quarta-feira, 12 de outubro de 2022

DIA DA AMÉRICA, DIA DE COLOMBO.

 “Um espírito malicioso definiu a América como uma terra que passou da barbárie à decadência sem conhecer a civilização. Poder-se-ia, com mais acerto, aplicar a fórmula às cidades do Novo Mundo: elas vão do viço à decrepitude sem parar na idade avançada. Uma estudante brasileira voltou-me em lágrimas após sua primeira viagem à França: Paris lhe parecera suja, com seus prédios enegrecidos. A brancura a limpeza eram os únicos critérios à sua disposição para apreciar uma cidade. Mas essas férias fora do tempo a que convida o gênero monumental, essa vida sem idade que caracteriza as mais belas cidades, transformadas em objeto de contemplação e de reflexão, e não mais em simples instrumentos da função urbana – as cidades americanas nunca chegam a tal. Nas cidades do Novo Mundo, seja Nova York, Chicago ou São Paulo, que muitas vezes lhe foi comparada, o que me impressiona não é a falta de vestígios: essa ausência é um elemento de seu significado. Ao contrario desses turistas europeus que torcem o nariz porque não podem acrescentar a seus troféus de caça mais uma catedral do século XIII, alegro-me em me adaptar a um sistema sem dimensão temporal, para interpretar uma forma diferente de civilização. Mas é no erro contrário que caio: já que as cidades são novas e tiram dessa novidade sua essência e sua justificação, custo a perdoá-las por não continuarem a sê-lo. Para as cidades europeias, a passagem dos séculos constitui uma promoção; para as americanas, a dos anos é uma decadência. Pois não são apenas construídas recentemente; são construídas para se renovares com a mesma rapidez com que foram erguidas, quer dizer, mal.”

“São Paulo” – in “Tristes Trópicos” (1955), do antropólogo Claude Lévi-Strauss (1908-2009). Claude Lévi-Strauss lecionou na recém-criada Universidade São Paulo de 1935 a 1936 e não achou São Paulo uma cidade feia.

Foto: UNESCO/Michel Ravassard.

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