segunda-feira, 20 de agosto de 2018


O JORNALISTA BILLY WILDER

Houve um tempo em que ninguém se importava muito com diretores de filmes. As pessoas iam ao cinema pelos atores, que eram uma grande atração, embora não fizessem milagre para salvar roteiros ruins e muitas vezes se viam envolvidos em fracassos de bilheteria. Se muita gente não sabe quem é Billy Wilder (1906-2002), com certeza assistiu a pelo menos dois ou três dos seus ótimos filmes. Só para citar alguns: “A montanha dos sete abutres” (Kirk Douglas), “Crepúsculo dos Deuses” (William Holden/Gloria Swanson), “Se meu apartamento falasse” (Jack Lemmon/Shirley MacLaine), e “Quanto mais quente melhor” (Tony Curtis, Jack Lemmon/Marilyn Monroe). Para que mais?
Dia desses pesquisando a prateleira de cinema da Biblioteca Sergio Milliet vi uma biografia dele, que li há muito tempo e resolvi reler: “Billy Wilder e o resto é loucura”, de Hellmuth Karasck. São Paulo, DBA – Dórea Books and Art, 1992.
O premiado Billy Wilder.
Billy Wilder nasceu na Galícia, em uma cidade que fazia parte do império austro-húngaro, mas atualmente é território polonês. Aos 19 anos mudou para Viena com o objetivo de ser jornalista. Sem conhecer ninguém, percorreu redações em vão até que abriu a porta certa na hora errada e conseguiu o posto de repórter. (Surpreendeu o crítico de teatro com uma senhora num canapé.) O jornalismo, entretanto, não lhe proporcionou o mundo de aventuras que imaginou e muito menos remuneração decente. Depois tentou Berlim, onde para complementar o salário tornou-se dançarino profissional em um café. Aproveitou a experiência para escrever uma reportagem sobre o assunto. Aliás, era um redator muito bom e criativo, que já revelava o roteirista que existia nele.
Na entrevista com Karasck conta que, se não dançava tão bem quanto os colegas, com certeza era dono dos melhores diálogos. E conta que durante uma valsa lenta, após pedir permissão, ele pergunta:
Sabe o que a senhora me lembra?
Não.
Não tenho coragem de dizer!
Diga!
Um magnífico suflê.
Um suflê?
Preparado por anjos. Numa varanda do Mediterrâneo. Extremamente delicado, recheado de iguarias divinas.
O senhor está me dando fome.
O bom nesse emprego é que além do parco salário e de boas gorjetas, ele podia comer à vontade.
Até descobrir o cinema muita água rolou, mas graças ao seu talento e com esforço ele conheceu o sucesso em Berlim, ganhou dinheiro até que o bando de malfeitores assumiu o poder e Billie Wilder teve que deixar tudo para trás (inclusive documentos) e partir para Paris, onde recomeçou do nada. A mudança seguinte foi para os Estados Unidos. O convite partiu de um amigo alemão, que já fazia sucesso por lá, e enviou um telegrama com uma lista de pedidos rocambolescos: “No Prunier da Avenue Victor Hugo bebi vinho de Anjou da safra de 1926. O preço na carta era de dezesseis francos. Traga 120 garrafas. Dê meu endereço ao proprietário para o caso de pedir uma nova remessa stop Aqui não sabem o que é bidê por isso traga três belos bidês, alem de duas peneiras para espinafre. Encomende logo três camisas de fraque como de costume no Knize a fim de poder trazê-las stop Zama ajudará a arranjar passagens de navio mais baratas”.
Claro que Billy Wilder não levou nada: não tinha dinheiro para as camisas e o vinho, quanto aos bidês sugeriu que o amigo tomasse banho de cabeça para baixo. O início da carreira em Hollywood também não foi fácil, mas tinha talento de sobra para conquistar seu lugar ao sol. 
Assisti a muitos filmes dele e o único de que não gostei foi “Romance na tarde”, mas “ninguém é perfeito”.

Joe E. Brown e J. Lemmon: "Ninguém é perfeito."

Tony Curtis, Marilyn Monroe e Jack Lemmon 
em "Quanto mais quente melhor", 1953.

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