Se
você adora histórias que se passam em palácios requintados e, se ainda não
pôde, sonha em conhecer os mais bonitos da Europa; ou acha as roupas da nobreza
maravilhosas, lembre-se de que as aparências enganam. Com a queda do Império
Romano, o costume de tomar banho foi diminuindo, mas o que deu início ao
império da sujeira foram as epidemias da peste na Europa, pois as pessoas
acreditavam que o banho abria os poros contribuindo para a instalação da
doença. O medo da água começou no final da Idade Média (1453), quando as pessoas passaram a lavar
apenas o rosto e as mãos. Sem sabão. Quando se animavam, incluíam os pés na
faxina. Sem sabão.
É
verdade que o cristianismo também colaborou bastante, relacionando o banho ao
pecado a ponto de algumas ordens religiosas recomendarem três banhos POR ANO!!!
Natal, Páscoa e Pentecostes. Quando se falava em odor de santidade, ele nada
tinha de agradável. Por aqueles tempos um monge relatou ter encontrado um
eremita no deserto por ter sentido “o agradável odor desse irmão a mais de um O
uso de incenso nas igrejas ajudava a mascarar o cheiro das pessoas. Do outro
lado do canal, na Grã-Bretanha, a rainha Elizabeth I se vangloriava de tomar um
banho por mês. O rei Luís XIII, da França, tomou seu primeiro banho aos 8 anos
de idade; seu filho Luís XIV, o rei Sol, não era flor que se cheirasse a
começar pelo mau hálito.
Só
para se ter uma ideia daqueles dias de glória do Rei Sol, que mandou construir
Versalhes, assim que ele morreu em 1715, “um novo regulamento decretou que as
fezes deviam ser removidas dos corredores de Versalhes uma vez por semana”. Oh!
Céus! Não é à toa que os franceses capricharam na produção de perfumes.
Ser malcheiroso
não era privilégio dos reis. No século XVI, de acordo com o músico italiano
Hieronymus Cardanus, homens e mulheres “estavam todos infestados de pulgas e
piolhos, que as axilas deles cheiravam muito mal, que outros tinham fortes
odores nos pés e que a maioria tinha um hálito horrível”. Um quadro de Georges
de La Tour (1593-1652) tem como tema “Mulher tentando pegar uma pulga”, a obra
é de c.1638. No filme “Ligações Perigosas” (1988), baseado no livro de Choderlos de Laclos (1741-1803), há uma
cena em que o elegante visconde de
Valmont (John Malcovich) faz sua higiene ao levantar. Banhos de banheira eram
bem aceitos quando por recomendação médica. O cientista e jornalista
revolucionário francês Jean-Paul Marat foi assassinado no banho durante a
Revolução, dirão alguns, mas era exatamente um banho medicinal que acalmava a
sensação de queimadura provocada pela dermatite herpetiforme, que ele contraíra.
As
senhoras com mais de setenta anos lembram que suas mães e avós falavam dos
cuidados com a roupa branca – eufemismo não só para roupa de cama, mesa e
banho, mas para a roupa íntima (calcinhas, cuecas e sutiãs). O termo tem uma
longa tradição: na idade Média, as mulheres não usavam calcinhas nem os homens
cuecas: vestiam por baixo camisas brancas longas de linho branco e, em vez de
tomarem banho, trocavam várias vezes por dia a roupa branca; mas isso fazia
quem tinha dinheiro para ter roupa para trocar, sem contar que o linho era para
bem poucos. O povo mesmo raramente trocava de roupa. Os “sábios” acreditavam que o linho branco remove
a transpiração do corpo, porque o suor é
gorduroso ou salgado e impregna as fibras da planta (Linum usitatissimum).
Nesse mundo de sujeira os moradores dos Países
Baixos se destacam pela limpeza que atraía a admiração dos seus vizinhos –
casas e ruas impecavelmente limpas, mas banho mesmo não fazia parte do seu
show.
Enfim, só os fortes sobreviveram para contar a
história.
(A história da sujeira continuará.)
À direita, Luís XIV, o Rei Sol. À esquerda, Luís XIII.
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