segunda-feira, 21 de novembro de 2022

VERNÔNIA

 

Outro dia escrevi sobre os pobres e vagabundos da Idade Média e lembrei de “Vernônia”, do escritor norte-americano William Kennedy (1928). A história se passa em 1938, quando os Estados Unidos enfrentavam ainda as consequências da Grande Depressão (1929). O personagem Francis Phelan tinha sido um jogador de beisebol promissor, mas sua vida mudou completamente quando causou duas mortes – uma delas do filho recém-nascido por acidente. A narrativa começa muitos anos depois, num inverno em Albany, quando Francis luta contra a miséria, o alcoolismo e a consciência, que o faz confrontar seus demônios. Com ele e um grupo de miseráveis para os quais a vida reservou só dissabores, percorremos abrigos de caridade, motéis desprezíveis, ruas imundas e bares desoladores.

Francis vive um realismo fantástico em que encontra e conversa com seus mortos; os vivos às vezes demonstram solidariedade. Ou o exploram, como o advogado que defende Francis, exige o pagamento dos serviços e para receber o dinheiro arranja-lhe um emprego no cemitério. É nesse ponto que começa a história, uma história de resistência e daí Ironweed, o título original do livro, nome de uma planta da família dos girassóis, cuja haste ereta é bastante firme. Em português ironweed é vernônia...

Se você pensa que é um livro horrível, engana-se. Há um toque de humor e sarcasmo nos diálogos dessas pessoas. É um livro para reflexão sobre a vida, a sociedade em que vivemos e a incapacidade para escapar das eventuais armadilhas com que nos deparamos ao longo da existência. É impossível não ter um envolvimento emocional com os personagens.

“Vernônia” é um ótimo livro. Um livro que foi recusado por treze editores com a justificativa de que ninguém queria ler sobre vagabundos. Graças aos protestos do ex-professor de William Kennedy, o Prêmio Nobel Saul Bellow que a Viking Press publicou a obra. Os outros editores devem ter ficado bem aborrecidos com o resultado: o Pulitzer, Prêmio da Fundação MacArthur entre outras honrarias, como a adaptação para o cinema em 1987 – roteiro do próprio Kennedy e direção de Hector Babenco. 

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