quinta-feira, 29 de março de 2018

UM BAIRRO MUITO ESPECIAL


Lago do Parque da Aclimação. Foto. Hilda Araújo, 2018. 
Morar na Aclimação é um privilégio. É um bairro residencial, mas com serviços e comércio básicos, que facilitam a vida dos moradores – mercadinhos, farmácia, lavanderias, lanchonetes e restaurantes (para todos os bolsos); salões de barbeiro e cabeleireiro – para pets também. Não faltam as feiras. O transporte público é bom (salvo fim de semana); a região é bem servida de escolas públicas e privadas. As ruas são arborizadas e floridas, muitas terminam em pracinhas acolhedoras (algumas nem tanto). Como está situado em um morro, as ruas cheias de aclives e declives e curvas enganadoras são armadilhas para os estranhos ao bairro. Muitas vezes escadarias ajudam a transpor a diferença de nível entre ruas. Uma das escadarias entre Rua Nicolau Souza Queirós e a Rua Armando Ferrentini, por exemplo, tem 104 degraus.
Como a organização dos serviços públicos em geral em São Paulo não é sistematizada, para alguns serviços os moradores se reportam à administração da Sé, para outros da Vila Mariana embora pertença realmente ao distrito da Liberdade. Nos últimos anos tem mudado bastante porque o parque da Aclimação e a qualidade de vida da região têm atraído os empreendimentos imobiliários de alto padrão e as belas casas estão desaparecendo. As torres brotam em velocidade espantosa.
As casas foram demolidas, substituídas por duas torres.
Os moradores que fazem parte do meu cotidiano transbordam simpatia. Da maioria nem sei o nome, mas de outros até conheço os dramas e comédias porque adoram falar de si. José e Jaime vejo assim que saio de casa – são taxistas do ponto que fica bem ao lado do prédio. Depois pode ser seu Damião – indo para a padaria ou para a banca de jornal. Francisco é o proprietário da banca, conhece o bairro como ninguém. Todos nordestinos. Carminha é a senhora mais elegante do bairro: está sempre impecável. Adora conversar e já quase morri de insolação ouvindo seus percalços e as pechinchas descobertas. Isaías, síndico e zelador de prédio, cuida da praça como se fosse seu quintal. Ganho abraço carinhoso de Gabriel, gerente de uma imobiliária, velho conhecido dos cafés matinais na Padaria Dengosa que deu lugar a uma farmácia.
Há duas lavanderias na esquina de casa, mas prefiro subir a ladeira e deixar a roupa na lavanderia de seu Carlos, dono de conversa inteligente e saborosa, desfrutando agora a alegria de ser avô. Lá vem o Paulinho, sempre elegante na sua magreza histórica. Quer me convencer a frequentar o Bom Prato. Agradeço. “A comida é muito boa” – diz ele. Acredito. Um dia, quem sabe... 
“Bom dia, menina! Paz e alegria!” Esse é o bordão de Paulo, dono da banca de outra esquina. Rodeado de notícias não poderia deixar de ser bem informado (como Francisco do outro lado). Já abandonou por um tempo a vida de jornaleiro – que ele considera profissão de interesse público porque dá todo tipo de informações aos clientes e passantes – pela de caminhoneiro, quando percorreu o Brasil todo. Agora, pensa em voltar para o Ceará. Será? Há muitos outros, mas o espaço é pequeno. Fico devendo. Continua.

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