sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

A AUTOCONFIANÇA DE DOIS JOVENS TALENTOS


Os dois jovens conquistaram em diferentes ocasiões e circunstâncias duas pessoas importantes na vida política e intelectual brasileira do início do século passado e nenhum dos dois conhecidos pelo bom gênio. Os jovens nasceram em 1893 e 1898. O mais novo, em Caruaru (SE) e o outro, em Tatuí (SP).
        Belarmino Maria Austregésilo Augusto de Athayde (1898-1993) tinha 17 anos e preparava-se para ser padre, quando foi dispensado do seminário da Prainha (CE) porque não tinha vocação para o sacerdócio. O reitor reconhecia que ele era bem comportado e estudioso, disse-lhe que com essas boas qualidades seria brilhante em qualquer outra carreira e o aconselhou a ser jornalista. 
      Em meados de julho de 1918, Belarmino desembarcou no Rio de Janeiro, onde foi acolhido por um tio, que o convidou em setembro para um jantar com o advogado e jornalista Assis Chateaubriand (1892-1968), que já sonhava em comprar um jornal. A Grande Guerra (1914-1918) terminara e o jornalista, ao contrário do Belarmino, era pró-Alemanha. Em meio ao jantar, Chateaubriand defendia os alemães quando o jovem convidado o interrompeu, afirmando que lia os artigos dele, porém, não concordava em absoluto com aquelas ideias e expôs sua opinião. A petulância de Belarmino surpreendeu Chateaubriand e logo descobriu que eles discordavam em quase tudo, mas nem por isso a noite se perdeu. Ao se despedir, o convidou para ir remar no Clube Guanabara. Continuaram remando vida afora. A amizade cresceu e mais tarde veio o convite: “Caboclo, quando eu comprar um jornal, você vem trabalhar comigo”.
Austregésilo de Athayde já escrevia em jornal quando, em 1924, Assis Chateaubriand apareceu na casa dele e bem a seu modo anunciou: “Caboclo, não podemos perder tempo! Mãos à obra! Vamos tomar posse de O JORNAL. Acabei de comprar aquele diário e quero você como testemunha na hora de sacramentar o negócio”.
Austregésilo de Athayde e Assis Chateaubriand mantiveram uma relação profissional e de amizade que durou 44 anos. Professor, jornalista, cronista e ensaísta, Austregésilo de Athayde sempre teve total liberdade de expressão nos DIÁRIOS ASSOCIADOS, um privilégio em se tratando de Chateaubriand.  
NUMA TARDE de 1920, Paulo de Oliveira Leite Setúbal (1893-1937) entrou na redação da REVISTA DO BRASIL, propriedade do ranzinza Monteiro Lobato (1882-1948), com suas poesias debaixo do braço. Nem esperou para mostrá-las ao editor. Entrou declamando seus versos e “aquele faiscamento recém-chegado do interior, cheirando à natureza, numa euforia sem intermitência” conquistou o pai do Visconde de Sabugosa*. Monteiro Lobato escreveu depois sobre “a tremenda força de sua simpatia, irradiante, inundante e avassalante”, que o levou a editar sem pestanejar a coletânea de poesias que ganhou o título de “Alma Cabocla”, com ilustrações a bico de pena de Antônio Paim. Paulo Setúbal não era apenas muito simpático. Era um poeta. O livro foi um sucesso imenso. A edição de três mil exemplares esgotou-se em um mês, o que levou a mais duas edições com a mesma tiragem nos meses seguintes. Mais tarde ele se dedicou ao romance histórico (“A Marquesa de Santos”, “As maluquices do Imperador” entre outros) com igual sucesso.

Austregésilo de Athayde, membro da Academia Brasileira de Letras, cadeira 8, ocupante 3.
Paulo Setúbal, membro da Academia Brasileira de Letras, cadeira 31, ocupante 3.

*Lobato começou a escrever para crianças apenas em 1931.  

Nenhum comentário: