Eu durmo e vivo ao sol como
um cigano,
Fumando meu cigarro vaporoso,
Nas noites de verão namoro estrelas,
Sou pobre, sou mendigo e sou ditoso!
Ando roto, sem bolsos nem dinheiro;
Mas tenho na viola uma riqueza:
Canto à lua de noite serenatas...
E quem vive de amor não tem pobreza.
Fumando meu cigarro vaporoso,
Nas noites de verão namoro estrelas,
Sou pobre, sou mendigo e sou ditoso!
Ando roto, sem bolsos nem dinheiro;
Mas tenho na viola uma riqueza:
Canto à lua de noite serenatas...
E quem vive de amor não tem pobreza.
Não invejo ninguém, nem ouço a raiva
Nas cavernas do peito, sufocante,
Quando, à noite, na treva em mim se entornam
Os reflexos do baile fascinante.
Nas cavernas do peito, sufocante,
Quando, à noite, na treva em mim se entornam
Os reflexos do baile fascinante.
Namoro e sou feliz nos meus amores,
Sou garboso e rapaz... Uma criada
Abrasada de amor por um soneto,
Já um beijo me deu subindo a escada...
Oito dias lá vão que ando cismando
Na donzela que ali defronte mora...
Ela ao ver-me sorri tão docemente!
Desconfio que a moça me namora...
Tenho por meu palácio as longas ruas,
Passeio a gosto e durmo sem temores...
Quando bebo, sou rei como um poeta,
E o vinho faz sonhar com os amores.
O degrau das igrejas é meu trono,
Minha pátria é o vento que respiro,
Minha mãe é a lua macilenta
E a preguiça a mulher por quem suspiro.
Escrevo na parede as minhas rimas,
De painéis a carvão adorno a rua...
Como as aves do céu e as flores puras
Abro meu peito ao sol e durmo à lua.
Sinto-me um coração de Lazzaroni*,
Sou filho do calor, odeio o frio,
Não creio no diabo nem nos santos...
Rezo a Nossa Senhora e sou vadio!
Ora, se por aí alguma bela
Bem dourada e amante da preguiça,
Quiser a nívea mão unir à minha
Há de achar-me na Sé, domingo, à missa.
*Os pobres de Nápoles.
A história de um vagabundo contada em quadras e com bom humor pelo escritor romântico paulista Manoel Antônio Álvares de Azevedo (1831 -1852).
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