Ontem,
fiz caminhos diferentes. Fui à rua Lavapés – uma das mais antigas de São Paulo,
nome herdado de um riacho onde os viajantes entre a vila de Piratininga e o
litoral costumavam lavar os pés, removendo a lama do Caminho do Mar. Motivo da
incursão pelo Cambuci, bairro vizinho da Aclimação: uma loja de móveis de
escritório. Nesses tempos em que o amigo do alheio impera, as portas de vidro
da loja permanecem fechadas com estantes, que deveriam estar numa vitrine, servindo
de calço para impedir visitas desagradáveis. Como não tem campainha e ninguém à
vista, é preciso chamar à moda antiga: “ó de casa!”. E lá vem a dona da loja,
que empurra uma estante o suficiente para eu passar. É uma senhora simpática,
conversamos sobre o bairro, problemas e a cidade; faço a compra e nos
despedimos. A mesma operação para eu sair.
Sem
programa resolvi ir ao Mercado da Cantareira. Vou olhando à esquerda as
lojinhas coloridas ao longo da Ladeira General Carneiro e à direita as tendas
azuis que onde se vendem tênis. Haja tênis! No final, a praça Ragheb Chohfi,
onde fica o belo monumento à Amizade Sírio Libanesa, do escultor Ettore Ximenes
– vândalos decapitaram um dos elementos do conjunto escultórico. Do outro lado
fica uma das lojas mais bonitas da região – trabalha com decoração, especialmente
temática. Paro para uma espiada. Agora só tem coelhos e ovos à vista. Um casal
de coelhos se destaca. O macho tem um relógio de corrente, saindo do bolso. Acho
que deve ser uma referência ao Coelho Branco que inicia as aventuras de Alice
no País das Maravilhas; há uma árvore de coelhos (muita imaginação para meu
gosto) e saio logo que vejo as borboletas gigantes.
Passo
por uma tapeçaria, entro e peço informações sobre linóleo; o funcionário até
que já ouviu falar no produto (o que me espanta), mas me oferece algo mais
moderno. Hum! Não sei... Peço um cartão e agradeço.
O
Mercado da Cantareira ganhou pintura nova e por dentro fizeram várias alterações
no espaço de alimentação, enchendo o piso térreo de mesinhas para comer e beber.
Não gostei especialmente da introdução daquelas mesas em que de um lado tem um
tipo de sofá e do outro cadeiras (booth em inglês). Vou procurar
azeitonas. Acho um box simpático, enquanto o rapaz pesa as azeitonas, ouço a
dona recomendando pimenta baiana num petisco que um funcionário está preparando.
Comento que deve ser muito picante a iguaria. “Não é, não. Essa é pimenta baiana
argentina” – responde dando risada. Na rua, olho para o céu que está azul, sem
nuvens ameaçadoras. Subo a ladeira de volta e, na Praça da Sé, sempre
movimentada, evito a rua Barão de Paranapiacaba onde há um batalhão de homens e
mulheres passam o dia assediando pedestres para que comprem ou vendam ouro e
prata. Ela é conhecida como “a rua do ouro”, com várias joalherias de rua e,
pelo que ouço dizer, nos prédios. Acho uma péssima ideia alguém ir fazer
negócios ali.
Na volta em vez de metrô, pego o trólebus,
onde viaja um senhor que insiste em fazer comentários sobre a paisagem. Aponta o
Tribunal de Justiça e diz que é obra italiana, informo que é de Ramos Azevedo;
ele diz que o prédio da Faculdade de Direito é muito mais bonito; digo que o do
tribunal é supera o do Largo de São Francisco e o incentivo a ir visitar. Como não
dei muita atenção, ele passa a conversar com o cobrador. Felizmente, chegou ao
meu destino, me despeço e desço rapidamente.
O prédio do
Mercado tem 91 anos. Projeto: arquiteto Felisberto Ranzini, do escritório Ramos
de Azevedo. Estilo eclético.
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