sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

O RIO DO SÉCULO XVIII


No final do século XVIII, certo Æneas Anderson participou da viagem do embaixador britânico para a China e fez um detalhado relato sobre o Rio de Janeiro, onde a esquadra aportou para reabastecimento. Na ocasião, o Vice-rei era o conde de Rezende (1790-1801). Logo no início, o visitante fala de um rio ao se referir ao Porto. Duas observações bem interessantes de Anderson: a limpeza da cidade e a concentração de profissionais da mesma área em uma mesma rua. Em São Paulo, ainda podemos observar esse costume de ruas “especializadas”. Roupas, na José Paulino, luminárias na Consolação, eletrônicos na Santa Ifigênia, instrumentos musicais na Teodoro Sampaio etc.

“Do rio a vista que o local oferece é encantadora, consistindo de uma bela cadeia de montes cobertos de florestas cujos vales os transpassam, havendo neles majestosas quintas, proporcionando, uma visão de, ao mesmo tempo, elegância, riqueza e beleza.
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A cidade, que é por alguns chamada de São Sebastião e por outros de Rio Janeiro, fica do lado oeste do porto que tem esse mesmo último nome, numa localidade de baixa altura e quase que cercada por montes que, por retardarem a circulação do ar, fazem do lugar bastante danoso à constituição dos europeus. Seu tamanho é expressivo, tendo de leste a oeste cerca de quatro milhas em comprimento, e cerca de duas milhas de amplitude do norte para o sul. As ruas são, pela falta de praças, regulares e uniformes, cruzando-se em ângulos retos: são bem pavimentadas, repletas de lojas de toda ordem, além de compostas por casas igualmente bem construídas e adaptadas ao clima. No centro da cidade, frente à praia, fica o Palácio do Vice-rei: trata-se de uma construção grande, comprida e estreita, sem atrativos externos, mas contendo uma sucessão de aposentos nobres e espaçosos. Esse prédio tem apenas dois andares, sendo o de baixo designado aos funcionários domésticos e de menor categoria, e no de cima ficam os aposentos do Vice-rei; é construído de pedra áspera, rebocado com cal e coberto por telhas. A capela do Vice-rei é um edifício cuidado, perto do palácio, mas separado dele. As ruas são não só espaçosas apropriadas, mas também notáveis pela limpeza, muitas delas contendo uma variedade de lojas e depósitos que são dignos de cidades da Europa. Há um costume aqui que deveria ser imitado em todos os lugares de grande transação comercial, que é o de todas as pessoas da mesma profissão ocuparem a mesma rua, ou a mesma área; raramente sabe-se de alguma exceção.
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O Paço dos Vice-reis e depois Paço Imperial. Obra de 1738/1743. Foto: 2015. .

Arcos da Lapa: obra de 1723. 
A noroeste da cidade há um aqueduto estupendo que é um objeto de incomum curiosidade. Tem a forma de uma ponte, tem oitenta arcos e, ao menos em algumas partes, tem cento e cinquenta pés de altura, podendo ser visto de diferentes pontos de vista, o que causa um efeito peculiar, chegando aos poucos acima das maiores construções da cidade. Essa imensa cadeia de arcos estende-se ao longo de um vale e une os montes que o formam. A finalidade com que se fez tal construção é clara, já que ela leva a água de fontes perpétuas, à distância de cinco milhas, para a cidade, onde, por meio de canos plúmbeos, é conduzida a um grande e elegante reservatório na praia, em frente ao palácio do Vice-rei. Essa água é da melhor qualidade e é ademais tão abundante que não só proporciona o necessário para todas as vontades dos habitantes, como também reabastece os navios que vem ao porto – um elemento muito necessário.”

Æneas Anderson: “A Narrative of the British Embassy to China”. Dublin. Printed for William Porter, 1795. Tradução de Danilo Lopes Brito.


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