quarta-feira, 6 de junho de 2018

ERA UMA VEZ UMA AVENIDA....

Joaquim Eugênio de Lima (1845-1902) radicou-se em São Paulo em meados da década de 1860; era formado em agronomia na Alemanha e, na capital paulista dedicou-se ao ramo imobiliário. Como bom profissional, ele observou que a cidade crescia em direção ao morro do Caaguassu (mata virgem), subindo pelo Caminho de Carro de Santo Amaro (atual Rua da Liberdade) e pelo Caminho de Pinheiros ou Rua Nossa Senhora da Consolação. Joaquim Eugênio de Lima viu mais que mato, vislumbrou um ótimo negócio no topo do morro de 844 metros de altura, que além de tudo era largo e reto. Como ponto mais alto da região oferecia uma vista bonita e ainda atendia aos ideais do higienismo então em moda. Ele pensou grande: imaginou uma avenida reta com trinta metros de largura e 2.500 metros de comprimento, destinada aos muito ricos. 

A ideia começou a se concretizar: arranjou dois sócios e em 1890 iniciaram a compra dos terrenos para implantação do projeto, que tinha espaço reservado para um parque e um belvedere com vista para o vale do riacho Saracura (atual Avenida Nove de Julho). A nova avenida, que terminava na descida em direção ao riacho Pacaembu, foi inaugurada em 1891 já com uma linha de bondes, mas sem nenhuma casa. Para o jornalista Roberto Pompeu de Toledo[1], a Avenida Paulista foi uma das duas obras “que podem ser consideradas as mais marcantes e decisivas do período de transição entre a Monarquia e a República em São Paulo”. A outra foi o Viaduto do Chá.



[1] “A Capital da Solidão”, Roberto Pompeu de Toledo.

No início do século XX, os palacetes floresciam no antigo Caaguassu e começavam a chegar os moradores. Para surpresa geral, os cafeicultores não eram a maioria. Estavam chegando as famílias de imigrantes bem sucedidos na indústria e os sobrenomes italianos se destacavam entre árabes, espanhóis e alemães. A primeira família a marcar presença foi a do cervejeiro dinamarquês Von Bülow, que chegou em 1895. O segundo morador, ninguém menos que Francisco Matarazzo e logo depois todos os outros. Mais tarde chegaram os imigrantes árabes: Racy, Calil, Abadallah, Salem... 

O belvedere da Paulista, que recebeu o nome de Trianon, foi inaugurado pelo prefeito Washington Luís em 1916. O projeto do escritório de Ramos de Azevedo incluía um prédio de dois andares com bar, restaurante, salão de chá, salão de baile e até um observatório. Só que esse Trianon era no espaço onde hoje se encontra o MASP. Dali via-se o centro da cidade e a serra da Cantareira. 

A Estação do Metrô Trianon-MASP.

O parque do lado esquerdo da avenida só foi criado mais tarde, como uma continuação do Trianon. A tarefa coube ao arquiteto e urbanista inglês Berry Parker (1867-1947)[1]. Parker projetou uma pérgula combinando com o Trianon do outro lado da avenida, deu um jeito na vegetação, abrindo clareiras e podando árvores, mantendo, entretanto, aquele “pedaço de floresta primitiva em sua glória natural”. Foi assim que a Avenida Paulista manteve uma bela amostra da Mata Atlântica, vegetação hoje ameaçada de extinção. Em 1931 o Parque passou a ser chamado de “Siqueira Campos”, mas não funcionou. Os moradores continuaram a chamá-lo de Trianon. E quando o primeiro Trianon foi demolido em 1957 para dar lugar ao Museu de Arte de São Paulo (MASP), a cidade já tinha o outro parque que, embora se chamasse “Siqueira Campos”, para a população continuava sendo Trianon.



[1] Roberto Pompeu de Toledo.


(Observação: Joaquim Eugênio de Lima nasceu no Uruguai, mas era brasileiro.)
Continua.


O MASP substituiu o Trianon original, mas o famoso vão livre manteve a vista para o vale.
Anhanguera, de Brizzolara, em frente ao Trianon.
* A Capital da Vertigem, de Roberto Pompeu de Toledo, Editora Objetiva. 

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