E lá estavam eles à beira da calçada. Furtados? Abandonados? Esquecidos? Alguns meses atrás encontrei um par de sapatos femininos novos numa calçada do Cambuci; hoje estes tênis (?) masculinos (unissex?) na Aclimação. Estranho... Pensando no assunto (sem coisa melhor para fazer no caminho), como estavam junto à traseira de um veículo, talvez o dono tenha esvaziado o porta-malas e esquecido os sapatos na calçada... Quem sabe? Encontrar duas vezes sapatos quase novos abandonados no caminho me fez pensar em algum tipo de brincadeira para ver a reação das pessoas diante do achado. Aclimação e Cambuci são bairros vizinhos, as ruas em que estavam, residenciais e de pouco movimento... Enfim, pode ter sido apenas esquecimento mesmo.
quarta-feira, 30 de novembro de 2022
terça-feira, 29 de novembro de 2022
MÁRIO E SÉRGIO, OBRIGADA.
Eu ia
saindo do prédio e ela, passando. Cumprimentei porque não me era estranha.
Atravessei a rua, segui meu caminho e eis que a reencontro na padaria. Ela
sorri, comenta sobre as delícias espalhadas pelo balcão. Não resisto. “Eu a
conheço de algum lugar, mas não consigo localizar.” Provavelmente, da
biblioteca, diz ela. Claro! Bibliotecária da Mário de Andrade.
Esse
encontro casual me faz lembrar que faz 40 anos que frequento a Biblioteca
Circulante da Mário de Andrade. Assim que mudei para São Paulo em 1982 me
inscrevi. Era na Praça Roosevelt em um prédio estranho em que havia uma loja
Pão de Açúcar, uma escola infantil e a biblioteca. Em frente do famoso Cine
Biju. Fiquei deslumbrada com a quantidade de livros maravilhosos e a cada
quinze dias ia até lá escolher uma preciosidade. Aos sábados porque aproveitava
para comer um doce na feira da Praça da República. Numa das salas ficavam os
arquivos de aço, com as fichas datilografadas que o leitor consultava por
assunto para localizar o livro desejado.
Alguns
anos depois o prédio se deteriorou, chovia mais dentro do que fora. A
biblioteca mudou para o casarão da Chácara Lane (rua da Consolação, 1024) e
alguns anos depois foi para a rua Frei Caneca, Cerqueira César. Por uma série
de fatores esse foi o único período em que não frequentei a circulante. Voltei
quando terminou o restauro da Biblioteca Mário de Andrade (Rua da Consolação, 94)
e a circulante foi para lá. Desde então é possível consultar obras raras,
visitar a sala dedicada a São Paulo e ver exposições. Jornais e revistas
antigos? Logo ali do outro lado do jardim, na rua Dr. Bráulio Gomes, 139.
Frequento também a Biblioteca Sérgio Milliet no
Centro Cultural São Paulo (rua Vergueiro, 1000), a minha preferida durante a
pandemia porque posso ir a pé e não precisava agendamento para retirar os
livros. O problema do agendamento, na BMA pelo famoso telefone 156, era o “sistema”, que não reconhecia
senha, demorava horas para se conseguir entrar na página e precisava ir de
metrô...
Para se inscrever na Biblioteca Circulante é preciso apresentar RG e um comprovante de residência no município de São Paulo. A inscrição vale para todas bibliotecas públicas municipais circulantes.
Fotos da Biblioteca Sérgio Milliet durante a pandemia (2020) quando os leitores faziam os pedidos e os livros eram entregues na entrada porque não era permitido circular pelas dependências da instituição.
sexta-feira, 25 de novembro de 2022
CAMINHANDO POR SAMPA
A pandemia parece não ter fim... O número de casos aumentou nas últimas semanas e as máscaras voltam a ser obrigatórias no transporte público em São Paulo, onde tenho mantido o uso delas, assim como em outros locais, especialmente, aqueles com muito público. Prevenir não faz mal a ninguém.
Durante a semana visitei a Capela Santa
Luzia, que fez parte do complexo do Hospital Humberto I, mais conhecido como
como Hospital Matarazzo, pois foi construído e doado à cidade por Virgínia
Matarazzo em 1922. Com o passar dos anos, o hospital entrou em decadência, foi
abandonado, vendido e transformado no empreendimento Rosewood. Do projeto
original sobraram a capela, que passou por um cuidadoso processo de restauro, e
o prédio da maternidade. Alameda Rio Claro, 190 – Bela Vista. A uma quadra da
avenida Paulista.
