí desfila seu
Cornélio, sempre o último a saber; já o João Pouca Roupa tem dinheiro no banco,
meu bem. Hora de gritar me dá um dinheiro aí! Há ainda Edgard, Lourival,
Zé Marmita e Gildo. O Rui, que teve a mulher roubada, preferiu calar suas
mágoas já que sua desgraça era pública e notória. O problema dele era mesmo
dinheiro!
A tristeza da amada,
entretanto, não impede o saçarico do amante: “tu andas tão triste/ somente a
chorar/mas por isso eu não vou/me privar de dançar/ tu sabes que eu faço/ o
passo na rua/ mas é pensando na imagem tua!”. Uma graça. Enquanto isso o velho
saçarica na porta da "Colombo"...
“E como ‘vaes’ você?" – perguntava Ary Barroso. E
com ele respondo que “No mar desta vida/ Vou navegando/ Vou temperando”. Nessa folia, carecas, pernas-de-pau, tagarelas estão unidos
mais do que nunca. Politicamente incorreto? “Desculpe-me, não me leve a mal. É
carnaval”. Quase.
.
A crônica foi baseada nas seguintes músicas de carnaval:
“Dona Balbina”, 1929. Composição de
Josué de Barros. Gravação: Carmen Miranda.
Tempo perdido, 1933. Composição de Ataulfo Alves. Gravação:
Carmen Miranda.
“Viram meu amor por aí?”, 1934.
Composição de João de Freitas Ferreira (Jonjoca). Gravação: Jonjoca.
“Pierrô apaixonado”, 1935. Composição
de Heitor dos Prazeres e Noel Rosa. Gravação: Joel e Gaúcho.
“Passado, presente e futuro”, 1935.
Composição de Herivelto Martins e Francisco Senna. Gravação: Dupla Preto e
Branco.
“Comprei uma fantasia de pierrô”,
1936. Composição de Lamartine Babo e Alberto Ribeiro. Gravação: Francisco
Alves.
“Como 'vaes você'?”, 1936, composição de
Ary Barroso. Gravação: Carmen Miranda.
“Manda embora essa tristeza”, 1936.
Composição de Capiba. Gravação: Aracy de Almeida.
“Minha Companhia É a
Colombina”, 1941. Composição: Lamartine Babo / Moacyr Araújo. Gravação: Orlando
Silva.
“João Pouca Roupa”, 1942. Composição
de Cinco Azes do Samba. Gravação: Os Bacharéis do Ritmo.
“Eu não posso viver sem mulher”,
1945. Composição de Roberto Martins e Mário Rossi. Gravação: Nelson Gonçalves.
Seu Cornélio, 1946. Composição de
Marino Pinto e Eratóstenes Frazão. Gravação de Linda Batista.
“Chiquita Bacana”, 1949, composição
de Braguinha e Alberto Ribeiro. Gravação: Emilinha Borba.
“Tomara que chova”, 1951. Composição
de Paquito e Romeu Gentil. Gravação: Emilinha Borba.
“Tem nego bebo aí”, 1959. Composição
de Mirabeau e Ayrton Amorim. Gravação: Carmen Costa. Ferreira – Homero, Glauco
e Ivan. Gravação: Moacir Franco.
“Máscara Negra”, 1967. Composição de Zé Kéti e
Pereira Matos. Gravação: Zé Kéti.
“Yes, nós temos bananas”, 1967.
Composição de João de barro e Alberto Ribeiro. Gravação: Caetano Veloso.
“Minha companhia é a colombina”,
Composição: Lamartine Babo. Gravação: Orlando Silva.
“Folia no matagal”, 1981.
Composição de Eduardo Dusek. Gravação: Maria Alcina.
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