quinta-feira, 16 de março de 2023

CAMINHOS PAULISTANOS

 

Quantas vezes escolho um novo caminho e logo me canso; penso em um ônibus, em como teria sido bom ter escolhido outro roteiro, quem sabe, mais curto... Descobri, recentemente, que vários podem ser os motivos dessas sensações. Pode não se tratar de um caminho longo, mas não dispor de atrativos.  Ruas com um comércio agitado, muitas portinhas; ruas com casas ajardinadas e fachadas diferenciadas ou iguais, porém, coloridas e atraentes, e gente se movimentando para lá e para cá em seus afazeres ou ócios, tudo isso contribui para a sensação de que o caminho é mais curto e agradável. O caminhante não se cansa, seus olhos não param e sua mente vai recolhendo as informações, tecendo uma rede sutil que reduz o tempo, o espaço e mexe com sua imaginação.  

            Gosto de mudar de caminho, ver coisas diferentes, mas faço alguns com regularidade e, frequentemente, descubro pormenores novos ou coisas surpreendentes – como sapatos esquecidos nas calçadas, um jogo de amarelinha cheio de graça, um galo enfrentando um cãozinho, uma pedra gigante no caminho, passarinhos que nos olham desconfiados... sem contar as flores que atapetam o caminho. Nas casas, o encanto pode estar no pequeno jardim, no portão onde um cão faz seu papel de guarda e dá uns latidos nada ameaçadores ou na arquitetura simples que lembra outras épocas. E as lojas de rua tão simpáticas? Lojas de rua são um atrativo à parte e suas vitrines expõem, além dos produtos, a imaginação do dono. Ali fica o Bar do Zé Quebrado, que também é restaurante. Quebrado física ou economicamente?

Numa esquina, o rapaz distribui folhetos anunciando o novo café que funciona na garagem de uma casa antiga – um espaço simpático que também tem restaurante. Prometo voltar à tarde. Outra esquina. Um senhor me pergunta onde fica a lotérica. Explico que não conheço bem a região. Quando chego às imediações da Praça João Mendes, uma senhora me aborda: quer saber onde fica a Avenida Rio Branco. Ih! Muito longe. Explico que o endereço é nos Campos Elíseos e, por acaso conheço um ônibus que passa ali perto e vai até lá. Mal eu paro no farol para atravessar a rua, vejo ao meu lado o jovem – deve ter uns 20 anos, usa camiseta (que já foi branca, mas está entre o cinza e o preto), bermuda surrada e calça havaianas. Ele também quer uma informação: onde é a rua Vinte e Cinco de Março. Disse que era longe e apontei para a Praça da Sé: “atravessa a praça e lá na frente desce a Ladeira General Carneiro...” Mas nem continuei porque ele achou o lugar perigoso. O semáforo ainda estava no vermelho, quando ele perguntou se o prédio “ali atrás” era da polícia. Eu comecei a responder: “É (olhei para o semáforo e me voltei para concluir) o Tribunal de Justiça”. Mas ele se deu por satisfeito ou ficou preocupado com o É e desapareceu.

Enfim, verde para pedestres e eu me pus a caminho...Nem sinal de chuva. Uma ótima quinta-feira, a penúltima deste verão.

Os pássaros, de Felícia Lerner, Praça da Sé.

Praça João Mendes.


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