Outra igreja. Quem se dirige à estação Vergueiro do
Metrô pela rua Vergueiro, pode admirar no alto a igreja Santo Agostinho, que
fica numa praça acolhedora. O acesso é por uma escadaria ou pela rua Apeninos.
Começou a ser construída em 1911, tem estilo neogótico e um elegante interior
em que se destacam as capelas laterais e afrescos pintados por artistas da
época.
No pequeno shopping da Rua Pelotas, tudo pronto para quando dezembro chegar. E junto os consumidores.
Ambiente bonito no Conjunto Nacional, mas Papai Noel devia estar em horário de almoço. Ou será que ainda não tinha sido contratado?Caminhei pelo Centro Histórico até o SESC do Carmo onde visitei a exposição sobre o modernismo. Bonita, mas confusa porque inclui outros temas. Na saída, observo os cavalos da Polícia Militar em momentos de descanso à sombra, na calçada da Rua Ana Néri. Sempre atraem a atenção de algum pedestre que para e joga conversa fora com os policiais.Enfim, a semana termina com o comércio oferecendo “pechinchas” cujos preços devem ser muito bem analisados depois da verificação da real necessidade do produto. Sempre é bom lembrar que comprar por impulso é jogar o dinheiro fora.
quinta-feira, 24 de novembro de 2022
NOBEL DE LITERATURA
De
1901, quando foi criado, até este ano foram atribuídos 119 prêmios Nobel de
Literatura. O prêmio só não foi concedido em 1914, 1918, 1935 e de 1940 a 1943. O país com o maior número de laureados é
a França (16), seguindo-se os Estados Unidos com doze e o Reino Unido com onze.
O único escritor de língua portuguesa na lista é José Saramago (1998). Gabriela
Mistral (1954), Pablo Neruda (1971), Gabriel Garcia Marques (1982) e Mario
Vargas Llosa (2010) são os sul-americanos agraciados.
O escritor Juan Marsé (1933-2020) dizia que “do
ponto de vista estritamente literário, os prêmios não servem para nada, não
ajudam a escrever melhor nem nada disso, mas servem para difundir e vender mais
livros, o que não é pouco”. Marsé, que nasceu em Barcelona, não ganhou Nobel,
mas outros prêmios, como o Cervantes. E pode-se acrescentar que a premiação também
não garante imortalidade (assim como as academias de letras cheias de imortais
mortais). Autores como Kipling (1865-1907), Yeats (1865-1939), Bernard Shaw
(1856-1950), Henry Bergson (1856-1941), Thomas Mann (1875-1955). Eugene O’Neal
(1888-1953), Hermann Hesse (1877-1962), T. S. Elliot (1889-1965), Winston
Churchill (1874-1965) e Albert Camus (1913-1960) e Boris Pasternak (1890-1960) –
só para citar ganhadores da primeira metade do século passado – não precisavam
do prêmio para ter suas obras lidas e citadas até hoje.
Dos escritores relacionados, só não li Yeats e Boris
Pasternak; Camus e Thomas Mann são os meus preferidos; de Churchill consulto
frequentemente a obra sobre a “Segunda Guerra Mundial” e “História dos Povos de
Língua Inglesa”. Na adolescência li vários livros da americana Pearl Buck (1892-1973),
muitos dos quais traduzidos por Raquel de Queirós.
Nieto também trata do sucesso que, segundo ele, tanto pode significar brilhar como aparecer “nos jornais, na TV, comparecer a coquetéis,
lançamentos de livros ou recepções magníficas, fazer vida mundana”. E cita
Jorge Luís Borges: "O sucesso é algo tão efêmero... Em 1910 acreditava-se que o melhor escritor da
literatura francesa, isto é da universal (pois assim era medida então), era
Anatole France. Atualmente, isso pareceria uma ironia um tanto rude, mas naquela
época era considerado tão grande quanto Voltaire”.
“O
livro convida-nos ao desconsolo pela amargura ou doçura que num momento dado
reflete nossa vida. Mas num sentido mais geral, o leitor que escolhe uma obra
determinada, e dela se imbui, está fazendo, como aconteceu previamente ao
autor, um exercício de liberdade. E isto não acontece apenas com a literatura,
mas com a arte em geral. O simples fato de contemplar um quadro, ouvir uma
sinfonia, de assistir a uma representação dramática, de ler um romance, supõe
um deslocamento para outras coordenadas, diferentes daquelas em que se
desenvolve nossa vida.” Escritor espanhol Ramón Nieto (1934).
A leitura e a literatura são necessidades
universais que devem ser satisfeitas "sob pena de mutilar a personalidade,
porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo elas nos
organizam, nos libertam do caos e portanto nos humanizam", encerrando com Antonio
Cândido de Mello e Souza (1918-2017).
