Se Paris estava
fervendo há cem anos, no Brasil, uma turma jovem se preparava para pôr fogo na
canjica, ou seja, mexer com a sociedade paulista conservadora e seguidora dos
modismos estrangeiros, aliás, especialmente franceses. Na verdade, o francês
era a língua preferida de intelectuais e de famosos na época. Os jovens
cutucaram a onça com vara curta no sacrossanto Theatro Municipal de São Paulo
(miniatura do Palais Garnier). Em
1922 a sociedade paulistana teve o seu pesadelo de uma noite de verão. Na
verdade, uma semana ‒ de 11 a 18 de fevereiro daquele ano da graça (mesmo) de
1922.
Oswald
de Andrade, Mário de Andrade, Di Cavalcanti, Victor Brecheret, Menotti Del
Picchia, Anita Malfatti, Sérgio Milliet, Manuel Bandeira, Guilherme de Almeida
agitavam a Pauliceia com suas ideias modernistas desde o início da década, mas
foi a chegada de Graça Aranha a São Paulo que deu o impulso para a realização
de um evento que marcasse o movimento de renovação. Quem fez o quê? Difícil estabelecer
os fatos, como demonstra o jornalista Marcos Augusto Gonçalves no livro “1922,
a semana que não terminou”, mas parece que Di Cavalcanti teve a ideia de
promover um salão modernista na livraria onde ele expunha seus trabalhos, o que
coincidiu com as intenções de Graça Aranha, que fez o contado do grupo com
Paulo Prado ‒ neto de Dona Veridiana e filho do Conselheiro Antônio Prado,
enfim, membro de uma das famílias mais ricas e influentes de São Paulo. Numa
das reuniões, a companheira de Paulo Prado sugeriu o formato: uma semana de
eventos, como acontecia em Deauville (França), para lançamento de modas. E o
local teria sido escolha de Paulo Prado, mas coube a René Thiollier, outro
bem-nascido, os contatos para o aluguel do Theatro Municipal.
A Semana de Arte
Moderna foi resultado de um trabalho coletivo e seus protagonistas iniciaram
sob vaias e críticas acerbas as mudanças no cenário cultural brasileiro. Depois da Semana de Arte de Moderna, nada seria como antes ‒ até um suíço
desembarcou em Santos em 1924, se apaixonou por São Paulo e pelos modernistas: Blaise
Cendrars (1887-1961), viajante, escritor e poeta.
Em 1921, São Paulo tinha 579.033 habitantes. (A população do Rio de
Janeiro, capital da República, era de 1.560.000 pessoas.) O Palácio das
Indústrias, no Parque D. Pedro II, ainda estava em construção em janeiro
daquele ano e foi onde Oswald de Andrade, Di Cavalcanti e Hélios Seelinger
(1878-1965) descobriram Victor Brecheret, que lá burilava o “Monumento às
Bandeiras”, e amaram de paixão a modernidade de seu trabalho.
O grande acontecimento da década prometia ser o centenário da
Independência do Brasil e, no Ipiranga, outra obra estava em andamento: o
monumento da Independência, criação do italiano Ettore Ximenes. Para a Avenida
Paulista, aguardava-se o monumento encomendado a William Zadig pelos alunos da
Faculdade Direito para homenagear Olavo Bilac. Os dois monumentos foram
inaugurados em 1922 e não agradaram à população. A obra de Zadig, considerada
muito feia, ainda tinha um francês beijando uma índia seminua, o que agitou os
moralistas de plantão; assim, depois de ser banida de vários lugares da cidade,
foi finalmente desmontada e guardada no depósito municipal. O monumento da
Independência, que Mário de Andrade comparou a “um centro de mesa”, resistiu e
hoje é bastante querido da população. Quanto ao Palácio das Indústrias, hoje cercado por uma paisagem poluída, tornou-se um ponto turístico da cidade e um ótimo centro cultural.
2 comentários:
Estou adorando seus textos sobre os edifícios do centro paulistano. Este, na minha opinião, merece ser compartilhado no Face. O que você acha?
Boa tarde, Nilton. Que bom! Muito obrigada. Fique à vontade para compartilhar, sempre que quiser.
Abraços.
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