DONA YAYÁ
(Casas paulistanas)
O século XIX estava
terminando e São Paulo ainda era um vilarejo que mal ultrapassava o rio
Anhangabaú. A Rua Major Diogo (Bela Vista) era área rural. Nesse lugar, duas
histórias se entrelaçam na memória paulistana e elas dariam um ótimo enredo nas
mãos de um novelista. A primeira história está relacionada com a fuga das
pessoas ricas para regiões mais afastadas da cidade em busca de tranquilidade.
Caso de Afonso Augusto Roberto Milliet que em 1888 comprou de José Maria
Talon um terreno com mais de 30 mil
metros quadrados, com fundos para o córrego do Bixiga, formador do rio
Anhangabaú. Nessa área, Talon havia construído um chalé de quatro cômodos, que
Milliet incorporou à bela residência de treze cômodos que mandou construir. Historiadores
acreditam que foi Milliet quem deu a configuração atual à casa, que era quase
toda rodeada por um alpendre.
Mas em 1902 a urbanização
já atingira a chácara, que então foi vendida para João Guerra, um abastado
comerciante de secos e molhados. O terreno, entretanto, já estava reduzido 22
mil m². Novas reformas deram ao prédio um estilo mais sofisticado ou como dizem
neoclássico tropical, com mais
afrescos recobrindo as paredes dos diversos aposentos, como os restauradores
descobriram.
Na terceira década do
século XX, surge no bairro a principal personagem da história. Sebastiana de
Mello Freire, a Dona Yayá. Ela nasceu em 21 de janeiro de 1887. Era filha de
Josefina Augusta de Almeida Mello e Manoel de Almeida Mello Freire, senador
estadual e deputado constituinte, que tinha 53 anos quando ela nasceu. O
casal teve outros três filhos.
As desditas na família de
Sebastiana começaram cedo. Uma das irmãs morreu aos três anos, asfixiada pela
ingestão de um objeto, quando estava no berço. A outra faleceu aos 13 anos, vítima
do tétano depois de espetar-se no espinho de uma árvore. Quando Sebastiana
estava com 12 anos, os pais adoeceram e morreram no intervalo de dois dias em
locais diferentes e sem que soubessem da doença um do outro.
Albuquerque Lins, que
mais tarde viria ser presidente do Estado de São Paulo, tornou-se tutor de
Sebastiana e de Manuel de Almeida Mello Freire Junior, o irmão de 17 anos,
herdeiros de uma grande fortuna. No início dos anos vinte, a jovem foi morar na
casa da Rua Major Diogo agora em um terreno de 2.500 m². Há indícios de que
primeiro morou como inquilina, pois a compra do imóvel só foi efetivada em
1925.
A vida parecia
transcorrer normalmente para Dona Yayá, quando a doença mental se manifestou.
Ela estava com 32 anos. A riqueza lhe garantiu a assistência médica de que
necessitava. Na residência moravam, além de Dona Yayá, numerosa criadagem, o
enfermeiro, a amiga Eliza Grant e a prima Eliza de Mello Freire.
A casa foi reformada
algumas vezes para que ela tivesse conforto adequado as suas condições. O salão
central transformou-se no dormitório dela: os papéis de parede foram removidos
e os afrescos recobertos com tinta esmaltada de cor neutra e de fácil limpeza,
talvez em decorrência de certa característica do comportamento da paciente. Para
evitar que ela se machucasse durante os acessos de fúria, muitas adaptações
foram feitas: o banheiro não tinha torneiras e as janelas dos cômodos que ela
ocupava foram especialmente projetadas pelo médico Juliano Moreira – eram
inquebráveis e só se abriam do lado de fora. Em 1952 foi construído o solário.
Sebastiana de Mello Freire aos 23 anos. |
Após alguns anos sem uso
definido, finalmente, o prédio foi escolhido para sediar o Centro de Preservação
Cultural da USP – CPC. Casa de Dona Yayá.
Deve ser meio dia e o jardim cheio de árvores é bem convidativo para uma
pausa. O imóvel pertence à Universidade
de São Paulo e ali funciona, desde 2004, o Centro de Preservação Cultural, que
substituiu a antiga Comissão de Patrimônio Cultural.
Casa de Dona Yayá: Rua Major Diogo, 353, Bela Vista, São Paulo.
Horário de visitação: das 10 h às 16 h. A entrada é gratuita.
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