Ah! A vencedora do Nobel de Literatura deste ano, a escritora francesa Annie Ernaux (1940), receberá US 900 mil dólares "pela coragem e acuidade clínica com que desvenda as raízes, os estranhamentos e os constrangimentos coletivos da memória pessoal". Sábado estará na Flip, em Parati, Rio de Janeiro.(Fotos: Hilda Araújo.)
segunda-feira, 21 de novembro de 2022
VERNÔNIA
Outro dia escrevi sobre os pobres e vagabundos da Idade Média e lembrei de “Vernônia”, do escritor norte-americano William Kennedy (1928). A história se passa em 1938, quando os Estados Unidos enfrentavam ainda as consequências da Grande Depressão (1929). O personagem Francis Phelan tinha sido um jogador de beisebol promissor, mas sua vida mudou completamente quando causou duas mortes – uma delas do filho recém-nascido por acidente. A narrativa começa muitos anos depois, num inverno em Albany, quando Francis luta contra a miséria, o alcoolismo e a consciência, que o faz confrontar seus demônios. Com ele e um grupo de miseráveis para os quais a vida reservou só dissabores, percorremos abrigos de caridade, motéis desprezíveis, ruas imundas e bares desoladores.
Francis vive um realismo
fantástico em que encontra e conversa com seus mortos; os vivos às vezes
demonstram solidariedade. Ou o exploram, como o advogado que defende Francis, exige
o pagamento dos serviços e para receber o dinheiro arranja-lhe um emprego no
cemitério. É nesse ponto que começa a história, uma história de resistência e
daí Ironweed, o título original do livro, nome de uma planta da família
dos girassóis, cuja haste ereta é bastante firme. Em português ironweed é
vernônia...
Se você pensa que é um
livro horrível, engana-se. Há um toque de humor e sarcasmo nos diálogos dessas
pessoas. É um livro para reflexão sobre a vida, a sociedade em que vivemos e a
incapacidade para escapar das eventuais armadilhas com que nos deparamos ao
longo da existência. É impossível não ter um envolvimento emocional com os
personagens.
“Vernônia” é um ótimo
livro. Um livro que foi recusado por treze editores com a justificativa de que
ninguém queria ler sobre vagabundos. Graças aos protestos do ex-professor de William
Kennedy, o Prêmio Nobel Saul Bellow que a Viking Press publicou a obra. Os
outros editores devem ter ficado bem aborrecidos com o resultado: o Pulitzer,
Prêmio da Fundação MacArthur entre outras honrarias, como a adaptação para o
cinema em 1987 – roteiro do próprio Kennedy e direção de Hector Babenco.
sexta-feira, 18 de novembro de 2022
MANOLO OTERO
Há dias me dedico à limpeza de papel velho, amarelecido e seco, foi quando achei a reportagem e então resolvi fazer a transcrição de parte de uma longa entrevista que fiz com o cantor espanhol Manolo Otero (1942-2011) em 1986. Infelizmente, não lembro se o show foi em Santos ou Guarujá. Ele era filho de artistas – o pai era cantor de ópera e a mãe, atriz; cursou Filosofia e Letras na Universidade de Madri e iniciou a carreira artística em 1975, quando gravou seu primeiro disco "Todo el tiempo del mundo". Na ocasião, reconheceu que tinha no Brasil uma receptividade muito boa, tanto como cantor como pessoa. Anos depois desta entrevista, ele estabeleceu residência em São Paulo, onde faleceu.
“No palco,
o conjunto começa a tocar “I’ve got you under my skin”, enquanto os
casais trajados com uma elegância sóbria vão chegando e se acomodando em seus
lugares á mesa para desfrutar de Una noche madrileña, como o clube
prometia. No terraço, um jovem casal dança à moda antiga. No ar, uma
expectativa: a chegada do astro principal, o cantor madrilenho Manolo Otero (39
anos). O conjunto agora toca uma seleção de Henry Mancini. À mesa, as pessoas degustam
paella, boquerones fritos ou chorizo, enquanto esperam
aquele que é considerado um dos maiores cantores românticos de seu país. O outro*,
sem dúvida, não chega sequer a ser mencionado, por questão de tato.
Manolo e comitiva chegam no horário
previsto e se encaminham para os camarins. Jeito displicente, atencioso, Manolo
Otero se esconde atrás de óculos escuros (apesar de ser quase meia-noite), acessório
predileto de todos os artistas. O diretor social do clube inicia as
conversações sobre a possibilidade de uma entrevista e o cantor concorda
imediatamente.
