domingo, 16 de fevereiro de 2020

A GUERRA DAS LARANJINHAS PERFUMADAS



Jean-Baptiste Debret (1768-1848) registrou várias cenas do carnaval ou entrudo. Nesta aquarela sobre papel (1823), a mulher sentada à porta tem um tabuleiro cheio de laranjinhas, enquanto o garoto usa uma bisnaga para esguichar a água nos passantes. Dos escravos ao imperador, todos se envolviam na brincadeira.

Trecho de lembranças do advogado, professor e político Jorge Americano (1861-1969) sobre o Carnaval.

Conversavam em nossa casa em 1900:
‒ Mas é incrível como permitiam aquilo. A gente passava um mês ou dois fazendo laranjinhas de cera em forminhas. Enchia d’água perfumada e esperava na janela os conhecidos que passavam.
‒ As pessoas vinham suadas, não sei como não havia pneumonias.
‒ Isso não é nada. Quando as laranjinhas acabavam, iam-se buscar copos d’água. Depois, regadores. Depois baldes d’água. Depois dava aquela loucura, os rapazes saíam pela rua e pegavam qualquer que passasse, traziam-no à força e jogavam dentro de uma tina ou tanque cheio de água. Não sei como não saiam brigas horrorosas.
‒ Às vezes saíam. Foi bom que a polícia proibisse. Proibidas também as laranjinhas, só ficaram as bisnagas. Afinal, uma bisnaga feita em chumbo esguicha um borrifo de água, que não faz mal.
‒ Você já viu o lança-perfume? É uma bisnaga nova, de vidro, que não precisa espremer. Basta comprimir a mola, que o éter jorra e seca imediatamente.

“SÃO PAULO NAQUELE TEMPO (1895-1915). Edição Saraiva, São Paulo, 1957.

Nenhum comentário: