sábado, 18 de dezembro de 2021

POEMA DE NATAL

 Vinícius de Moraes (1913-1980).

 

Para isso fomos feitos:

Para lembrar e ser lembrados

Para chorar e fazer chorar

Para enterrar os nossos mortos‒

Por isso temos braços longos para os adeuses

Mãos para colher o que foi dado

Dedos para cavar a terra.

 

Assim será a nossa vida:

Uma tarde sempre a esquecer

Uma estrela a se apagar na treva

Um caminho entre dois túmulos ‒

Por isso precisamos velar

Falar baixo, pisar leve, ver

A noite dormir em silêncio.

 

Não há muito que dizer:

Uma canção sobre um berço

Um verso, talvez, de amor

Uma prece por quem se vai ‒

Mas que essa hora não esqueça

E por ela os nossos corações

Se deixem, graves e simples.

 

Pois para isso fomos feitos:

Para a esperança no milagre

Para a participação da poesia

Para ver a face da morte ‒

De repente nunca mais esperaremos...

Hoje a noite é jovem; da morte, apenas

Nascemos, imensamente.


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