segunda-feira, 3 de agosto de 2020

UMA VIDA POR UM FIO

Clássicos não têm idade. É o caso do filme noir dirigido por Anatole Litvak (1902-1974) em 1948 e que rendeu à atriz Barbara Stanwyck uma indicação ao Oscar. O título em português é perfeito. Muito melhor que o original, “Sorry, wrong number”. A roteirista Lucille Fletcher (1912-2000­) adaptou o texto de um programa de rádio que escreveu em 1943, protagonizado por Agnes Moorehead (1900-1974).


Logo na abertura do filme veem-se as telefonistas em suas mesas de operação enquanto se lê a explicação de que “Nas entrelaçadas redes de comunicação de uma grande cidade, o telefone é o elo invisível entre milhares de vidas... É o servidor de nossas necessidades comuns. O confidente de nossos segredos mais ocultos. Vida e felicidade aguardam do outro lado da linha, horror e solidão... e morte!”

 
    O enredo é bem simples: a milionária Leona Stevenson
(Stanwyck) está doente e fica sozinha em casa quando o marido se atrasa e a enfermeira faltou ao serviço. Assim, só lhe restam o telefone, o rádio e os cigarros sobre a mesinha de cabeceira, onde se encontra também um retrato do casal. Quando ela pede à telefonista uma ligação para o escritório do esposo (3-5097), as linhas se cruzam e ela ouve dois homens combinando um crime. Após desligar, ela avisa a polícia em vão, porque suas as informações são vagas. Enquanto tenta, desesperadamente, localizar o marido, vamos conhecer o passado dela e o que ele, de origem pobre, anda fazendo desde que se conheceram. À medida que a narrativa se desenvolve, mistério, medo e angústia vão crescendo até o insuportável já que não tem condições de se locomover.

     

Quando se revê um filme ou se relê um livro, sempre descobrimos algo mais. Neste filme, 72 anos depois o telefone ganha ainda mais destaque na história. Para as novas gerações acostumadas com as facilidades dos aparelhos celulares e, portanto, muito mais conectadas, deve ser bem estranho observar como funcionavam os velhos telefones e o terror vivido pelo personagem de Barbara Stanwyck.

       Na primeira metade do século passado, as ligações ainda eram feitas através de telefonistas que de uma mesa telefônica faziam as conexões solicitadas pelo assinante. Se X queria telefonar para Y, ligava para a telefonista que completava a ligação. A privacidade era tênue. No decorrer do filme quase todos os personagens estão ao telefone e a cada telefonema que fazem chamam por elas. Nos telefones públicos, as telefonistas interrompiam as conversas para que o usuário colocasse mais moedas no aparelho quando o valor da chamada estava chegando ao fim.

     Lembro-me que em Santos, nos anos 1950, as chamadas interurbanas ainda eram feitas por meio de telefonistas e demoravam horas para ser realizadas. A era dos telefones fixos está chegando ao fim.

Agnes Moorehead ficou famosa como a bruxa Endora, mãe de Samantha (Elizabeth Montgomery) na série “A Feiticeira” (1964-1972).


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