CURIOSIDADES DO CARNAVAL DE 1945
O carnaval de 1945 caiu também nos dias 11/12 e 13 de fevereiro. O Brasil
estava envolvido na II Guerra Mundial e 25.334 brasileiros lutavam na Itália
sob um frio fora do comum que assolava a Europa ferida nas batalhas contra o
nazismo. Os Aliados, com a participação dos soldados da Força Expedicionária
Brasileira (FEB), estavam envolvidos havia três meses na luta sangrenta pela
tomada de Monte Castelo, situado entre a Toscana e a Emilia.
Enquanto o Regimento Sampaio enfrentava o inimigo, alguns brasileiros
aproveitaram para entrar em outro campo de batalha, minando o inimigo interno (a
ditadura Vargas) com uma arma poderosa e sutil: a música de carnaval. Com a
implantação do Estado Novo em 1937 e a intensificação da censura falar mal do
governo não fazia bem à saúde de ninguém; entretanto, o engajamento do Brasil na
política de boa vizinhança dos Estados Unidos e o ataque alemão à marinha
mercante brasileira criaram um clima propício para a defesa dos ideais
democráticos. Sob o pretexto de defender a democracia alhures, atacava-se indiretamente
a ditadura aqui. A formação da FEB consolidou essa posição.
Novamente, compositores e cantores traziam para as ondas do rádio assuntos
políticos. No dia 6 de março de 1943, por exemplo, Almirante (Henrique Foreis Domingues) avisava a seus
ouvintes da rádio Tupi: “Boa noite, ouvintes de todo o Brasil. Eu só venho aqui
tomar uns minutos deste programa de Erik Cerqueira, para falar a vocês de uma
certa arma de guerra, de que o carioca vai lançar mão neste carnaval, que
começa esta noite: a música popular. (...) As cantigas de carnaval deste ano
serão como as trombetas dos cariocas, para deitar por terra as muralhas de
ridículo e as bazófias das nações do eixo.” Almirante referia-se à passagem
bíblica sobre as muralhas de Jericó.
E a produção foi
grande. Só nesse programa foram apresentadas sete músicas e entre elas: “Que
passo é esse, Adolfo?” (Haroldo Lobo e Roberto Roberti; gravação: Aracy de
Almeida); “Adolfito mata mouros” (João de Barro e Alberto Ribeiro; gravação:
Orlando Silva); e “Quem é o tal”, (Ubirajara Nesdan e Afonso Teixeira; gravação:
João Petra de Barros).
A FEB chegou à Itália em três etapas e o primeiro grupo foi para a frente
de batalha em setembro de 1945. Meses depois alguns pracinhas (como eram
chamados os soldados brasileiros) deram um descanso à “lurdinha” (como chamavam
a metralhadora) e também pegaram lápis e papel e mataram saudade do Brasil
compondo músicas. Nada de insensibilidade nisso. Apenas uma forma de enfrentar a
insanidade da guerra.
Por sorte Francis Wallawell (Chico BBC), um gaúcho que trabalhava na BBC em
Londres, fez uma série de reportagens com as tropas brasileiras, gravando
várias composições, algumas feitas depois da tomada de Monte Castelo e após o
carnaval. O soldado Natalino Cândido da Silva compôs a embolada “Sinhá Lurdinha”
e “Pro brasileiro, alemão é sopa”. O cabo José Pereira dos Santos é autor e
intérprete da marcha “Tedeschi, portare
via”. O terceiro sargento Roldão Alves Gutenberg compôs a marcha “Parabéns
à FEB”, interpretada pelo terceiro-sargento Seraphim José de Oliveira. E por aí
vai...
Entre tantas escolhi a narração da batalha de feita pelo soldado Natalino
Cândido da Silva e as loas feitas ao Cabo Laurindo, um personagem que aparece
em três composições em homenagem aos pracinhas.
SINHÁ, LURDINHA
Soldado Natalino Cândido da
Silva
Mas onde eu vi muito tedesco
Foi lá no monte de Castelo
Mas onde eu vi muito tedesco
Foi lá no monte de Castelo
Mas onde eu vi muito tedesco
Foi lá no monte de Castelo
Subindo ao monte
Eu encontrei Sinhá Lurdinha
Tava toda afobadinha
Querendo me pegar
Joguei-me ao solo
E comecei a rasteja-la
Farejava, farejava
Mas nada de me encontrar
Mas onde eu vi muito tedesco…
Logo em seguida
Vinha o tal de 88
Que também todo afoito
Queria me acertar
Mas eu também que conduzia o meu 60
Fui metendo a mão nas venta
88 eu fiz calar
Mas onde eu vi muito tedesco…
O 105 que atirava com afinco
E era quatro e era cinco
Nossa tropa avançava
A aviação que causou grande confusão
Pois cada vez que se abaixava
Era um ovo que deixava
Mas onde eu vi muito tedesco…
Major Syzeno também fez a sua guerra
Com a conquista de La Serra com todo seu batalhão
E foi a quarta, e foi a quinta e foi a sexta
E até mesmo a CPC(?), 81 em posição
Mas onde eu vi muito tedesco …
O que valeu foi que a sexta tinha morteiro
Comandava o Carneiro com boa disposição
E cada vez que o morteiro atirava
A granada estourava, era só pena que voava
Mas onde eu vi muito tedesco…
CABO LAURINDO
Haroldo Lobo e
Wilson Batista
Gravação: Jorge Veiga.
Laurindo voltou,
Coberto de glória.
Trazendo garboso no peito
A cruz da vitória.
Mas Salgueiro, Mangueira, Estácio e Matriz estão aquiPara homenagear o bravo cabo Laurindo.
As duas divisas que ele ganhou, mereceu.
Conheço os princípios que Laurindo sempre defendeu.
Amigo da verdade,
Defensor da igualdade,
Dizem que lá no morro vai haver transformação.
Camarada Laurindo,
Estamos a sua disposição!