O problema surge quanto ao lugar
onde vai acontecer. Sai do camarim (sempre com a comitiva que inclui uma zelosa
esposa colombiana) e vai até a sala de carteado, onde um reduzido grupo logo se
entusiasma com a ideia da proximidade de um astro internacional. Quem não gosta
da ideia é Manolo, que pede um lugar mais íntimo. Finalmente, todos se dirigem
à sala de bale. Ele aprova.
Parece à vontade, tanto que ensaia colocar
a perna na barra. Inteiramente desajeitado. Negócio dele é cantar mesmo. Posa
para fotografias, recebe abraços de alguns fãs e finalmente senta para a
entrevista. A esposa se mantém logo atrás, atenta. Começa falando da carreira
no Brasil e então a primeira surpresa: Manolo Otero fala num verdadeiro portunhol,
talvez uma tentativa para se mostrar agradável e demonstrar que está mais
intimo com a vida do país que o vem acolhendo muito bem.
Durante a entrevista é diplomático nas
respostas: não recusa abrir inteiramente o jogo quando se trata de política,
mas confessa que prefere plateias mais maduras ao falar da carreira; diz que não
gosta muito de futebol, entretanto, demonstra perfeito conhecimento do que
ocorreu com a seleção brasileira (embora não perguntado sobre isso). Em nível
pessoal é anarquista, mas parece muito mais um conservador. No final, uma
declaração de amor: ao palco.
Manolo já conhecia o Brasil o
brasil, pois sempre passou férias em Salvador e no Rio, após temporadas argentinas.
Em fins de 1982 fez a primeira investida no mercado brasileiro com um show no
que ele considerava um lugar pequeno, o Maksoud Plaza, já que era desconhecido.
“As pessoas não me conheciam, não sabiam se eu era cantor, futebolista ou
toureiro, por isso escolhemos um local de espaço reduzido.” Mas a verdade é que
o público já lhe havia garantido um disco de ouro, graças à venda do primeiro
elepê, mesmo sem ter visto de perto o cantor. A apresentação foi um sucesso, a
temporada, prorrogada e desde então ele vem todos os anos ao Brasil."
segunda-feira, 14 de novembro de 2022
A JUVENTUDE ETERNA
O cinema é mágico. Sempre será. Ele mexe com sentimentos, estimula a imaginação, desperta lembranças e ainda permite que, de pedacinhos fantásticos de muitos filmes deliciosos, se faça outro filme para ver e rever com muito prazer esses atores que nos proporcionaram momentos especiais. E eles ganharam muito mais que o dinheiro (talvez nem tanto naqueles tempos): conquistaram a eterna juventude. “Wake Me Up Before You Go-Go”, afinal hoje é segunda-feira.
sábado, 12 de novembro de 2022
OS POBRES
Quem
aprecia castelos medievais e suspira por cavaleiros andantes e trovadores, talvez
ignore que esse foi um dos períodos mais difíceis da Europa, quando a pobreza
social e a pobreza biológica coexistiram entre os séculos XIV e XVII. Assim, milhares
de pessoas sem acesso às oportunidades disponíveis, que eram poucas, e sem
abrigo e alimento, elas se reinventavam para sobreviver. Como? Estabelecendo-se
à margem da sociedade que à época valorizava o trabalho acima de tudo (São
Paulo: “quem não trabalhar não deve comer” – Epístolas aos Tessalonicenses) e dependendo de
caridade da Igreja e pública. Os mendigos eram divididos em duas categorias –
os incapazes para o trabalho, que recebiam ajuda, e os sãos de corpo, considerados
vagabundos e, portanto, iam para a prisão ou eram expulsos das cidades, que
consideravam a mendicância um crime. Muitas vezes condenados à morte em caso de
reincidência. Logo, entretanto, menestréis, frades, eremitas, peregrinos,
insanos e estudantes em trânsito tinham que apresentar documentos às
autoridades, correndo o risco de serem considerados mendigos e sofrer as
consequências.
A miserabilidade cresceu tanto que milhares
de mendigos acabaram caindo na marginalidade, se especializando em golpes,
organizando quadrilhas, criando sua própria linguagem, enfim, ingressando na criminalidade.
O historiador polonês Bronislaw Geremek escreveu um livro sobre o tema, com
base em uma pesquisa que abrange documentos, folhetos e a literatura da época,
para nos mostrar um pouco do que ocorreu na Europa medieval. A obra – “Os
Filhos de Caim: Vagabundos e Miseráveis na Literatura Europeia de 1400-1700” – é,
na verdade, um tratado sobre o tema. É importante ressaltar que, embora a
maioria dos textos citados não seja oficial, a realidade não deve ser muito
melhor, já que a literatura costuma retratar sua época, como o próprio autor
alerta. Geremek lembra o fato de que os autores, provavelmente, basearam muitas
histórias na tradição oral, o que sempre nos leva a supor que “quem conta um
conto, aumenta um ponto”.
