Tremembé. Ponto de ônibus
cheio. Perguntei a uma senhora qual ônibus ia para a estação Tucuruvi do metrô.
Prestativa, ela deu a informação e todas alternativas e logo subiu em outro
ônibus. O velhinho sentado no banco ouvia atentamente a conversa e resolveu me
ajudar, explicando tudo de novo. Enfim, o coletivo chegou, embarcamos e ele se
aboletou do meu lado, decidido a continuar falando. Suspirei conformada;
entretanto, para minha surpresa, ele transformou a viagem pelo Tremembé em um
passeio turístico muito interessante.
“Aqui, havia só chácaras.” Ele aponta as casas e explica que toda a área pertencia à Dona Maria Amália Lopes de Azevedo, que dá nome à avenida por onde o ônibus trafega, e que antigamente “era uma estrada de terra onde só passava carro de boi.” O avô tinha chácara, plantava verduras que vendia na feira e de porta em porta. “Ali era a linha do trem que ia para Guarulhos.” (Creio que ele se refere ao Tramway da Cantareira) O pai dele era maquinista, conta e indica um ponto qualquer à esquerda onde se situa um hospital que não vejo. “O último vagão branco com uma cruz vermelha, em que vinham os doentes, era deixado no pátio do leprosário.” (Trata-se do Hospital Municipal São Luis.) Meu cicerone não para de falar. “Mais adiante tinha um riozinho onde eu vinha pescar quando era garoto, mas agora é só esgoto.” Não escapa nem a caixa d’água da SABESP.
Passamos
por uma quadra onde houve um grande convento e, embora as velhas irmãs tenham
resistido a vender a propriedade, as novas freiras não hesitaram em lotear a
área, segundo meu guia, que usa palavras pouco cristãs para definir as
religiosas. “Ali, mora minha prima que ficou viúva há um ano” – ele mostra uma
bonita casa de esquina. O ônibus sobe e desce, vira aqui e ali. “Casei nesta
igreja, minha esposa é muito religiosa, e viemos morar numa destas casas em
frente, mas não reconheço qual delas por causa das reformas que desfiguraram
tudo.”
O tour pelo
Tremembé vai chegando ao fim. O guia incidental se despede – vai comprar um
presente de casamento. No meio da conversa, disse que está com 74
anos e vive bem com a pequena aposentadoria porque precisa de pouco para viver.
Detesto a conversa com estranhos que se sentam ao meu lado em conduções e
resolvem contar suas vidas entre um ponto e outro de ônibus; este encontro,
entretanto, foi muito agradável e me ajudou a enfrentar a tristeza da despedida
de um amigo que partiu muito cedo. (2015)
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