Quando era criança, muitas vezes encontrava sob a porta de casa envelopes
apenas com endereço da casa e sem remetente. Levava para minha avó, que tratava
logo de jogar fora sem abrir. Eu ficava intrigada. “Não vai ler, vovó?” Ela
explicava que se tratava de correntes e, como era supersticiosa, achava que se
abrisse teria que cumprir o castigo de encaminhar várias cópias para outras
pessoas para não ser vítima das ameaças que continha a tal carta.
Mais tarde, quando já estava na escola, entendi muito bem o problema
porque tive que fazer o castigo algumas vezes, pois ela fora enganada por
alguns remetentes espertos ou que eram conhecidos ou tinham se dado ao trabalho
de procurar a vítima na lista telefônica. É, existiam listas telefônicas – uma de
endereço e outra de assinantes. Minha avó lia, mas era eu quem escrevia as
cartas. Pior que castigo de escola: escrevia-se dez, doze vezes a mesma coisa –
uma história de milagre obtido por uma oração que devia ser passada adiante
para que o leitor não seja vítima de coisas terríveis. Nunca entendi.
Gastava-se tempo (reproduzindo as bobagens e indo ao correio) e dinheiro (o
papel, envelope e selo) e eu ainda perdia a paciência.
À medida que o tempo passou não cuidei mais da correspondência de casa porque
os horários não combinavam com o dos carteiros e esqueci completamente das tais
correntes de oração. Coisas de meados do século XX...
Entretanto, para minha grande surpresa, não é que as correntes voltaram?
Modernizadas! Via Internet. Sem selo. Basta copiar e colar e encher a caixa
postal (in box) dos amigos das redes sociais. Assim que vejo que é para divulgar, não
leio, mas percebi que esses anexos variam entre mensagens religiosas e
políticas. Há algumas pedindo compartilhamento para ajudar uma pessoa doente. Como
não leio, ignoro se as religiosas vêm com algum tipo de ameaça se não passar
adiante o recado. Bem, há sempre a ameaça de conter algum vírus. Considero essas
mensagens invasivas e inoportunas. Simplesmente deleto ou denuncio como spam
porque detesto todo tipo de proselitismo.
Faz tempo que
eu queria escrever sobre o fato que me aborrece e exatamente no dia que o faço,
por coincidência, CARTA CAPITAL traz uma matéria sobre o tema, mas erroneamente
situa as correntes como uma novidade da Internet. Bem antes da Internet havia a
Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. E as correntes. Para a
psicóloga entrevistada, o compartilhamento das mensagens de “'boa fé' que infestam as redes sociais faz parte da
criação de uma identidade virtual”. Aviso aos
navegantes: há modos muito mais inteligentes de criar uma “identidade virtual”.
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