Uma das principais obras citadas é o
Liber Vagatorum (Livro dos Vaganundos, autor alemão anônimo), de caráter didático religioso: “com
seu discurso meticuloso e um olhar abrangente constitui uma espécie de itinerário
dantesco que oferece um quadro vasto e minucioso dos espetáculos que os
mendigos, usando a palavra e a mímica, apresentavam nas ruas, estradas e praças
dos dias de semana e nos feriados”. Martinho Lutero, que fora vítima de fraudes
várias vezes, prefaciou a edição de 1528 em que pregou uma nova política social.
Infelizmente, a miséria não desapareceu
com o passar do tempo. O problema social continua em pleno século XXI e se
agrava, mas o olhar do homem comum ainda é mais de crítica do que de
solidariedade. O surpreendente no livro é a constatação de que muitos dos
truques e golpes que a imprensa registra nos dias atuais, – praticados por
aqueles que perderam a esperança –, já eram usados naquela época. A maquiagem
para simular doenças ou ferimentos; o uso de crianças para amolecer o coração
das pessoas; a organização de bandos para a exploração dos seus companheiros de
infortúnio...
Em agosto de 1667, conta Geremek, “teve
lugar um acontecimento que foi decerto uma das causas de suas sucessivas
iniciativas: durante a festa da Assunção os vagamundos provocaram pânico na
catedral de Notre-Dame e em seguida aproveitando a confusão, perpetraram um
roubo em massa”. Arrastão? Ninguém escapava de fraudes.
Se na literatura, os desvalidos
estão nas obras do inglês William Shakespeare (1554-1616), do espanhol Miguel
de Cervantes (1547-1616), do escocês Walter Scott (1771-1832) e do francês Victor
Hugo (1802-1885) – citando apenas alguns; o cinema também os inclui. Clássico é
Carlitos, de Charles Chaplin (1889-1977), sem contar “O incrível exército de
Brancaleone” (1966), de Mario Monicelli, e “O feitiço de Áquila”(1985),
dirigido por Richard Donner.
Foto: Thomas
Anselm – Germanisches Nationalmuseum Nürnberg. Wikipedia.
quarta-feira, 9 de novembro de 2022
SOBRE RELÓGIOS E CELULARES
Não uso relógio desde que me aposentei. Basta o celular que, frequentemente, esqueço em casa. Algumas vezes preciso saber a hora e por perto, nenhum relógio à vista. Para não perturbar as pessoas procuro alguém com um relógio de pulso e, para minha surpresa, em várias ocasiões, os interpelados pegam o celular para consultar o horário. Acho que o velho relógio virou enfeite... E ainda bastante procurado porque tempos atrás, cortando caminho para o Mercado da Cantareira, passei por uma galeria da Rua Florêncio de Abreu onde, nos dois ou três andares do prédio, havia praticamente apenas dois produtos: óculos escuros e relógios – aos milhares e quase todos iguais. Viva a China!
segunda-feira, 7 de novembro de 2022
GREGÓRIO DE MATOS
Gregório de Matos Guerra (1636-1696) nasceu na Bahia, foi advogado e poeta. É considerado o maior poeta do barroco português e brasileiro; mas foi como satírico que passou para a posteridade; notabilizou-se também pelos temas sobre sexo numa linguagem desabrida para o século XVII, afinal, eram tempos em que para a Igreja todos eram anjos. Achei estes versos do Boca do Inferno, alcunha com que ficou conhecido, numa revista da Biblioteca Nacional:
União de barrigas,
Um breve
tremor de artérias.
Uma confusão
de bocas,
Uma batalha
de veias,
Um rebuliço
de ancas,
Que diz
outra coisa é besta.”
Ilustração: “Study
after Vélazquez’s: Portrait of Pope Innocent X”, 1953. Óleo sobre tela de
Francis Bacon (1909-1992).
quarta-feira, 2 de novembro de 2022
FINADOS
Pois breve é toda vida
O instante é o arremedo
De uma coisa perdida.
Entre os comentários de um vídeo, alguém comentou que em outros lugares, quando você morre tem um funeral, em New Orleans (Luisiana), você tem uma parada. E que parada! Quando visitei a cidade, comprei um vídeo sobre a história dos funerais, que constituem uma tradição local.