Hoje,
o passeio é com o jornalista Frederico Branco (1927-2001), um dos ótimos
cronistas paulistanos. Creio que entenderia a caminhada porque foi um bom
andarilho desde criança. Começamos pela região da Paulista, pois em uma de suas
crônicas lembra-se do fantasma que assombrava uma casa ao lado do Parque
Trianon –, isso na época em que o parque ocupava a área onde hoje se situa o
MASP, que existia apenas nos sonhos de Chateaubriand e de Lina. Olho em torno e
observo que a única casa que sobrou naquele quadrilátero é sede de um bar
famoso e fico imaginando se o fantasma se refugiou ali... Com Branco aprendi
que a arborização da Rua Bela Cintra vai comemorar 100 anos em 2024 – ano em
que recebeu calçamento. O jornalista, que morava nas imediações, baseia a
informação na obra de Alcântara Machado, outro cronista paulista.
Branco fez um roteiro dos bares da sua vida e
dos amigos com quem proseava – Cervejaria Franciscano (Líbero Badaró), Picadilly
(Marconi), Barzinho do Museu (Sete de Abril), Harmonia (Xavier de Toledo), Paribar
(Praça Dom José Gaspar), Jaraguá (Martins Fontes), Clubinho (porão do Instituto
dos Arquitetos). “E assim, íamos de mesa em mesa de bar” – conclui ele. Eu mal me lembro do primeiro bar que visitei
ao chegar a Sampa: o Riviera (Paulista com Consolação).
O Centro Histórico não foi esquecido. Eu, por exemplo, garanto ao cronista em dúvida que a Rua Três de Dezembro – mero quarteirão entre a Boa Vista e a XV de Novembro – ainda existe. Ali encontram-se três belos prédios – um deles é o banco alemão na esquina com a rua XV.
O jornalista me proporciona uma excursão pelo Edifício Martinelli. “(...) uma das primeiras
palavras que consegui ler por inteiro ficava encarapitada em seu topo, entre as
nuvens. Era ODOL” – conta ele. Já crescido, Frederico Branco começou a explorar
o Martinelli pelo Cineteatro Rosário, no térreo; no subsolo, funcionava um dos
maiores salões de sinuca e bilhar da cidade e que ele frequentou. “Era uma
imensa e encardida caverna, malcheirosa, com dezenas de mesas maltratadas,
desniveladas e em geral cobertas de poeira grossa entranhada no pano verde.” Já
repórter do CORREIO PAULISTANO, ele desbravou a intimidade do prédio que foi o
orgulho de Giuseppe Martinelli (1870-1946) e é um dos cartões postais da
cidade. “Havia literalmente tudo nesse mundo vertical ligado pelos elevadores:
dezenas de escolas disto e daquilo, de idiomas à estenografia, antros de
carteado que funcionavam dia e noite, respeitáveis escritórios de profissionais
liberais, clínicas nada reputáveis, academias de ginástica e de outras artes e
artimanhas, pedicuros, arapucas diversas, dancings em que o menos que se
fazia era dançar, tocas de agiotas, domicílios de famílias bem ou mal
constituídas (...) Era uma reprodução vertical do mundo dentro do mundo da
cidade.”
A prefeitura desapropriou o prédio em
1975, reformou o imóvel que atualmente abriga as Secretarias Municipais de
Habitação e Planejamento, as empresas EMURB e COHAB-SP, além de
estabelecimentos comerciais no piso térreo.
Fim do passeio. Para
continuar embarquem no delicioso livro “Postais Paulistas”, de Frederico
Branco. São Paulo: Editora Maltese, 1993.
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