Botica, aquarela de Jean-Baptiste Debret (1768-1848,
acervo Museu Castro Maya, Rio de Janeiro.
Quando arrumaram
os baús para a viagem ao Brasil a fim de catequizar os nativos, que até então
eram felizes e não sabiam, os jesuítas providenciaram também a arca com os
remédios. À medida que os portugueses prosseguiam na colonização das novas
terras, chegaram profissionais em busca de fama e fortuna (mais fortuna do que
fama) e entre eles os boticários, como eram então chamados os farmacêuticos. Estavam
longe de ter o prestígio do médico, que encabeçava a hierarquia da área da
saúde na época, especialmente porque trabalhavam com as mãos, o que era vultar,
na perspectiva da metrópole. Curiosamente a maioria compunha-se de cristãos
novos, fugitivos da Inquisição ou deportados pelos tribunais do Santo
Ofício.
Os boticários preparavam os remédios
(medicinas) e comercializavam plantas medicinais, pós e elixires. Em geral, o
laboratório e a botica funcionavam junto à residência deles. Se você lamenta o
preço alto dos remédios, fique sabendo que essa queixa já se fazia nos tempos
coloniais. A historiadora Vera Regina Beltrão Marques diz que embora a
matéria-prima fosse abundante na Colônia, as plantas medicinais eram importadas
de Portugal. “O preço cobrado pelos remédios, considerado muitas vezes
exorbitante, somado ao preconceito contra os judeus, rendeu aos boticários a má
fama de ladrões.”
A
historiadora conta que o sucesso dos boticários era restrito às grandes
cidades, pois nas vilas afastadas e na zona rural, a população preferia
medicamentos caseiros. Na verdade, desenvolveu-se uma farmácia nativa e rústica
praticada por benzedeiras, garrafeiros e curandeiros, que concorria com a
portuguesa (europeia). Em 1648 foi publicado em Amsterdam o primeiro inventário
da flora e dos saberes indígenas, organizado pelo médico Guilherme Piso e pelo
astrônomo e cartógrafo Jorge Marcgrave: “História natural do Brasil ilustrada”.
Os autores eram membros da comitiva do príncipe Mauricio de Nassau, que
governou Pernambuco (1637-1644).
Quando o caso exigia um vomitivo ou
expectorante, os nativos brasileiros usavam a raiz de poaia (Cephaelis ipecacuanha), com a qual
também combatiam a disenteria. Um médico francês levou-a para a Europa em 1672,
mas o reconhecimento de suas qualidades só aconteceu quando o rei Luis XIV a
usou com sucesso (não se sabe se o rei sol estava com disenteria). Nada como um
rei esclarecido, pois Oliver Cromwell (1599-1658), político e religioso inglês,
morreu de impaludismo por ter se recusado a se tratar com a Cinchona ledgeriana ‒ a quina, um
“medicamento jesuíta”, pois foi o padre espanhol Calancha que divulgou a planta
americana no Velho Mundo. A quina continua até hoje indispensável no combate à
malária.
Fonte: NOSSA HISTÓRIA, Editora VEra Cruz, RJ, julho de 2005.
Fonte: NOSSA HISTÓRIA, Editora VEra Cruz, RJ, julho de 2005.
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